Chegou o dia. Foram quatro anos de espera. De dúvidas, milhões de euros a derrapar, estádios a serem erguidos e 32 seleções a galoparem rumo ao Brasil. De expetativas a amontoarem-se, sonhos a cumprirem-se e de lesões mascaradas de pesadelos. A partir das 19h15 – hora de arranque da cerimónia de abertura – carrega-se no último botão que faltava para colocar tudo no modo ‘on’. Às 21h, a bola começa a rolar. Vai saltitar entre pés brasileiros e croatas, a nacionalidade à qual saiu a rifa de enfrentar a nação anfitriã, após 64 anos a acumular ansiedade de voltar a acolher uma Copa do Mundo.
Pois é. Em 1950, o Brasil acolhia o primeiro campeonato do mundo e quase tudo se desenhou como um conto de fadas. O problema foi que, como qualquer história que se preze, esta teve uma reviravolta no final — a canarinha, em pleno Estádio Maracanã, a abarrotar com mais de 200 mil pessoas, perdeu no último jogo. Malditos uruguaios, ainda hoje dizem os brasileiros, quando relembram o fantasma que, naquele dia, o Uruguai criou para lhes atormentar o sono.
Quinze mundiais depois, a prova regressa à casa que se gaba de ter aperfeiçoado o jogo que os ingleses se anteciparam a criar. A partir de hoje, 12 de junho, o Brasil reencontra-se com a sua história. E histórias com sotaque mundialesco foi coisa que não faltou no Observador. Escrevemos, pesquisámos e conversámos para, nos últimos dez dias, juntar vários episódios criados pela inspiração de uma prova que já dura desde 1930.
Embarcar na relevância do cabelo para os argentinos e na estátua gémea de Eusébio do outro lado do Atlântico. Parar a meio do caminho com a “manigância” que tramou Portugal em 1966 ou o francês que desmaiou e ficou sem dentes em 1982. E aterrar com o pontapé que fez o mundo gozar com o Zaire e o assassinato que arranjou a desculpa num auto-golo colombiano. Foi com estas malas e mais umas quantas – que pode ler ou reler, por aqui – que fomos completando a viagem até ao Brasil.
As histórias farejam-se e encontram-se em todo o lado. E na margem brasileira do Atlântico está Ricardo Oliveira Duarte, por enquanto em Salvador da Bahia, a contar-nos diariamente o que se passou e vai passando na cidade que, a 16 de junho, recebe o primeiro jogo da seleção nacional, contra a Alemanha. Desde o solitário velejador que cruzou um oceano para só atracar em Salvador, até às obras atrasadas ou ao sotaque português que condimenta alguns doces. O Observador está e vai ficar no Brasil. E muitas mais coisas há para contar.
Depois, é deixar a bola e o relvado agarrarem no volante e seguir as suas orientações. Esta viagem só começa às 21h, mas (até) os portugueses já parecem acreditar que, à segunda, o Brasil não deixará fugir a chance de agarrar numa Copa do Mundo e não a deixar fugir de casa. Será? Luiz Felipe Scolari, hoje de volta à seleção-mãe, diz que “chegou a hora” e que “[dorme] bem” quando o sono o comanda a fazê-lo.
Quando, às 21h, se der o primeiro pontapé do Mundial 2014 no Estádio Itaquerão, em São Paulo, resta olhar para as caras dos croatas e ver se restam marcas de olheiras. “Se eu tivesse o Neymar do outro lado, claro que alguns pensamentos durante a noite podiam acontecer”, argumentou Scolari. Talvez. É preciso que alguém pergunte aos croatas.