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António Cardoso gaba-se de ser amigo de António Costa, enfrentou uma queixa por assédio sexual que foi arquivada e outras por assédio moral. O socialista é presidente da Junta de Freguesia de São Domingos de Benfica desde 2013 e, além de milhares de euros em adjudicações diretas a militantes socialistas e familiares, agora empregou na junta o proprietário que lhe vendeu, com desconto, uma casa de férias próxima da praia de Santa Cruz. A oposição lamenta a impunidade de que goza o presidente, vários funcionários da junta queixam-se de que são humilhados e maltratados e até o presidente da Assembleia de Freguesia, apesar de ser do seu partido (o PS) não aguentou e demitiu-se do cargo com uma carta detalhada a apontar numerosas deficiências.
A junta de freguesia de São Domingos de Benfica — que gere 6 milhões de euros por ano — está neste momento sem orçamento aprovado para 2018. É uma área que abrange mais de 33 mil habitantes: ou seja, esta junta tem mais população do que 244 dos 308 municípios portugueses. A dimensão da junta é quase proporcional às histórias polémicas que envolvem o presidente.
Comprou casa com desconto de milhares e empregou vendedor na junta
Luís Costa Matos decidiu vender um T5 de estilo rústico, com piscina, que tinha em A-dos-Cunhados, a cerca de 5 quilómetros da praia de Santa Cruz. A casa chegou a estar à venda numa imobiliária — segundo um anúncio, que por lapso nunca foi retirado — por 298.000 euros. A casa acabou por ser vendida por Luís Costa Matos ao presidente de junta de São Domingos de Benfica por 245 mil euros aos quais se somaram mais 30 mil euros pelo recheio. A escritura, consultada pelo Observador, demonstra que houve uma poupança entre 23 mil euros a 53 mil euros face ao valor da venda anunciado online por uma imobiliária. Na mesma escritura estava ainda firmado que “a presente venda não foi objeto de intervenção de mediador imobiliário”.
O desconto face ao anúncio pode ter sido de apenas 23 mil euros, mas pode ter chegado aos 53 mil euros, já que a imobiliária falava que o preço (os tais 298 mil euros) incluíam uma cozinha equipada (não mobiliário no valor de 30 mil euros). Até aqui, o negócio podia ser igual a qualquer outro do ramo imobiliário, mas há outro detalhe: meses depois de comprar esta casa a Luís Costa Matos, que vivia no concelho de Torres Vedras, António Cardoso empregou-o na junta de freguesia de S. Domingos de Benfica, com um contrato de 1.500 euros por mês (aos quais ainda acresce IVA).
Ambos confirmam os valores da venda — plasmados na escritura — mas nem Luís Costa Matos nem António Cardoso vêem qualquer incompatibilidade ética nesta contratação. O presidente da Junta de Freguesia de S.Domingos de Benfica justifica ao Observador a avença atribuída ao vendedor: “Da venda dessa casa resultou uma amizade, e de uma troca de impressões não relacionada com essa venda resultou o convite para colaborar na minha campanha eleitoral, à época candidato à junta (…), em virtude de ter tomado conhecimento que o mesmo possuía uma vasta experiência em comunicação tendo passado por várias empresas nessa área”. Ora, com a vitória, nas autárquicas de 1 de outubro de 2017, “pretendendo reestruturar a área da comunicação da junta”, António Cardoso dirigiu o “convite para integrar a equipa a partir de novembro de 2017”.
Sobre o desconto, Luís Costa Matos explica que a casa “esteve à venda em múltiplas imobiliárias”, mas foi vendida por si e por sua iniciativa: “Quando entendi oportuno, e pelo máximo valor que consegui angariar nessa altura“. Quanto a trabalhar na campanha de António Cardoso, Luís Costa Matos explica que “como especialista em comunicação e marketing” áreas em que trabalha “há mais de 30 anos” e aos “58 anos de idade” entendeu que a assessoria da junta era “um projeto” que lhe “faltava concretizar” e por isso colaborou “ativamente na construção da imagem do candidato que foi apresentado a sufrágio”. Depois disso, foi convidado para liderar a área de comunicação da junta.
As condições desse contrato têm-se alterado. Em outubro, Luís Costa Matos diz que começou por trabalhar “pro bono“. Depois disso, nos meses de novembro, dezembro e janeiro de 2017 foi “remunerado através de ajuste direto simplificado” e foi agora, finalmente, “contratado por um período de 11 meses através do processo de ajuste direto com o valor mensal de 1.500€+IVA.” O último contrato, que ainda não foi publicado no site base.gov — o que não é estranho, uma vez que é recente –, terá um custo total para a junta de 20.295 euros (15.627 euros mais IVA).
O novo responsável pela comunicação acrescenta ainda que, “pelo valor e pela experiência”, classifica a sua contratação como “uma boa aquisição para a junta”. Além disso, é também responsável pela revista da junta, que passou de “trimestral a bimestral.” Os mesmos argumentos foram dados, numa resposta quase a papel químico, pelo presidente da junta. Ambos admitem, assim, que só se tornaram amigos por causa da venda da casa e que foi aí que começou a relação que levou o presidente a contratar o seu novo responsável pela comunicação.
Empreiteiro (e marido de vogal) contratado para fazer vídeos
À semelhança do que acontece por outras juntas da cidade — como o Observador já noticiou aqui e aqui –, a junta de São Domingos de Benfica contratou, por ajuste direto, vários militantes do PS ou familiares de militantes: um dos exemplos é o marido de uma vogal da junta de freguesia, embora a contratação tenha sido feita uns meses antes das eleições autárquicas.
A junta de São Domingos de Benfica contratou a empresa “ARPA – Construção Civil e Decoração Unipessoal, Lda” para “aquisição de peças de conteúdo multimédia relativas à cobertura de eventos realizados ou conexos com as atribuições da freguesia de São Domingos de Benfica”. A empresa é propriedade de Armando Jorge Bastos Parente, que é casado com a vogal e membro do executivo Cristina Maria Dias Fulgêncio Parente. António Cardoso alega que Cristina Parente “não integrava o Executivo da Junta de Freguesia à data da contratação da empresa”. De facto, o contrato foi assinado a 21 de março de 2017 e trata-se de um contrato no valor de 12.000 euros (1.000 euros mês, aos quais acresce IVA). No contrato colocado no site base.gov, não foi Armando Parente a assinar o contrato, mas o seu advogado, Carlos Ramalho.
O presidente de junta alega ainda que Cristina Parente “não tomou nem tomará qualquer decisão relativamente à empresa” do marido “em virtude de ter expressamente apresentado escusa para esse efeito”. António Cardoso não esclarece, porém, se foi (ou será) feito novo contrato com a ARPA. Acresce que esta é uma empresa unipessoal que tem, no registo comercial, como principal atividade “construção de edifícios (residenciais e não residenciais)”, o que nada tem a ver com conteúdos multimédia.
Aliás, foi como construtor civil que o marido desta militante do PS teve o seu contrato público mais vantajoso em 2017: um ajuste direto para “empreitada de beneficiação das fachadas do palácio Baldaya”, no valor de 52.275 euros (42.500 euros mais IVA). A entidade adjudicante? Precisamente a junta vizinha, de Benfica, também liderada por socialistas.
O arquiteto de Condeixa que era eleito do PS em Carnide
Os políticos costumam invocar a sua legitimidade para contratar militantes para cargos políticos. Porém, olhando para contratações como as da Junta de Freguesia de São Domingos de Benfica, fazem-no também para cargos técnicos. Desde 15 de janeiro de 2014, o executivo liderado por António Cardoso já fez ajustes diretos à Metrikstage, empresa do militante socialista Rui Carvalho, no valor de 135.423 euros para “consultoria técnica para a Requalificação do Espaço Público, Ambiente e Higiene Urbana”.
A Metrikstage — Arquitetura, Lda é sediada em Condeixa-a-Nova e é detida quase na totalidade por Rui Carvalho (tem um outro acionista com uma percentagem muito minoritária, que é a mãe do arquiteto). O arquiteto socialista era também membro eleito pelo PS da junta de freguesia de Carnide quando foi contratado pela primeira vez por António Cardoso.
O presidente de junta de justifica ao Observador que os ajustes diretos à Metrikstage foram “efetuados, por deliberação do Executivo da Junta de Freguesia de São Domingos de Benfica” e não por sua “exclusiva decisão”. António Cardoso garante ainda que “o critério da escolha não teve por base qualquer militância política ou partidária mas apenas a competência e os conhecimentos da empresa em causa para o exercício das funções para a qual foi contratada”. E acrescenta que “o facto do Arquiteto Rui Carvalho ser militante do Partido Socialista não o diminui para o exercício de qualquer função da sua competência“.
Funcionários da junta ouvidos pelo Observador contam que o presidente lhe ordenou que recebessem ordens de Rui Carvalho na sua ausência. O arquiteto não é um eleito, mas o dono de uma empresa contratada externamente, por via de um ajuste direto.
Ao Observador, o presidente da junta garante que “tal não acontece”. António Cardoso assume-se como o “superior hierárquico” de todos os funcionários, mas explica: “Acontece, com frequência, solicitar ao arquiteto Rui Carvalho para transmitir indicações minhas aos serviços sendo que as mesmas não consubstanciam quaisquer ordens por parte do arquiteto mas apenas orientações ou indicações da minha parte. Pessoalmente, enquanto superior hierárquico de todo o pessoal da freguesia, detenho o poder jurídico de dirigir a sua atividade, poder que exerço efetivamente”.
Contratada empresa de marido de candidata do PS à junta
Entre as contratações de António Cardoso estão também quatro ajustes diretos à empresa “Esfera Azul”, no valor total de 54.163 euros para “fornecimento de material escolar e didático destinado aos alunos dos jardins de infância e do 1º ciclo das três escolas básicas da freguesia”. O sócio-gerente desta empresa é Jorge Manuel Leitão Garcia Cerqueira, marido de Elsa Maria Patrício Martins Figueira Cerqueira, que integrou a sua lista à junta de freguesia nas últimas autárquicas.
O presidente da Junta de Freguesia de São Domingos de Benfica garante que, sempre que a junta faz um ajuste direto, “é feita uma consulta ao mercado por forma a escolher a empresa a convidar mesmo que a lei a tal não obrigue”. Logo, garante, a “contratação da empresa Esfera Azul não teve por base a ligação dessa empresa a pessoas que integraram a lista“, mas “apenas e tão só o facto de esta empresa disponibilizar os melhores preços e condições de mercado aos serviços da junta de freguesia”. De acordo com o portal base.gov, a Esfera Azul não teve mais nenhum outro contrato público a não ser com a junta de freguesia de São Domingos de Benfica.
Concurso anulado. Mulher de presidente da Gebalis ficou com o lugar
Patrícia Pinto de Jesus, mulher de Pedro Pinto de Jesus — militante destacado do PS/Lisboa e presidente da Gebalis — é funcionária pública desde 24 de janeiro de 2011. Mas, a 6 de abril de 2015, esta militante do PS, que chegou a integrar as listas à junta de freguesia da Ajuda, transitou em regime de mobilidade intercarreiras para a junta de freguesia de São Domingos de Benfica.
A 6 de abril de 2016, a junta publicitou um concurso para preencher um cargo de Técnico Superior de Ciência Política, como consta do Diário da República. Patrícia Pinto de Jesus concorreu ao lugar. O concurso seguiu os trâmites regulamentares e, em junho de 2016, foi publicada a lista de candidatos admitidos e excluídos. A 5 de janeiro de 2017, foram divulgados os resultados da prova escrita de conhecimentos e da avaliação curricular. Patrícia Pinto de Jesus não fez prova (por já ser funcionária pública) e seguia à frente com 14,6 pontos na avaliação curricular. Em segundo lugar estava João Alexandre Fernandes, com 12 pontos, que em fevereiro — segundo confirmou ao Observador — recebeu a informação que passou para a fase seguinte. Ora, essa fase seguinte nunca aconteceu.
Em setembro de 2017, acabou por sair em Diário da República um aviso a informar que o concurso para aquele lugar foi “revogado“. O presidente da junta de freguesia, António Cardoso, responde que “do referido ato não houve reclamação, recurso hierárquico ou contencioso motivo pelo qual o procedimento concursal a que se refere foi encerrado e do mesmo não resultou qualquer contratação”.
João Fernandes explica ao Observador que ficou “à espera que a junta de freguesia” o chamasse para “a fase seguinte”, que seria uma entrevista presencial. O que nunca aconteceu. O autarca diz ainda deste concurso “não resultou qualquer contratação”.
António Cardoso não esclareceu, num primeiro momento, se Patrícia Pinto de Jesus ocupou esse lugar. O Observador voltou a colocar a questão de uma forma ainda mais clara: “Patrícia Raquel Louro Gonçalves Pinto de Jesus ocupa ou não atualmente o cargo de Técnico Superior – Ciência Política?”
A junta confirmou: “O lugar a que se refere existe no mapa de pessoal da junta de freguesia e foi preenchido pela funcionária em causa através da mobilidade posteriormente consolidada conforme foi referido na resposta anterior”. Ou seja: o concurso foi revogado e uma das candidatas — que até ia à frente do concurso — foi colocada no cargo. Patrícia Pinto de Jesus, além de militante socialista, é mulher do presidente da Gebalis que em junho esteve envolvido numa polémica por contratar para a empresa municipal que gere a sobrinha do líder parlamentar do PS, Carlos César.
A ligação a António Costa (e ao filho e à mulher)
Nas várias questões enviadas pelo Observador, quando estão em causa ajustes diretos, António Cardoso faz questão de dizer que os mesmos foram viabilizados por “todo o executivo”. Aí compromete todos os membros. No caso do anterior mandato, um deles foi, entre 2015 e 2017, Pedro Miguel Tadeu Costa, filho do primeiro-ministro António Costa (que entretanto mudou de junta de freguesia). Pedro Costa fez parte do executivo de São Domingos de Benfica. Entrou depois de ser público um caso de assédio sexual que envolvia o presidente da junta.
Mesmo depois de todas as polémicas, Fernanda Tadeu — mulher de António Costa — aceitou ser a número seis da lista de António Cardoso nas últimas autárquicas de 1 de outubro de 2017. No entanto, antes sequer de tomar posse, a mulher do primeiro-ministro resignou ao cargo. Entretanto, Pedro Costa foi eleito membro do executivo do PS numa outra junta de freguesia: Campo de Ourique.
O caso de assédio sexual: “Encostava-se e dizia que queria sentir o meu calor”
Um dos casos mais polémicos da gestão de António Cardoso é um caso de assédio sexual a uma jovem estagiária. O jornal Público noticiou a história e falou com a alegada vítima que descreveu as situações: “Desapertava-me o casaco e dizia que não me queria ver tão tapada. Encostava-se a mim e dizia que queria sentir o meu calor”, depois “começou a perguntar se eu tinha namorado, se vivia com ele, se tinha sexo”. “Quando me via desapertava-me o casaco e dizia que não me queria ver tão tapada. Encostava-se a mim e dizia que queria sentir o meu calor. Tocava-me no corpo e encostava-me contra ele”, contou a alegada vítima. E continuou, ao jornal: “Não me diga que uma rapariga da sua idade não faz nada com a boca (…). Comecei a ter medo de ficar sozinha na sala. Não podia ouvir os passos dele e começava a tremer. Começava a suar quando ele entrava”.
Questionado pelo Observador, António Cardoso considera que foi “injusta e indevidamente acusado” e garante: “O mesmo já se encontra encerrado tendo sido arquivadas todas as acusações proferidas contra mim.” O Observador falou com testemunhas que garantem não ter sido notificadas do encerramento do caso, mas foi impossível falar com a alegada vítima que terá regressado à Madeira, de onde é natural. As testemunhas relataram ainda episódios da estagiária a sair do gabinete do presidente a chorar e a tentar compor-se e o facto do presidente ter mudado o horário da funcionária para passar a ter mais tempo a sós com ela.
Na altura que se soube do alegado assédio, duas vogais do executivo saíram de imediato da junta: Cláudia Fernandes alegou “motivos profissionais” e Cristina Valério nunca esclareceu os motivos da saída (embora no atual mandato tenha voltado ao executivo). Foi na sequência destas saídas que entrou Pedro Costa. Após as denúncias, a estagiária foi colocada noutro serviço.
Uma das testemunhas do processo foi Cristina Garcez. Trata-se de uma funcionária que trabalhava na junta há mais de vinte anos quando se deu o caso. Assistiu a alguns dos atos de assédio e não se calou. Foi testemunha do processo e, desde aí, nunca mais teve descanso no trabalho.
Casal Garcez de castigo no refeitório
Cristina Garcez trabalhava no bar antes da chegada de António Cardoso. O presidente, ainda antes do caso, colocou-a na limpeza da sede da junta. Depois do caso de assédio, tentou enviá-la para cantoneira. Ela recusou e chegou a estar em casa sem receber vencimento. Mas a maior parte dos últimos três anos tem sido passada no refeitório da Higiene Urbana. “Antes disso, nunca tinha tido qualquer problema com este presidente nem com outros anteriores. Porque não me calei e não gostava de ver o que ele fazia à miúda, tornou a minha vida no inferno”, conta Cristina Garcez ao Observador.
Nos últimos meses, Cristina Garcez deixou de estar sozinha do refeitório. O seu marido começou a denunciar a situação da mulher no Facebook. Rui Garcez denunciou no Facebook que soma 23 anos a trabalhar na junta e a mulher tem 28 anos de casa. O funcionário diz que, “em todos estes anos”, o casal trabalhou com “todas as fações políticas”, mas nenhuma os “desrespeitou, como tem acontecido desde 2013 com este executivo PS”.
Rui Garcez era motorista mas tentaram colocá-lo também no setor da Higiene Urbana. Recusou. Agora passa os dias de “castigo” no refeitório com a mulher. Passam lá todo o tempo do horário de trabalho. O funcionário da junta de São Domingos de Benfica denuncia que já esteve “impedido de estar dentro das instalações mais do que uma vez” e que chegou a ser “impedido de ir à casa de banho dos funcionários, sendo obrigado a ir à dos utentes depois de os ter confrontado com a situação”. Rui Garcez diz ainda que, tanto no seu caso como no da mulher, “existem autos da Polícia, que foram chamados ao local em ocasiões diferentes.”
António Cardoso explica a afetação de funcionários com as “novas competências que a junta passou a ter na área da Higiene Urbana”. O presidente da junta diz que houve “necessidade de afetar mais funcionários a esta área, no ano de 2014” quando a trabalhadora Cristina Garcez foi transferida em mobilidade para este setor. Ora o autarca diz que, “apesar de nunca ter impugnado tal transferência e de a mesma não acarretar qualquer alteração de carreira ou categoria (assistente operacional) a trabalhadora Cristina Garcez tem desde então recusado exercer as funções, facto que já motivou vários processos disciplinares, no último dos quais lhe foi aplicada uma pena de 60 dias de suspensão em virtude de tal recusa ser indevida e injustificada”.
Antonio Cardoso explica ainda que “a trabalhadora invoca como justificação para essa recusa motivos de saúde que nunca comprovou ou justificou junto dos serviços desta autarquia e quando submetida a exame de saúde ocupacional foi considerada apta para o exercício do trabalho”. Já no que refere ao trabalhador Rui Garcez, o autarca socialista diz que “o mesmo, na qualidade de motorista, tinha a seu cargo a condução da “Carrinha Porta a Porta” desta autarquia tendo recentemente, e em virtude de necessidades no setor da Higiene Urbana, sido afeto na mesma qualidade (motorista) à condução de viaturas nessa área”.
Junta sem Orçamento aprovado e a demissão do presidente da assembleia
A Junta de Freguesia de São Domingos de Benfica é a única de Lisboa que não tem, neste momento, o Orçamento para 2018 aprovado. O próprio presidente da Assembleia de Freguesia, João Pinheiro (eleito nas listas do PS), demitiu-se depois de se aperceber como funcionava a gestão do executivo.
Numa carta enviada a todos os funcionários da autarquia, João Pinheiro, fundamentou a sua saída, ponto por ponto, com várias críticas à gestão de António Cardoso. O presidente junta denunciou a “falta de conexão lógica entre as grandes opções do plano e determinadas rubricas de receita e despesa”, que, no seu entendimento, “revelaram uma incompreensível falta de preparação técnica e política dos autores do documento“.
João Pinheiro confessa ainda que na base da sua decisão está também “uma fundada falta de confiança no desempenho das funções do tesoureiro da junta” e revela que colocou a “substituição” desse tesoureiro e da empresa que desempenha as funções de Técnico Oficial de Contas como “condição para a continuidade do mandato”.
O socialista denuncia ainda, numa carta à qual o Observador teve acesso, a existência de uma “desarticulação ao nível da junta de freguesia, entre os vogais com pelouros distribuídos e a respetiva integração de conteúdos e coordenação política, ilustraram uma falta de coesão que retira credibilidade e capacidade de atuação ao órgão executivo, especialmente perante o público presente nas assembleias”.
Além disso, João Pinheiro afirma ainda que a “indisponibilidade, ou incapacidade, das assessorias contratadas pela freguesia para apoiarem o presidente e a junta durante as discussões foi ultrajante”. Daí que “mal se compreende que avultados pagamentos mensais para remunerar acompanhamento de temas técnicos não resultem na produção de informação útil para responder a questões colocadas pelos vogais da assembleia e pela população, que interpelou a Junta sobre questões concretas e pertinentes”.
O presidente da assembleia conta ainda um episódio de tentativa de agressão com uma faca.”Não compreendi, nem aceito, a crescente conflitualidade existente nas relações entre eleitos locais da mesma freguesia, que se estende às pessoas que assistem às sessões, motivando, logo na primeira reunião, uma detenção em flagrante delito de um freguês, pela Polícia de Segurança pública, por tentativa de agressão com arma cortante”.
João Pinheiro considera que não havia o “integral cumprimento do Estatuto do Direito de Oposição”. O presidente da assembleia de freguesia dizia ainda que não podia reconhecer “validade ou legitimidade a condutas baseadas na omissão do cumprimento de deveres legais, como a promoção de concorrência e transparência nas contratações, cerceamento de informação, ou organização da atividade da freguesia a partir de factos ilícitos, com repercussão fiscal”.
Antes de bater com a porta, João Pinheiro exigiu ainda a “contratação de uma auditoria, centrada no último mandato, ao nível da gestão da despesa com contratos públicos, recursos humanos e contratos de delegação de competências entre o município e a freguesia.” A auditoria não chegou. Na última frase, o antigo presidente da assembleia pediu aos trabalhadores da freguesia “um pedido de desculpa pelo temperamento paciente e conciliador, responsável pelo momento em que esta declaração é apresentada.”
Depois da saída de João Pinheiro, a presidência da Assembleia de Freguesia foi atribuída a um eleito do PSD, Pedro Amaral. A manobra está a ser vista como uma aliança entre PS e PSD para que o orçamento seja viabilizado, tal como aconteceu na junta de freguesia da Estrela, onde o presidente social-democrata, Luís Newton, não tem maioria e só conseguiu viabilizar o Orçamento com a abstenção do PS.
A junta de freguesia de Benfica tem um orçamento de seis milhões de euros e está, assim, neste momento a ser gerida em duodécimos, o que acaba por trazer problemas no momento de fazer alguns pagamentos a funcionários da autarquia.
Na assembleia de freguesia, o PS é minoritário (tem nove elementos), seguindo-se o PSD (5 eleitos), CDS (3 elementos), PCP (um elemento) e Bloco de Esquerda (um elemento). Nuno Brito, eleito do CDS, tem denunciado várias das irregularidades na junta. A 23 de janeiro, António Cardoso respondeu, de uma só vez, a 19 requerimentos do primeiro eleito do CDS, mas muitas são não respostas.
A junta de freguesia de São Domingos de Benfica é liderada por um executivo do PS desde 2013. Antes disso, a autarquia foi liderada pelo social-democrata Rodrigo Gonçalves. Já nessa altura existiam contratações da junta que favoreciam amigos ou militantes do PSD, tal como o Observador revelou numa anterior investigação jornalística.
A rede da família Gonçalves: como se tornaram poderosos no PSD/Lisboa