Onde vai esta semana? A Pirescoxe jogar dominó com Jerónimo de Sousa? Era bonito e dava um lindo momento televisivo. Diga-me uma coisa: acredita que vai ser eleito pela esquerda ou acha que pode convencer a esquerda a abster-se? Algo me diz que a última hipótese – convencer a esquerda a ficar em casa – é aquela em que aposta.
Mas, desculpará que lhe pergunte, já se lembrou que pode ganhar por esmagadora maioria entre os portugueses telespectadores e ter um fraco resultado entre os portugueses eleitores? Os portugueses eleitores são manhosos e calados – maioria silenciosa não é? Pelo contrário os portugueses telespectadores são peremptórios e algo espalhafatosos.
Dir-me-á o senhor professor que os portugueses eleitores e os portugueses telespectadores são a mesma pessoa. Ora, ora, senhor professor, este é o país em que a divisão entre o eu e o mim tem dado alguma filosofia, óptima poesia e pode, acredito eu, dar um resultado eleitoral surpreendente. E que não lhe será favorável.
Talvez não tenha percebido ainda mas não se vota com o comando da televisão. Fosse esse o caso e o senhor professor estava para lá de eleito.
Mas para que os votos caiam na urna cada português-eleitor tem de dizer ao português-telespectador para se levantar do sofá ou da cadeira do café e ir para a fila. E isso, acredite, não só não é fácil como se rege por umas regras que escapam ao Portugal das televisões, onde o senhor professor é sem dúvida presidente por aclamação. Está, por exemplo, a ver o Cavaco (chamemos-lhe assim porque é assim que os telespectadores o tratam)? O Cavaco é o eterno derrotado do país dos telespectadores. No país dos telespectadores não existe aliás nada mais simpático, consensual e transversal que dizer mal do Cavaco. É assim como falar do tempo. Uma pessoa não tem que dizer, um comentador não quer desagradar a ninguém, um político precisa de dizer alguma coisa sem se comprometer, e pronto têm logo ali o Cavaco a jeito. Resulta sempre.
Mas num remake político da heteronímia de Pessoa mais de dois milhões de portugueses telespectadores transformam-se em eleitores de Cavaco Silva de cada vez que ele se apresenta a eleições. Algo me diz até que enquanto vão às urnas colocar o voto no “professor Cavaco Silva” deixam em casa o português telespectador a dizer mal do Cavaco e a ouvir dizer mal do Cavaco. Complicado? Nem por isso. Português? Sim.
E é aqui que chegamos ao que lhe quero dizer: o senhor professor é o eleito indiscutível dos portugueses telespectadores, uma espécie de imperador das sondagens, mas arrisca-se a não conseguir que os portugueses eleitores se mexam para lhe dar o seu voto. Ou seja corre o risco de ser o inverso de Cavaco Silva.
Porquê? Porque a sua coerência ideológica neste início de campanha (e, senhor professor, não só!) é a versão política da grelha de televisão de um canal generalista: completamente transversal, feita para agradar a todos e sem nada que a distinga. O português telespectador vê e aplaude. E o português eleitor? Acha-lhe graça mas perceberá que a esquerda que também lhe dava audiências não lhe vai dar votos. O pior é que, naquilo que aos votos respeita, o mesmo se pode vir a passar com o centro e o centro-direita: não o rejeitam mas ficam em casa.
Os tempos estão feios. Os sinais do rolo compressor do frentismo já estão aí todos. (Na verdade, se fosse um líder do PSD a adoptar a estratégia de Costa, o mínimo que o senhor professor teria dito é que ele estava lelé da cuca!) Não ignora certamente o que nos espera: incidentes, desprezo pelos procedimentos, imposição de uma agenda de causas que permita manter o povo distraído do agravamento da situação económica e mobilizado no combate sempre a mais uma desigualdade, mais uma discriminação, mais uma injustiça… Tenho aliás a intuição que entre as causas fracturantes dos casamentos, aborto e eutanásia ainda chegaremos à discussão sobre a regionalização.
Viu, como todos viram, que o líder do PS não foi à tomada de posse do Governo. Viu, como todos viram, como Ferro Rodrigues se tornou presidente da AR contra a prática até agora seguida. Viu, como todos viram, que António Costa tornou o PS refém do PCP e do BE e o que tem para dizer é que no seu modelo de presidência “não há bons bem maus, preferidos e preteridos”? Como se o que estivesse em causa fosse uma questão de gosto, tipo só vejo as novelas da TVI, e não o trazer para o arco da governação partidos radicais que não mudaram um parágrafo nos seus objectivos e nas suas tácticas.
Senhor professor, somos todos excelentes pessoas mas muitas pessoas excelentes têm ideias nada excelentes. Os radicais do BE e do PCP são disso um claro exemplo. Tentar transformar, como fez, as reservas face a um governo que deles dependa numa espécie de preconceito garante audiências mas só isso.
Sei que o senhor professor é o mais consensual dos portugueses. Mas lamento informá-lo: não está candidato a Miss Simpatia mas sim a Presidente da República. E ao certo, além de querer ser aplaudido, o senhor professor quer o quêe defende o quê em Portugal, neste final de 2015?