Os juros da dívida de Portugal desceram até aos 3,02% na primeira sessão após a agência DBRS decidir não cortar o rating da dívida do país, o único que está acima de lixo. Nas últimas semanas, e sobretudo nos últimos dias, contudo, as taxas de juro voltaram a subir (em Portugal e noutros países da periferia) e, no caso de Portugal, já entraram na “zona de perigo” especificada, ao Observador, pela agência de rating decisiva para o país.

Os juros ascenderam esta segunda-feira aos 3,666%, o nível mais elevado desde Fevereiro, segundo a Bloomberg.

Numa altura em que as taxas de juro de Portugal estavam pouco acima de 3%, a agência DBRS afirmou que estaria confortável desde que as taxas não superassem os 3,5% e, sobretudo, os 4%. A partir desta última fasquia, ficou claro, na conversa telefónica com o Observador, que a preocupação da agência tornar-se-ia ainda mais grave. Mas já a partir dos 3,5%, a fasquia que foi agora superada, a agência redobra as atenções porque juros neste nível não permitem ao Estado substituir dívida antiga por dívida nova e, nesse processo, poupar nos juros pagos anualmente.

Juros entram na “zona de perigo” da DBRS

GSPT10YR Index (PORTUGUESE GOVER 2016-11-14 10-44-06

A agência DBRS mostrou-se preocupada com a possibilidade de os juros superarem os 3,5% e caminharem para os 4%.

O problema para Portugal, espelhado nesta subida das taxas, não é, apenas, uma questão de encargos com juros mas é, também, uma questão de acesso ao mercado. David Schnautz, estratega do Commerzbank, questiona, em declarações enviadas ao Observador esta segunda, até que ponto o IGCP terá condições para agendar um leilão de dívida de longo prazo para a próxima semana. E não só: até que ponto terá o Estado condições para emitir os quase 16 mil milhões de euros em dívida de longo prazo que quer emitir em 2017.

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“A Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública (IGCP) indicou que tenciona fazer mais um leilão antes do final do ano e colocar 16 mil milhões de euros em obrigações em 2017. A tarefa ficou, claramente, mais difícil com os últimos desenvolvimentos“, diz David Schnautz, analista do Commerzbank.

E que “últimos desenvolvimentos” são esses? As taxas de juro têm subido em todos os países, de um modo geral, com a perspetiva de que o Presidente-eleito Donald Trump possa aumentar o défice das contas públicas dos EUA, com reduções de impostos e mais investimento público, essencialmente em infraestruturas, explica o especialista do banco alemão.

As taxas de Itália também estão a subir, superando os 2% a 10 anos, e as de Espanha também, passando os 1,5% no mesmo prazo. Para Portugal, contudo, o agravamento dos juros é especialmente preocupante porque, ao contrário de Espanha e Itália, estas já estão num nível muito próximo do custo global de toda a dívida pública. Ou seja, se o Estado se financiar a taxas mais elevadas estará a contribuir, por via da emissão de nova dívida, para que a taxa média aumente e a sustentabilidade da dívida fique em risco.

David Schnautz, do Commerzbank, diz que o que justifica o aumento recente dos juros é um “choque externo”, precisamente o tipo de choques externos a que Portugal está mais vulnerável, como têm apontado várias instituições, entre as quais o Fundo Monetário Internacional (FMI). O especialista do Commerzbank salienta que a incerteza em relação a Donald Trump e em relação, por exemplo, às implicações da eleição de Trump para a política monetária dos EUA, está a criar um “choque externo” que agrava os juros da dívida na periferia europeia.

A subida das taxas de juro de Portugal ocorre numa altura em que, recorde-se, o Banco Central Europeu (BCE) continua no mercado a comprar títulos de dívida pública europeia. Apesar desse efeito, os juros estão a subir. “Será interessante ver como o BCE irá reagir a esta situação, incluindo a eleição de Trump e a incerteza em torno da sua agenda”, diz o especialista. O Commerzbank mantém a recomendação “cautelosa” em relação à dívida portuguesa, admitindo que os juros podem continuar a subir.