“Exigimos um final imediato para a austeridade, um acordo com vista a um corte no valor da dívida e uma redução significativa no custo anual com o serviço de dívida”. Estas foram as promessas que Alexis Tsipras fez no início de dezembro, quando não se sabia ainda que o país teria eleições antecipadas no início de 2015. Os planos acabaram vertidos no programa eleitoral com que o Syriza quase conseguiu maioria absoluta nas eleições de 25 de janeiro de 2015. O Syriza prometia cortar “grande parte do valor da dívida”, no âmbito de uma mega conferência europeia, e introduzir “cláusulas de crescimento” para o pagamento do restante. Esta segunda-feira, o governo grego deixou cair a parte do perdão direto. O governo está a “cair na realidade”, diz um economista.
Os mercados europeus receberam favoravelmente a divulgação dos contornos principais do chamado “Plano Varoufakis“. A bolsa de Atenas está a subir mais de 10%, enquanto as taxas de juro a três anos estão a cair 150 pontos base (1,5 pontos percentuais) para 13,73% e a 10 anos cerca de um ponto percentual para 9,95%. Os investidores estão a reagir não só a mais uma garantia de que não está nos planos do novo governo grego impor perdas aos obrigacionistas privados (que têm menos de um quinto da dívida total) mas, também, a uma maior confiança de que o governo está a suavizar a sua posição de uma forma que torna menos provável uma saída da zona euro e um colapso do sistema financeiro grego.
Alexis Tsipras tinha vindo, no fim de semana, clarificar: “A minha obrigação para com o povo grego que me elegeu é acabar com as políticas de austeridade e voltar a uma agenda de crescimento económico, mas isso não implica de modo algum que não vamos cumprir as nossas obrigações de empréstimo para com o Banco Central Europeu (BCE) e o Fundo Monetário Internacional (FMI)”. Já na altura esta declaração foi vista como um recuo de Alexis Tsipras, pressionado pela forte queda das ações dos bancos na semana anterior e pela intransigência que o governo grego está a encontrar nos seus encontros com responsáveis da zona euro. Mesmo o ministro das Finanças francês, Michel Sapin, afirmou que o objetivo é “negociar, adiar ou aliviar, mas nunca “cancelar” o pagamento da dívida grega.
Agora, o ministro das Finanças do novo governo de Atenas, Yanis Varoufakis, veio, finalmente, dar a conhecer as suas propostas para a negociação que quer fazer com os parceiros europeus, deixando cair um perdão parcial direto da sua dívida. Em entrevista ao Financial Times, propôs, em vez disso, substituir a dívida que tem por obrigações indexadas ao crescimento da economia e obrigações perpétuas. Os especialistas estão a ver as medidas como um recuo, já que, como se pode ler nesta resenha autorizada do programa do Syriza, o primeiro objetivo era uma “anulação da maior parte do valor nominal da dívida pública para que esta se torne sustentável“.
Ainda assim, no Twitter, Yanis Varoufakis rejeitou a ideia de que tenha havido uma “inversão de marcha. A dívida vai ser colocada numa situação sustentável, mesmo que substituamos o corte da dívida com eufemismos e trocas”.
“Tom mais conciliador”
Em nota enviada aos clientes, a que o Observador teve acesso, os analistas do Rabobank escrevem que “o ministro das Finanças adotou, claramente, um tom mais conciliador“, em comparação, por exemplo, com a forma como falou durante a conferência de imprensa de sexta-feira com o presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsellbloem. Para o Rabobank, esta mudança “surge em linha com a nossa expectativa de que o governo grego irá pestanejar [ceder] antes de ser confrontado com um possível default (incumprimento) ou mesmo uma potencial saída da zona euro”.
Estão reunidas as condições para uma aproximação das posições neste duelo que, segundo o ministro das Finanças do Reino Unido, está a transformar-se no maior risco para a economia mundial? Não necessariamente, diz o Rabobank. “Apesar desta mudança de tom, o processo de negociações deverá, provavelmente, ter muitos solavancos”, dizem os analistas. O que parece certo é que “o governo grego está a começar a cair na realidade“, diz à Bloomberg Kevin Featherstone, professor de Estudos Gregos na London School of Economics. “Alexis Tsipras está a aperceber-se de que as limitações são muito grandes” e “parece certo que a zona euro irá insistir que a Grécia se comprometa com a continuação das reformas estruturais”, acrescenta o académico.
O que aconteceu à mega conferência da dívida?
Uma ideia que parece ter, definitivamente, caído do programa eleitoral é a realização de uma mega conferência europeia para debater a dívida. Sobretudo depois de o holandês Jeroen Dijsselbloem ter dito que “essa conferência já existe: é o Eurogrupo“. Esta proposta era uma das principais do Syriza, que em várias ocasiões pediu a realização de uma conferência semelhante à que, em 1953, aliviou a dívida da Alemanha do pós-Guerra. O governo tem, contudo, cumprido várias promessas eleitorais como a subida do salário mínimo e o congelamento dos principais processos de privatização.
Perante a intransigência europeia, Varoufakis desenhou um plano que considera ser “uma engenharia inteligente de dívida”, em que os empréstimos europeus à Grécia são substituídos por obrigações indexadas ao crescimento nominal da Grécia e a dívida ao Banco Central Europeu (BCE), sobre a qual a Grécia está efetivamente a pagar juros, por obrigações perpétuas. É este plano que Yanis Varoufakis e Alexis Tsipras estão a transportar consigo nas múltiplas visitas que ambos estão a fazer por estes dias a várias capitais europeias, visitas que não incluem, para já, uma ida a Berlim.
Bolsa de Atenas sobe mais de 10%
Com nova garantia de que a dívida pública que circula nos mercados não será penalizada no “Plano Varoufakis”, também as obrigações gregas estão a valorizar-se, levando à redução das taxas implícitas.
Juros abaixo dos 10% no prazo a 10 anos