A maioria dos analistas está convencida que Hilary Clinton ganhará facilmente a Trump nas presidenciais. De acordo com a visão dominante, Trump foi eleito nas primárias do partido republicano porque as bases republicanas são radicais e extremistas. Mas esse radicalismo, dizem-nos, não sobreviverá ao teste eleitoral nacional. Afinal de contas, as eleições vencem-se ao centro. Não estou convencido com este argumento. Também julgava que Trump nunca seria eleito candidato republicano; mas foi.

O eleitorado republicano que escolheu Trump está próximo do americano comum. Não foram os radicais religiosos que votaram em Trump. Esses votaram em Ted Cruz. Tal como tinham votado no passado na senhora do Alasca. A direita extremista e religiosa sempre foi minoritária nos republicanos, e continua a ser. O que mudou foi a maioria do eleitorado moderado. Deixou de votar em candidatos moderados porque está zangado. Está zangado com o poder de Washington, a riqueza de Wall Street e os políticos em geral. Trump é o candidato anti-político. É populista, mas não é um extremista ideólogo como Cruz. Aliás o seu discurso é anti-ideologia, populista e oportunista.

As elites republicanas nunca aceitaram Trump precisamente por causa do seu populismo anti-político. Não foi devido a qualquer radicalismo ideológico. Quando só restavam dois candidatos, apoiaram Cruz, que é bem mais extremista (e perigoso, ‘if I may add’). A oposição dos dirigentes republicanos a Trump foi a reação típica de qualquer aparelho partidário: tentaram travar o tipo de fora do partido. Preferiram um extremista da família a um populista de fora. Ao contrário, as bases votaram em Trump precisamente porque ele vinha de fora.

A dimensão anti-política e anti-partidária é o que verdadeiramente me preocupa. E é o que pode levar Trump à Casa Branca. As primárias em ambos os partidos mostraram que os americanos estão zangados com a ‘América’. Haverá certamente muitas razões, mas o fosso crescente entre os mais ricos e a classe média é com certeza uma das mais fortes. A economia americana está a crescer, mas a maioria dos americanos não sente qualquer melhoria nas suas vidas. Para um admirador dos Estados Unidos como eu, custa muito admitir mas a verdade é que a economia norte americana deixou de beneficiar as classes médias. Por isso, Trump é o candidato republicano. E por isso Sanders, uma figura inacreditável do século passado, conseguiu tantos votos nas primárias democratas.

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Por estas razões, não é útil recorrer apenas às categorias convencionais – direita e esquerda ou republicana e democrata – para analisar as eleições americanas. Grande parte do eleitorado votará de um modo transversal. Haverá republicanos a votar em Hilary e seguramente parte do eleitorado de Sanders votará em Trump. De resto, o populismo de Trump inclui posições típicas das esquerdas: os ataques à globalização e ao comércio livre, e a defesa do aumento da despesa pública em programas de segurança social e de saúde (se for eleito, Trump pretende expandir os programas de saúde introduzidos por Obama).

Além da insatisfação generalizada das classes médias americanas, há uma segunda razão que me leva a temer uma vitória de Trump. É muito melhor do que Hilary em campanha. Como todos os populistas espertos e habilidosos, Trump sabe falar para as massas e sabe conquistar votos. Não tem escrupulos de qualquer espécie, não distingue a verdade da mentira, dizendo o que é conveniente aos seus interesses. Será um adversário temível para a candidata democrata. Devemos reconhecer igualmente que Clinton é fraca em campanha. Não convence, não inspira e não mostra convicção. Parece que está a fazer um frete. Só um candidato fraco perderia tantos estados contra uma personagem como Sanders. É espantoso como o partido democrata só conseguiu arranjar Clinton e Sanders como candidatos. O que mostra que os democratas não estão muito melhor do que os republicanos.

Estou convencido que a vitória de Hilary seria melhor para os Estados Unidos, para a Europa (gostava de ver Merkel e Clinton a trabalharem juntas) e para o mundo. No entanto, e desejo estar enganado, receio que Trump possa ser eleito presidente americano em Novembro.