Porque que é que foi preciso fazer tudo tão depressa?
Depois das contas divulgadas, que apanharam de surpresa até o Banco de Portugal, o BES ficou com um gravíssimo problema de falta de financiamento. Os investidores privados que estavam interessados no aumento de capital recuaram, querendo agora esperar pelas novas auditorias exigidas pelo regulador; os rácios de capital estavam em 5%, o que não permitia acesso a empréstimos do Eurosistema (para o que se exige um mínimo de 8%); e as ações estavam numa queda vertiginosa, fazendo o BES desvalorizar a cada minuto. Estava tudo em risco. Foi preciso agir — e agir depressa.
Porque é que não se podia recorrer a dinheiro privado?
Porque não havia tempo. As auditorias ainda vão demorar mês e meio. E em mês e meio o banco ia ao fundo. Banco de Portugal, Governo, Comissão Europeia e BCE fecharam-se numa sala dia e noite para pôr de pé um plano que evitasse a liquidação. O Governo recusou logo a nacionalização, porque não queria assumir um banco com contas ainda indefinidas (para além das razões políticas, essas evidentes); a recapitalização, como aconteceu ao BCP e Banif, tinha um problema idêntico: o Estado ficava com a maioria do capital, por via do empréstimo, e ficava com responsabilidades na administração, também sem as contas novamente auditadas.
Sobrou, assim, o uso do Fundo de Resolução.
O que é que vai ser feito, afinal, ao BES?
Vai ser partido em dois. Nasce o Novo Banco, que fica com tudo o que é bom e importante do banco (desde logo os depósitos, também os créditos à habitação, entre outros); tudo o que é mau, ou seja, ativo tóxico, fica no velho BES.
Agora, se quiser ir ao BES, dirige-se aos mesmos balcões, tendo a mesma quantia na conta, ou os mesmos créditos, com os mesmos contratos (que transitaram automaticamente para o Novo Banco), podendo fazer as transações sem qualquer problema. Também o NIB e IBAN permanecem iguais. Não se preocupe também com os débitos diretos ou com a entrada do salário na conta: eles permanecem tal como estão.
Também os depósitos constituídos junto do BESI, do BEST e do Banco Espírito Santo dos Açores, estão salvaguardados e não serão afetados, na medida em que a participação social detida pelo BES nessas instituições foi transferida para o Novo BES.
Mas já sabe: o nome mudou (embora a imagem vá demorar um bocadinho a ser alterada). Nota adicional: não esquecer que o BES, agora, é o ‘badbank‘, que fica só com os problemas.
O Novo Banco vai ter dinheiro?
Vai, não há razões para preocupação. Mais até, o cliente encontrará a mesma rede de balcões que conhece, será atendido pelo mesmo gestor e utilizará da mesma forma o BESnet, bem como os restantes canais (BESdirecto, MultiBanco, etc). Os clientes manterão o mesmo número de conta bem como os meios de pagamento de que dispõem (cartões de débito, cartões de crédito, cheques, etc).
Neste fim de semana o Novo Banco foi capitalizado, com recurso ao tal Fundo de Resolução. Assim, tudo foi aprovado pela Comissão Europeia e BCE. E o financiamento do Novo Banco fica assegurado quer pelo dinheiro do empréstimo, quer pelo acesso ao sistema financeiro europeu.
E o tal Fundo de Resolução? É o quê?
É uma coisa nova, que só começou em 2013 e que começou a ser financiado pelos vários bancos a operar em Portugal. Para já, só tem 367 milhões. O que é muito, muito pouco para o que precisa o Novo Banco. Por isso, o Fundo de Resolução pediu um empréstimo ao Estado. Na verdade, pediu acesso àquele dinheiro da troika que foi posto de parte para eventuais problemas no sistema financeiro.
O Fundo de Resolução, sendo uma pessoa coletiva de direito público, tem autonomia administrativa e financeira. E vai financiar a aplicação de medidas de resolução que sejam determinadas pelo Banco de Portugal. A sua gestão é feita por três pessoas, uma nomeada pelo Banco de Portugal, uma pelas Finanças e outra de comum acordo entre estas duas entidades. O Fundo é auditado pelo BdP e fiscalizado pelo Tribunal de Contas.
Quanto foi preciso?
O Novo Banco precisou de 4.900 milhões de euros. A linha da troika colocou entre 4.400 milhões e 4.500 milhões de euros. Usam-se também os 380 milhões que já estavam no Fundo. E o resto será colocado pelos bancos privados em Portugal. Este Fundo, que tem três administradores, é o único acionista do Novo Banco.
E agora, acontece o quê?
Agora, a administração do Novo Banco (que se mantém presidida por Vítor Bento, com mandato até 2017) ganha tempo para encontrar novos acionistas. O financiamento do Fundo de Resolução chegará para se apurarem as contas todas, ver se não há problemas (as auditorias chegam a meio de setembro), e iniciar contactos para que entrem os privados no banco. Nessa altura, o empréstimo será devolvido com o dinheiro da venda do Novo Banco. E o Fundo de Resolução, por sua vez, devolve ao Estado.
E o Estado? Pode perder dinheiro?
O Banco de Portugal diz que não. Se a venda do Novo Banco, daqui a uns meses, cobrir os 4,9 mil milhões de euros da sua capitalização, tudo será devolvido ao Fundo. Se não chegar para recuperar a totalidade do empréstimo, o restante terá de ser pago pelos outros bancos privados em Portugal. E o dinheiro será devolvido ao Estado. Neste cenário, estes bancos terão um problema maior, porque todo esse investimento terá de ser refletido nos respetivos balanços.
E eles aceitaram isso porquê?
Porque isto está na legislação. E porque se o BES fosse à falência agora, todos eles seriam muito prejudicados. A confiança no sistema bancário ruía e, muito possivelmente, as pessoas iam correr a levantar o seu dinheiro de todo o lado. Chama-se a isso estabilidade financeira.
Assim, além do mais, não vai haver interrupção do financiamento da economia.
O que é que fica no ‘bad bank’?
Primeiro convém explicar o que é isto: um “bad bank” é uma instituição criada exclusivamente para receber os denominados ativos problemáticos (nomeadamente, os de difícil cobrança) de uma ou mais instituições de crédito. Neste caso, ficarão lá os negócios ligados à família Espírito Santo e ao Grupo Espírito Santo, mas também as filiais do BES que têm maiores riscos, como o BES Angola, o Aman Bank for Commerce and Investment Stock Company e o Espírito Santo Bank. Tudo o resto que fazia parte do GES não sofre alterações e as participações detidas pelo velho BES junto destas entidades passam a ser propriedade do Novo Banco.
A lista de ativos tóxicos estava no domingo a ser fechada, para nada ficar no Novo Banco.
Já agora, foi o Banco de Portugal e o Fundo de Resolução a nomear a nova administração deste banco mau. São três quadros do Banco de Portugal, uma curta equipa liderada por Luís Máximo dos Santos, presidente da Comissão Liquidatária do Banco Privado Português (BPP), segundo noticiou o Expresso.
Apesar de todos os condicionamentos, o Banco Espírito Santo, S.A. continuará a desempenhar um papel fundamental para assegurar a eficácia da medida de resolução aplicada pelo Banco de Portugal. O Banco Espírito Santo, S.A. está legalmente vinculado a prestar todas as informações solicitadas pelo Novo Banco e a garantir-lhe acesso aos sistemas de informação relevantes. O Banco Espírito Santo, S.A. deverá ainda prestar ao Novo Banco todos os serviços que este considere necessários para o regular desenvolvimento da atividade transferida.
E o que acontece a tudo isso, que ficou no ‘bad bank’?
O património do BES que não foi transferido será gerido pelos administradores designados pelo Banco de Portugal e integrará posteriormente a massa insolvente no respetivo processo de liquidação judicial.
E como é que isso funciona?
Uma vez que o Banco Espírito Santo, S.A. já não estará a exercer qualquer atividade, o Banco de Portugal acabará por revogar a respetiva autorização para o exercício da atividade. Essa decisão produzirá os efeitos da declaração de insolvência, que originará, por sua vez, um processo de liquidação judicial do Banco Espírito Santo, S.A.. Este processo de liquidação incidirá apenas sobre os passivos e os ativos que não foram transferidos para o Novo Banco. Os custos associados a este processo serão os que decorrem de qualquer processo de insolvência e serão suportados pela massa insolvente.
Quanto é que o Fundo de Resolução vai pagar de juros ao Estado?
Isso ainda está a ser definido. Deve saber-se esta segunda-feira.
Voltando ao velho BES: quem tem ações, o que lhe acontece?
Para já, fica o BES sai da bolsa. É suposto que o BES (o ‘bad bank’) trabalhe para recuperar os créditos, embora claramente vá ser uma missão muitíssimo difícil. A melhor expectativa que os acionistas (mesmo os pequenos) têm, é que o Novo Banco seja vendido por mais do que o seu capital atual. Aí, há uma cláusula que permite passar o lucro remanescente para o BES, o velho.
Ah! Um ponto adicional: o BES velho, o ‘bad bank’, não tem licença bancária.
Então e os acionistas do velho BES? Que lhes vai acontecer?
Tendo em conta que a atividade do BES que não foi transferida para o Novo Banco integrará o processo de liquidação judicial, os direitos que poderão caber aos acionistas deverão ser exercidos no processo de liquidação do BES, nos termos da lei.
Sendo certo que, por força da ordem de subordinação que resulta das disposições legais e contratuais aplicáveis, tal só poderá suceder depois de todos os outros créditos sobre a insolvência terem sido satisfeitos.
Convém sublinhar que, nos termos da legislação em vigor, a decisão de transferir parte da atividade do Banco Espírito Santo, S.A. não depende do prévio consentimento dos acionistas. Contudo, a decisão de aplicar uma medida de resolução é impugnável, pelo que os acionistas podem recorrer desta decisão.
Já agora, o que acontece aos clientes com ações ou dívida subordinada do BES?
Tanto o investimento em ações BES como em dívida subordinada BES não farão parte do Novo Banco. Estes investimentos continuarão a constar do património integrado dos clientes no extrato ou BESnet, tal como quaisquer outros títulos ou dívida de outras empresas no mercado.
E quem tiver fundos ESAF, PPRs ou seguros de capitalização?
O investimento em Fundos de Investimento, Seguros de Capitalização ou PPRs mantém-se como até aqui. Os clientes podem continuar a dar instruções de subscrição ou resgate da mesma forma que o faziam até ao momento.
Ok. Então e os trabalhadores do velho BES?
Passam todos para o Novo Banco. Com os mesmos direitos e contratos que tinham. Também o fundo de pensões permanece igual.
Dito isto, e chegando ao fim, o que acontece agora?
Agora, o Banco de Portugal espera que a situação normaliza. Alegando que os depositantes têm garantido um banco bem capitalizado; que as PME (e a economia, aliás) terão acesso ao crédito de forma normal; e que os outros bancos deixam de viver apavorados com uma falência do BES.
E, dito isto, é final feliz?
Isso será claramente dizer demais. Há ainda auditorias para fazer no Novo Banco, também uma situação muito complicada no velho BES – com acionistas, grandes e pequenos, pendurados, créditos de difícil recuperação, etc. Há, também, toda a situação do Grupo Espírito Santo, que está nas mãos de tribunais de outros países. Com certeza absoluta, muitos processos criminais vão entrar nos tribunais. Muitas investigações criminais em curso.
Mesmo no que respeita ao Novo Banco, ele terá a difícil missão de dar consistência e solidez às contas, sobretudo confiança aos mercados, para que a venda daqui a uns meses corra bem. Mas o que foi feito este fim de semana, pelo menos, limpou-lhe para já os balanços.
E se tiver mais dúvidas sobre isto tudo?
Bom, tem duas ou três hipóteses: os balcões do Novo Banco estão abertos e podem dar-lhe uma ajuda a explicar as coisas. Mas o Banco de Portugal criou também uma linha telefónica de apoio. Basta ligar 707 201 409, e estará disponível das 9 horas às 18 horas, todos os dias úteis. Há também disponível um P&R no site do Novo Banco, e outro no do Banco de Portugal, que podem ajudar.