O 65.º Festival de Cinema de Berlim, sensível a questões políticas, coroou este sábado o cineasta iraniano dissidente Jafar Panahi, proibido de trabalhar no Irão e de viajar para o estrangeiro, atribuindo o Urso de Ouro ao seu filme “Táxi”.

Na ausência do cineasta, o maior prémio da Berlinale foi recebido pela sua sobrinha, Hana Saeidi, atriz no filme. “Sou incapaz de dizer o que quer que seja. Estou demasiado comovida”, disse a rapariga, de lágrimas nos olhos, brandindo o troféu.

O presidente do júri, o realizador norte-americano Darren Aronofsky, declarou, por sua vez, que “os constrangimentos obrigam muitas vezes os contadores de histórias a fazer as suas melhores obras, mas esses limites podem por vezes ser tão opressores que destroem um projeto ou afundam a alma do artista”.

Contudo, “em vez de deixar que lhe destruam o espírito e de o abandonar, em vez de se deixar invadir pela ira e pela frustração, Jafar Panahi escreveu uma carta de amor ao cinema”, sublinhou, acrescentando que o seu filme está “cheio do amor que ele transmite à sua arte, à sua comunidade, ao seu país e ao seu público”.

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Muito aplaudido na Berlinale, “Táxi” é uma crónica da sociedade iraniana, através das deambulações de um motorista de táxi pelas ruas de Teerão, papel desempenhado pelo próprio realizador.

Os seus passageiros, iranianos, dizem muito sobre o seu país, cuja alma Jafar Panahi se esforça por captar.

Depois de “Isto não é um filme” e “Pardé”, esta é a terceira longa-metragem que Panahi realiza desafiando as autoridades iranianas, desde que foi preso em 2010, quando preparava um filme sobre as manifestações contra a contestada reeleição do então Presidente, Mahmud Ahmadinejad, em 2009.

Condenado a seis anos de prisão e 20 anos de proibição de realizar filmes e de viajar, o cineasta recuperou a liberdade, mas uma liberdade precária que lhe permite filmar clandestinamente sem, contudo, poder sair do Irão.

Observador politicamente empenhado da sociedade, Jafar Panahi, de 54 anos, é um ‘habitué’ da Berlinale: recebeu o Grande Prémio do Júri em 2006, com “Fora-de-Jogo”, e o prémio de melhor argumento em 2013, com “Pardé”.

Os Ursos de Prata para os melhores atores feminino e masculino recompensaram os desempenhos dos dois atores britânicos de “45 Years”, Charlotte Rampling e Tom Courtenay.

Neste drama de Andrew Haigh, eles encarnam Kate e Geoff, um casal envelhecido que se prepara para celebrar o 45.º aniversário de casamento quando um acontecimento abala as suas certezas.

O júri distinguiu também o cinema da Europa de Leste, entregando dois Ursos de Prata para o melhor realizador: um ao romeno Radu Jude, por “Aferim”, ‘road-movie’ histórico a preto e branco ambientado na Europa de Leste de 1835, e o outro à polaca Malgorzata Szumowska, por “Body”, a história de um médico-legista e da sua filha anoréxica que não consegue fazer o luto pela morte da mãe.

O cinema latino-americano foi igualmente destacado, com a atribuição do Grande Prémio do Júri ao realizador chileno Pablo Larrain, por “El Club”, que mergulha nos traumas do Chile através do estudo de uma comunidade religiosa destabilizada por um escândalo.

“El Boton de Nacar”, do outro cineasta chileno da seleção, Patricio Guzman, o único documentário em competição, que revisita a história do país, recebeu o Urso de Prata para o melhor argumento.

O prémio Alfred-Bauer, que todos os anos recompensa “um filme que abra novas perspetivas na arte cinematográfica”, foi atribuído a “Ixcanul”, primeira obra do guatemalteco Jayro Bustamante, a história de uma jovem maia que sonha abandonar o campo.

No ano passado, o Urso de Ouro foi para o ‘thriller’ chinês “Black Coal, Thin Ice”, de Diao Yinan.