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“Se ver o mundo ajuda a destrui-lo, devíamos ficar em casa?” A pergunta, lançada pelo The New York Times num artigo sobre os contributos da aviação comercial para a poluição atmosférica, é desconcertante. As viagens aéreas, em tempos consideradas o expoente máximo do glamour para os mais privilegiados — mas agora mais comuns que nunca devido à generalização das companhias low-cost —, são uma das atividades humanas mais poluentes dos nossos dias. Dados de 2016 publicados pela Agência Europeia do Ambiente mostram que o avião é o meio de transporte mais poluente em comparação com todos os outros, emitindo 285 gramas de dióxido de carbono para a atmosfera por passageiro por cada quilómetro percorrido: mais do dobro do automóvel.
Responsável por 2,5% de todas as emissões de gases de efeito de estufa, a aviação comercial tem crescido significativamente ao longo das últimas décadas. Em 2017, a indústria superou pela primeira vez os 4 mil milhões de passageiros transportados. E voamos cada vez mais: se em 2000 o cidadão comum viajava em média uma vez a cada 43 meses, em 2017 o tempo entre viagens tinha diminuído para metade, para 22 meses. Além das emissões de gases, os aviões são também uma dos principais fontes de poluição sonora — motivo que leva esta sexta-feira a associação ambientalista Zero a acampar durante 24 horas junto ao aeroporto de Lisboa para medir o ruído provocado pelas aterragens e descolagens.
Estes dados, disponíveis no último relatório anual da Associação Internacional de Transportes Aéreos, a que se juntam estudos que mostram a relação direta entre cada viagem aérea e o desaparecimento do gelo no Árctico, levam-nos irremediavelmente à questão que abre o texto: “Se ver o mundo ajuda a destruí-lo, devíamos ficar em casa?”
Uwe Heitkamp, um alemão de 59 anos que já viveu mais de metade da vida em Portugal, descobriu a resposta a esta pergunta através do seu vizinho de 84 anos nas Caldas de Monchique, no Algarve. Na vida toda, aquele homem nunca tinha entrado num avião nem num comboio. Também não tinha carro — só um trator para lavrar a terra. Fátima foi o destino mais longínquo em que esteve: foi até lá de autocarro. Uwe, jornalista e ambientalista, entrevistou-o para a sua revista ECO123 e perguntou-lhe pelas suas ambições. A resposta viria a mudar-lhe a vida: “Porque é que preciso de ir de avião a algum lado se o melhor sítio do mundo é a minha terra?”.
Ficou “de boca aberta”, como lembra hoje ao Observador, ao telefone a partir da sua casa sustentável na serra algarvia. Logo ele, que aos 30 anos deixara a Alemanha com a namorada grávida, pegara no barco que tinha comprado com o seu primeiro salário aos 24 anos, usara as poupanças que acumulara ao longo de uma década como jornalista e, sobretudo, com o livro que havia escrito naquela altura — que foi um best-seller na Alemanha —, e zarpara pelo mar sem olhar para trás. Chegaria a Portugal em 1989 depois de parar em dezenas de portos em França e Espanha. Percorreu a costa portuguesa toda, conheceu o país a partir do mar e descobriu Ferragudo, no concelho de Lagoa, onde decidiu ficar. Ali viria a nascer o filho. Logo ele, que havia encontrado a sua casa tão longe de casa, teve de ouvir o vizinho idoso explicar-lhe, por palavras tão simples, porque é que deveria deixar de imediato de andar de avião.
“As pessoas andam a viajar exaustivamente porque não gostam muito da sua terra, do local onde vivem, no décimo andar de um prédio qualquer. Isso não é objetivo para um grande amor”, justifica Uwe Heitkamp, que em 2011 tomou a decisão radical de deixar de andar de avião e assim reduzir de forma assinalável a sua pegada carbónica. Mesmo sabendo que, para cumprir o sonho de conhecer a Austrália e a Nova Zelândia, vai ter de depender do seu barco (menos poluente).
Como o fogo de Monchique fez quebrar uma promessa
Uwe e a namorada chegaram a Portugal em 1989 sem intenção de ficar. A sua carreira até àquele momento tinha ficado marcada por uma investigação de fundo feita para um canal de televisão alemão sobre os cuidados aos doentes mentais no país. O jornalista conseguiu internar-se em dois hospitais alemães — um em Frankfurt e outro em Bonn — e registar imagens com uma câmara oculta, para denunciar como na Alemanha Ocidental da década de 80 os doentes podiam ser “rapidamente internados sem qualquer direito de ser ouvidos”. A investigação resultou num livro, editado apenas em alemão, que foi um sucesso de vendas e que permitiu a Uwe financiar um desejo que vinha acalentando naqueles anos: uma pausa.
“Com 30 anos, pensei que pela primeira vez na minha vida precisava de um intervalo, de parar o meu trabalho como jornalista.” Tirou um tempo e fez a viagem que o levou até ao Algarve. No máximo, ficaria meio ano. “Sempre pensámos continuar a viagem, mas fomos ficando. Nunca planeámos ficar em Portugal. Agora, estamos aqui há 60 meios anos!”
Foi numa viagem de barco pela costa portuguesa que se rendeu à necessidade de defender o ambiente. Saiu de Sesimbra e queria chegar a Sines, numa altura em que os barcos não tinham GPS. A meio da viagem, levantou-se um nevoeiro tal que Uwe, mesmo sendo um navegador experiente, ficou à deriva. Mas, como lembra hoje a três décadas de distância, “no mar aprende-se a sobreviver”. Mais: “Na natureza aprende-se a sobreviver”.
“Fiquei pequeno. Soube quem era, que era parte de um todo. Não estou aqui para dominar a natureza, a natureza mostra-me o meu tamanho”, garante Uwe. Deixou que a corrente do mar o levasse e, uma semana depois, encontrou um grupo de pescadores que lhe disseram que já estava a cinco ou seis milhas de Sagres. Desde aquele momento, Uwe ficou amigo dos pescadores algarvios. Fez a festa à chegada a Sagres e guardou uma lição para a vida. “Nesta altura ainda não falava português, mas com estes acontecimentos na natureza percebi o respeito que temos de ter pelo nosso mundo.”
Depois deste momento decisivo, o percurso de Uwe até à decisão que tomou em 2011 foi natural. Após trocar a água pela serra, mudou-se para as Caldas de Monchique e começou a transformar a sua vida passo a passo para se tornar mais sustentável. Pelo meio, convicto de que ficaria em Portugal, começou a aprender português, lançou um semanário trilingue (o Algarve123) que fez sucesso não apenas entre os turistas mas também entre os locais, a que mais tarde viria a suceder a revista trimestral ECO123.
A sua editora familiar comprou três hectares de terreno nas Caldas de Monchique, instalou 40 painéis solares — que lhe permite produzir três vezes mais eletricidade do que a de que precisam. O resto é vendido à EDP e, com esse rendimento, ele e a mulher empregam um jardineiro e um guarda florestal, que trabalham num projeto para a criação de um jardim botânico em metade do terreno detido pela editora. Mais tarde, a família investiu num carro elétrico, que abastece com a energia solar produzida em casa.
Quando já vivia quase sem recurso a energias não renováveis (só falta substituir a motosserra por uma elétrica), decidiu deixar de andar de avião. Sempre que viaja, fá-lo de comboio ou de carro elétrico.
Em oito anos, só quebrou a promessa uma vez.
Em agosto de 2018, foi a Oslo, na Noruega, entrevistar um cientista para a revista. Apanhou um comboio na cidade espanhola de Huelva e foi saltando de composição em composição com paragens em Madrid, Barcelona, Girona, Montpellier, Paris, Frankfurt, Hamburgo, Copenhaga e Gotemburgo, até finalmente chegar a Oslo. Foram quatro dias de viagem — mas vale a pena, porque agora, assegura, faz tudo “com mais tempo”.
Depois da entrevista, voltou a fazer-se aos carris e já estava em Copenhaga quando soube do incêndio que devastou a serra de Monchique. Não podia esperar três dias para chegar à sua casa ameaçada e tomou uma decisão de recurso: comprou um bilhete de avião para viajar rapidamente de Frankfurt para o Algarve. Acabaria por perder 80% do terreno onde já se erguia o futuro jardim botânico — que “estava um sonho, mas o antigo dono não o tinha limpado e não teve manutenção durante quase trinta anos”.
À exceção daquela emergência trágica que o obrigou a voar da Alemanha para Portugal, o jornalista nunca recorre ao avião. Anda por Portugal e pela Europa de comboio, ou no seu carro elétrico quando não é possível usar a ferrovia. Faz menos coisas, escreve com calma. Prestes a completar 60 anos, continua a dedicar-se essencialmente às entrevistas. Percorre quilómetros de comboio para encontrar os entrevistados — quando não os descobre à porta de casa ou no café da vila. Viaja muito menos, pondera sempre se vale mesmo a pena ir — e conclui muitas vezes que não vale.
Para o ano, vai à Alemanha para uma reunião dos 40 anos da sua turma da escola secundária. De comboio, claro.
Flygskam ou a vergonha de andar de avião
Uwe Heitkamp está longe de estar sozinho no movimento anti-aviões, que tem ganhado expressão sobretudo nos países nórdicos. Até há uma palavra sueca para descrever a vergonha de voar: flygskam. O movimento, fortemente impulsionado pela jovem sueca Greta Thunberg, já causa impacto na indústria. “O setor está sob uma pressão considerável”, admite o líder da Associação Internacional de Transportes Aéreos, Alexandre de Juniac, em declarações citadas pela AFP, ao mesmo tempo que lamenta que os impostos sobre a aviação sejam “frequentemente absorvidos pelos orçamentos dos estados e gastos em tudo o que querem exceto no ambiente”.
Greta Thunberg, a jovem sueca que se tornou num dos principais rostos do combate às alterações climáticas ao inspirar milhões de jovens a faltar às aulas numa greve global pelo ambiente, também evita ao máximo andar de avião. No final do ano passado, numa altura em que começava a ganhar exposição internacional, Greta anunciou que iria recusar convites para discursar no Panamá, Nova Iorque, São Francisco, Abu Dhabi, Vancouver e Ilhas Virgens Britânicas.
“Infelizmente, o que resta do nosso orçamento carbónico não permitirá nenhuma destas viagens. As gerações adultas em países como o meu esgotaram os nossos recursos. A minha geração não poderá viajar de avião a não ser para emergências, num futuro próximo, se quisermos ser minimamente sérios sobre o limite de 1,5 graus na temperatura global [que consta do acordo de Paris sobre as alterações climáticas]. Vou tentar ir ao máximo de lugares possível sem voar. E também vou participar através de videochamada. Claro que simplesmente deixar de voar e tornar-se vegano não são a solução. Temos de pensar num estilo de vida com zero emissões o mais rapidamente possível”, escreveu a jovem sueca numa série de tweets em dezembro.
Recently I’ve been invited to speak in places like Panama, New York, San Francisco, Abu Dhabi, Vancouver, British Virgin Islands…
But sadly our remaining carbon budget won’t allow any such travels.
Adult generations in countries like mine have used up our resources. (Thread->)— Greta Thunberg (@GretaThunberg) December 30, 2018
Enquanto a aviação comercial elétrica não se tornar uma realidade em grande escala — está a dar ainda os primeiros passos —, andar de avião continuará a ser uma das atividades humanas mais poluentes. Um jogo criado por Uwe Heitkamp ajuda a dar uma dimensão concreta a esta realidade.
“Uma vez, há uns anos, encontrámo-nos na época do Natal e do Ano Novo e perguntei ao meu filho o que é que lhe podia dar que fosse imortal, que pudesse ficar para as próximas gerações. Chegámos a um ponto em que o que ele me disse foi: ‘Eu só precisava de um mundo onde seja possível viver’”, recorda o alemão. Da conversa resultaria o Kyoto, um jogo online que permite ao utilizador aferir a sua pegada ecológica.
Cada jogador cria uma espécie de conta bancária no jogo onde recebe 3 mil “kyotos” — ou pontos, que equivalem aos quilogramas de dióxido de carbono que tem capacidade para emitir para a atmosfera durante um ano. Depois, tem de viver sempre com uma pontuação positiva, podendo perder ou ganhar “kyotos” consoante as atividades diárias. Os utilizadores podem emprestar “kyotos” uns aos outros e devem adotar atitudes que permitam poupar os pontos.
Uwe simula um voo de Lisboa para Oslo — precisamente a viagem que evitou fazer em 2018. Só a ida retira-lhe 910 “kyotos” ao plafond anual. Se voltar de avião, são mais 910. Restam-lhe 1.180 para o resto do ano. Para se ter uma noção de como se gastarão rapidamente, cada refeição de carne retira 14 “kyotos”.
Outra ferramenta útil para este cálculo é o Atmosfair, um projeto de organizações ambientais alemãs que é apoiado pelo próprio governo de Berlim. É uma calculadora de emissões que permite estimar a quantidade de dióxido de carbono emitida por cada passageiro em cada voo. Por exemplo, um voo entre Lisboa e o Porto, em classe económica, representa cerca de 90 quilogramas de dióxido de carbono emitidos por cada passageiro.
“O YouTube consegue isto sem a pegada carbónica”
Consciente do impacto das viagens aéreas na atmosfera, o investigador português Gil Penha-Lopes, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, também reduziu significativamente a quantidade de vezes que anda de avião — e dedica-se agora a promover conferências científicas mais inovadoras, que consigam manter as vantagens da interação humana mesmo quando são realizadas à distância.
Investigador na área do impacto das alterações climáticas e coordenador de projetos nacionais e europeus nesta área, Gil Penha-Lopes viajava de avião, entre 2012 e 2016, uma ou duas vezes por mês. Em 2017, só fez uma viagem. “Comecei a perceber a necessidade de haver uma coerência entre a teoria, o discurso e a prática. A maioria dos cientistas, a maior parte das pessoas que mais percebem de emissões de carbono, são das pessoas que mais consomem. Eu, comparado com o resto do mundo, estou nos 5% que mais poluem. São viagens para promover iniciativas climáticas, mas não considero que todas estas conferências sejam altamente produtivas. Muitas são apenas comunicação unidirecional, 15 minutos, quase sem perguntas. O YouTube consegue isto sem a pegada carbónica”, diz Gil Penha-Lopes ao Observador.
“Sou muito a favor dos eventos co-criativos, para desenhar estratégias de médio ou longo prazo, ou para finalizar algo que já foi começado e em que é preciso estarmos frente a frente”, explica o investigador. Já as reuniões de rotina dos projetos científicos podem perfeitamente ser feitas à distância. “No âmbito de um projeto, em vez de duas reuniões anuais presenciais, façamos só uma. Não podemos estar sempre a viajar.”
A ativista sueca Greta Thunberg já tinha usado um argumento semelhante para justificar a sua ausência de conferências do outro lado do Atlântico. “Um cientista a ir para uma conferência climática em 2019 é claramente uma emergência, para mim. Uma criança a voar à volta do mundo para dizer aos outros que reduzam as suas emissões de carbono não é.”
Claro que, reconhece Gil Penha-Lopes, “estar presencialmente é diferente”. “Quando estou presencialmente há o café, há as perguntas pessoais, há os abraços. A questão é: como recriar estes momentos à distância? É possível. Fazemos uma ronda de check-in para perguntar como está toda a gente, dividimos o grupo online em grupos mais pequenos para as pausas. Há muitas dinâmicas que se podem fazer. Cria-se a cultura e as pessoas percebem o benefício ecológico e familiar de não viajar.”
Aliás, é na família que se refletem os principais benefícios, assegura o investigador. Para Gil Penha-Lopes há um problema de raiz na vida das pessoas que leva cada um a pensar que só longe de casa é que consegue relaxar em condições. “Se as pessoas têm de viajar porque o trabalho cansa, devemos perguntar porquê esse trabalho e porquê de forma tão cansativo. Deve resolver-se a causa. As pessoas devem fazer o que gostam, de forma saudável para o ambiente e para a comunidade.”
“Muitas vezes moramos em bairros que não estão desenhados para nos sentirmos bem e consideramos que é nas férias que vamos estar melhor, mais bem servidos. Mas deveríamos reduzir a necessidade de ir para fora para relaxar. As pessoas devem ir para fora para conhecer e aprender. As férias como antídoto são prejudiciais para a pessoa e para o próprio ambiente”, defende o cientista.
Gil Penha-Lopes encontrou um sistema para tornar as férias familiares mais amigas do ambiente: alterna com a mulher, a cada ano, quem define o destino de férias. No ano de Gil nunca se anda de avião — já que o investigador se vê obrigado a voar pelo menos uma vez em trabalho. A família fica em Portugal ou anda de comboio pela Europa. No ano da mulher (que não voa habitualmente em trabalho), viajam de avião — mas sempre com o objetivo de ir conhecer uma cultura nova. Nunca para ir para a praia.
“Vá lá, deixem de nos chamar poluidores”
Além da flygskam para descrever a vergonha de andar de avião, a língua sueca já cunhou outro vocábulo associado ao crescente movimento anti-aviação: tågskryt — ou o orgulho de andar de comboio. E a indústria da aviação começa a sentir os efeitos desta revolta popular contra os aviões, sobretudo no norte da Europa. No início de junho, numa reunião que juntou centena e meia de líderes de companhias aéreas de todo o mundo em Seul, na Coreia do Sul, este foi um dos principais temas.
“Este sentimento vai crescer”, disse o presidente da Associação Internacional de Transportes Aéreos (IATA), Alexandre de Juniac, aos CEOs das companhias aéreas. No final da cimeira, o responsável falou aos jornalistas para lhes apresentar as ideias da indústria para reduzir o impacto negativo da aviação no ambiente. E deixou um apelo bem revelador do sentimento atual da indústria: “Vá lá, deixem de nos chamar poluidores”.
O objetivo da indústria aérea é chegar a 2050 com metade das emissões relativamente a 2005. Porém, o caminho que está a ser feito indica que dificilmente se cumprirá esse objetivo. Até lá, as companhias aéreas terão de enfrentar um inimigo que até aqui não pensaram como tal: os seus próprios clientes.
Há três aspetos centrais na redução do impacto ambiental da aviação: o recurso a combustíveis ambientalmente sustentáveis, a melhoria da eficiência das operações (com cada vez mais voos diretos) e o investimento em novos aviões e novas tecnologias, como destaca a agência Reuters.
A IATA garante que a utilização de bio-combustíveis poderá reduzir em 80% as emissões de cada voo. Mas as companhias aéreas não têm capacidade para o desenvolver e para o comprar. “A realidade de hoje é que simplesmente não há [bio-combustível] suficiente e é muito caro”, disse à Reuters o presidente executivo da KLM, Pieter Elberts. Em 2025, a IATA quer que 2% do combustível usado na aviação seja oriundo de fontes sustentáveis.
Em Portugal, a companhia aérea de bandeira também tem trabalhado neste sentido e aponta para os mesmos prazos que as suas concorrentes internacionais. “A TAP tem atualmente em curso um grande programa de modernização de frota onde integrará, até ao final de 2019, 37 novos aviões e, até 2025, 71 aeronaves, que são consideravelmente mais eficientes do ponto de vista de consumo de combustível e emissões de dióxido de carbono para a atmosfera”, explicou ao Observador fonte oficial da transportadora aérea nacional.
De acordo com a mesma fonte oficial, entre 2015 e 2018 a TAP reduziu em 13,5% as suas emissões de dióxido de carbono por passageiro — e estima reduzi-las em mais 4,5% este ano.
Embora a companhia aérea não tenha fornecido ao Observador os dados referentes às emissões de dióxido de carbono atuais e nos últimos anos, a TAP reproduz na sua página oficial na internet — na qual se compromete com a redução em 50% das emissões de dióxido de carbono até 2050 — os cálculos internacionais da indústria aeronáutica, que mostram como a combustão de uma tonelada de Jet Fuel (o combustível usado nos aviões) origina 3,15 toneladas de dióxido de carbono. Todos os aviões da TAP têm capacidade para várias toneladas de combustível nos seus tanques (o mais pequeno leva 2.405 litros, o maior leva 140.640).
Ainda de acordo com fonte oficial da TAP, a companhia aérea tem desde 2016 “um programa de renovação do interior de cabine da frota em operação onde foram selecionados materiais mais leves que permitiram retirar, a título de exemplo, na família Airbus A319, 700 kg ao peso da aeronave, o que se traduz num aumento da eficiência energética e ambiental da frota”.
“Não há outra forma”, dizem eurodeputados portugueses
Do grupo dos mais poluidores fazem parte, seguramente, os deputados do Parlamento Europeu. As reuniões em Bruxelas, os plenários em Estrasburgo e os curtos fins de semana de trabalho político nos países de origem obrigam a constantes viagens de avião. “O que podemos fazer é evitar ao máximo as viagens quando elas não são, de todo, imprescindíveis”, diz ao Observador a eurodeputada do Bloco de Esquerda Marisa Matias.
“Temos trabalho político a fazer em Portugal e temos um fim de semana para o fazer. Não podemos ir de comboio, porque isso levaria os dois dias do fim de semana”, sublinha a deputada bloquista, acrescentando que a viagem em que tenta poupar nas deslocações aéreas é a entre Bruxelas e Estrasburgo. Nesse caso, ou fica no fim-de-semana anterior em Bruxelas e segue de comboio, ou então, se tiver de ir a Portugal, faz metade do caminho de avião e a outra metade de comboio.
“Em Portugal, usamos ao máximo os transportes públicos. Mas, para ir para a Bruxelas, não há outra forma. O Bloco de Esquerda faz o pagamento da compensação carbónica, mas não é isso que vai resolver. É descargo de consciência. Há muitos anos que optei pelo comboio para Estrasburgo, mas em relação a Bruxelas não tenho alternativa”, explica.
Já Francisco Guerreiro, eleito pelo PAN nas eleições europeias deste ano — que vai ser o primeiro eurodeputado português a integrar o grupo parlamentar dos Verdes europeus —, assume também que “é impossível fazer de outra forma”. O deputado do PAN falou ao Observador após as eleições de maio, antes de fazer o primeiro voo para Bruxelas enquanto eurodeputado.
“É impossível fazer de outra forma. De comboio não dá mesmo, até porque entre Lisboa e Madrid não há comboios de alta velocidade”, disse na altura Francisco Guerreira, que não hesitou em apontar a culpa: é o “sistema, que está montado de forma a que haja essas impossibilidades”.
Mudar-se definitivamente com a família para a capital belga nunca foi uma opção: “A minha mulher tem cá trabalho e a minha filha mais velha tem a sua escola e os seus amigos. Não ia prejudicá-las”. Terá de fazer o percurso Bruxelas-Lisboa “quase todas as semanas” e, para compensar a pegada ecológica, tentará, “em todas as viagens, pagar um extra”.