Não foram as ameaças a impedir a conferência de Jaime Nogueira Pinto. Foi o medo. Foi a conivência. Foi o reconhecimento da superioridade da extrema-esquerda. Caso Jaime Nogueira Pinto tivesse sido ameaçado por ultras de direita, neste momento a sua conferência não só teria lugar como até aconteceria num espaço mais solene. Diversos colegas, os dirigentes das juventudes partidárias, catedráticos de outras faculdades e os eleitos das associações de estudantes marcariam presença nessa conferência transformada em acto de desagravo e de força, do lado da liberdade. Todos fariam declarações inflamadas para os jornalistas que as repetiriam enfaticamente. Obviamente aqueles que tinham procurado impedir a conferência meteriam a violinha no saco e apareceriam a dizer que tudo aquilo não passara de um enorme mal-entendido.

Mas, como Jaime Nogueira Pinto foi ameaçado pela extrema-esquerda, nada disso acontece. Antes pelo contrário, a anulação da sua conferência é apresentada como um gesto de bom senso perante as tais ameaças e, o que não é dito mas está implícito, também perante as ideias de Jaime Nogueira Pinto e de quem o convidou, ideias essas que têm o condão de irritar aquelas almas inflamadas mas bem intencionadas. Aliás, se nós formos bonzinhos, fofinhos, queriduchos eles não se irritam. São até bons rapazes. Vejam como eles se portam bem nas conferências do professor Boaventura!

Mas o facto de a conferência não ter lugar, não quer dizer que não aconteça nada. Antes pelo contrário, estão a acontecer inúmeras coisas e nenhuma delas é boa. Para começar, os intolerantes que conseguiram que a conferência fosse anulada alargaram não só o seu poder, mas também o seu âmbito de actuação: a acusação de fascismo, colonialismo, machismo… ou o que lhes der na telha, cairá cada vez mais sobre os mais inesperados alvos. Por exemplo, sobre professores da casa, sobre outros potenciais convidados (naturalmente, para lhes evitar as invectivas, os painéis de debate estreitar-se-ão, não vá outra vez ouvir-se falar mal da FCSH – Faculdade de Ciências Sociais e Humanas) e sobre o próprio quotidiano da faculdade. Seria interessante, por exemplo, perceber qual o poder desta tribo ululante na hora de se decidirem avaliações, projectos de investigação e contratações.

Na verdade, nada disto é novo – a atracção pelo totalitarismo é quase uma tradição nas universidades no mundo ocidental – e funciona sempre da mesma forma: primeiro a pretensa RGA (quanto alunos estiveram presentes? Quantos votaram?) onde se toma uma decisão. Em seguida a tentativa por parte dos responsáveis da instituição de mostrar bom senso perante o que é apresentado como um conflito entre radicais. Por fim, daqui por uns anos, ainda teremos de ouvir umas recordações patético-românticas dos que agora na Avenida de Berna se calam perante estes factos contra os quais, dirão, eles estiveram contra, obviamente. Mas, acrescentarão com ar blasé, não se podia fazer nada. Podia. E devia.

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