O PM António Costa é uma personagem engraçada. Passou dois meses a jurar aos portugueses que tinha uma “maioria sólida, estável e duradoura.” Com essa maioria, foi para o governo. Mas, aparentemente, uma maioria absoluta não chega. Ataca o PSD por não colaborar com o governo e corteja a nova liderança do CDS, beijando com todo o descaramento a nova líder do CDS em pleno Parlamento. Aliás, aqueles beijos a Assunção Cristas são os verdadeiros beijos da morte. Costa quer uma maioria total, com ele no centro como PM, e manobrando-a ao sabor dos seus interesses do momento. Ora beija Catarina, ora beija Assunção.
O desejo pela maioria total mostra muito sobre a natureza do PS e da política nacional. Costa quer mostrar que o PS é o único partido que consegue fazer alianças com todos, desde o PCP e o BE até ao PSD e ao CDS. O sucesso dessa estratégia seria fazer do PS o partido natural de poder em Portugal. Quando os chamados críticos da liderança de Passos Coelho o acusam de recusar pontes com o governo estão a tornar-se cúmplices da estratégia de poder do PS. A aspiração de Rui Rio parece ser tornar-se um dia vice-PM de Costa. Espero que o PSD recuse, e recuse sempre, essa estratégia de subordinação política. António Costa não pode trabalhar para a polarização da política nacional às segundas, quartas e sextas, e depois sonhar com um bloco central às terças, quintas e sábados.
A pressão pela maioria total também mostra muitos dos maiores defeitos da política portuguesa. Constitui o que chamo a herança silenciosa do Estado Novo, e caracteriza-se por um desejo enorme pelos consensos nacionais, pela redução das divergências a radicalismos e pela distinção entre “nós” (a oligarquia do poder) e “eles” (o povo, a maioria dos cidadãos portugueses). O povo é reduzido a um exército de eleitores a quem convém agradar e conquistar durante as campanhas eleitorais. Mas entre as eleições, governa-se através de negociações e arranjos entre as elites oligarcas. Conhecem-se todos, andaram todos nas mesmas universidades, frequentam os mesmos restaurantes, convivem com os mesmos jornalistas, por isso não há nada que não possam resolver. As divergências e a oposição apenas complicam as arranjos de quem manda.
Por definição, o líder do principal partido da oposição goza de um lugar importante entre a oligarquia. Ao recusá-lo, Passos Coelho está a ser um “radical.” E alguns dos que cobiçam a liderança do PSD, desejam verdadeiramente aceder à oligarquia e participar nos acordos de restaurantes e gabinetes. Mas não o querem imediatamente, para não terem de penar anos na oposição. Mais próximo das eleições será mais conveniente. São os “Costas” do PSD.
Quem olhar para a política portuguesa sob a perspectiva do poder da oligarquia sobre o povo, entende a contribuição histórica do PSD. Deu ao país dois PMs que não vieram das oligarquias e que no fundo sempre recusaram integrá-las plenamente: Cavaco Silva e Passos Coelho. Por isso muitos os detestam. Mas num período em que a política será reduzida, sobretudo pelo PM, a um jogo de negociações permanentes, onde há um preço para tudo e para todos, será vantajoso ficar de fora do jogo. O PSD deve ser capaz de mostrar ao país e aos portugueses as vantagens de ter uma liderança que se recusa a participar nos jogos negociais das oligarquias. Masi, que essa é a melhor maneira de defender os interesses da maioria dos portugueses.
Mas isso não chega e deverá ser acompanhado de um trabalho sério na oposição. É na oposição que se prepara o poder. A verdade é que o PSD chegou ao governo em 2011 sem ter feito devidamente o trabalho de casa. Curiosamente, foi o programa da “troika” que disfarçou essa impreparação. Um trabalho sério na oposição exigirá uma certa coordenação com o CDS. Toda a gente sabe que o PSD e o CDS só poderão voltar ao governo juntos. Os dois partidos deveriam fazer grupos de trabalho conjuntos para apresentarem reformas ao país. De certo modo é o que o PS e o BE estão a fazer e sobretudo estão a testar a possibilidade de concorrerem juntos às próximas eleições.
O debate entre a “social democracia” e o “liberalismo” é inútil e mesmo estúpido. A história do PSD mostra que o partido tem correntes mais sociais-democratas e outras mais liberais. Mas esse pluralismo constitui uma riqueza e não um problema. Os grandes partidos são pluralistas e é com esse pluralismo que conquistam o poder. Num grande partido político, a definição ideológica excessiva apenas diminui, não ajuda a crescer. E as acusações de um “excessivo liberalismo” contra o anterior governo são patéticas. No contexto de 2011, qualquer outro PM do PSD, chame-se ele Rui Rio, Morais Sarmento ou José Eduardo Martins teria, no essencial, feito o mesmo. E se não o fizesse, teria fracassado.
No meio da discussão política, é útil reter o essencial. O sucesso de um governo mede-se, acima de tudo, pelo estado em que deixa o país quando abandona o poder. Em 2011, o governo do PS deixou Portugal numa recessão com o desemprego a aumentar, arruinado e dependente de uma ajuda financeira externa para o Estado cumprir as suas obrigações essências. Em 2015, o governo do PSD e do CDS, deixou um país sem depender dos seus credores, afastado da falência, a crescer economicamente e com o desemprego a baixar. Serão estes critérios que irão avaliar o actual governo. Estou convencido que será a economia, e não as finanças públicas, a derrotar este governo. Nessa altura, o PSD (tal como o CDS) deverá estar em condições de convencer os portugueses que tem as políticas necessárias para ajudar o país a regressar ao crescimento económico e à criação de emprego. É na oposição que isso se prepara.