Rainer Höss, que aos 12 anos soube que o avô era o comandante do campo de concentração de Auschwitz, está a fazer campanha numa associação sueca para convencer os europeus a votarem contra a extrema-direita.
O rapaz não entendia porque é que o jardineiro do seu colégio interno, sobrevivente do Holocausto, era constantemente mau para ele, até ao dia em que um professor lhe explicou que o seu avô Rudolf Höss tinha sido o nazi responsável pela morte de mais de um milhão de inocentes.
Aos 48 anos, Rainer Höss fez do seu fardo familiar o motor do seu empenho contra a extrema-direita e é, agora, a figura de proa de uma campanha sueca hoje lançada contra a ascensão dos neonazis na Europa, quando se aproximam as eleições europeias (22 a 25 de maio).
“Eu ignorava tudo sobre Auschwitz, não sabia nada da minha família, só sabia que o meu avô tinha participado na guerra, como milhares de outros”, disse Rainer Höss, numa visita recente a Estocolmo, citado pela agência de notícias francesa, AFP.
Iniciativa do Movimento da Juventude Social-Democrara da Suécia (SSU), a campanha intitula-se “Não esquecer nunca. De votar”.
Esta organização considera que o melhor meio de os eleitores deterem “a crescente ameaça dos neonazis” no continente é irem às urnas.
“Ter o Rainer à frente do movimento é provar que ele não conseguirá jamais esquecer e que nós também não nos devemos esquecer”, sublinhou o secretário-geral da SSU, Gabriel Wikström.
Apesar da reprovação de alguns membros da sua família que preferiram enterrar o passado, Rainer Höss passou mais de 20 anos a fazer pesquisas sobre as suas próprias origens e sobre o nazismo.
A sua tia Brigitte, uma dos cinco filhos de Rudolf Höss, escolheu calar essas memórias e só no ano passado, aos 80 anos, com cancro em fase terminal, é que decidiu contar a sua história ao Washington Post.
Ela fugiu da Alemanha para se tornar manequim da marca Balenciaga, em Espanha, conheceu um engenheiro norte-americano, emigrou com ele para os Estados Unidos e terminou a sua carreira numa ’boutique’ de luxo em Washington, propriedade de uma judia.
Embora tenha acabado por lhe contar quem era, manteve o seu emprego — e o segredo ficou bem guardado.
Rudolf Höss foi o comandante que esteve mais tempo em Auschwitz, tentando diversos métodos para acelerar a “solução final”, antes de optar pelo pesticida Zyklon B.
Foi detido pelos Aliados em 1946, entregue à Polónia e enforcado no ano seguinte, perto de um crematório de Auschwitz.
“Ele trouxe muito sofrimento à nossa família, não apenas aos seus filhos, mas por muitas décadas: Geração após geração, carregamos a mesma cruz, a que ele colocou sobre os nossos ombros”, observou Höss.
O neto do oficial nazi, que usa a estrela de David ao pescoço, dedicou os últimos quatro anos a sensibilizar os alunos para os perigos do racismo e do antissemitismo, na Alemanha e noutros países.
“A extrema-direita não é estúpida, está a engrossar as suas fileiras, a ganhar terreno, muito lentamente mas de forma muito eficaz”, declarou à AFP. “Sou muito agressivo em relação a eles, cada vez que posso agir contra eles, faço-o”, admite.
As suas investigações levaram-no a encontrar-se com vários sobreviventes do Holocausto e também participou num documentário em Israel. “Era um pouco delicado, enquanto neto de um assassino em massa, ir a Israel”, comentou.
Aí, conheceu um grupo de estudantes judeus que lhe perguntou o que teria ele feito se tivesse conhecido o seu avô e, apesar de hoje considerar que a sua resposta foi “demasiado impulsiva”, na altura, ela foi muito difundida: “Tê-lo-ia matado”.