A palavra utilizada foi “genocídio”, “o primeiro genocídio do século XX”. Foi desta maneira que o Papa Francisco se referiu ao assassinato em massa de arménios sob o domínio otomano na Primeira Guerra Mundial, durante uma cerimónia no Vaticano onde se assinalavam os 100 anos da Grande Guerra. É certo que a declaração política do líder da Igreja Católica não vai agradar à Turquia, que tem negado sempre que as mortes tenham sido uma “limpeza étnica”.

A Arménia, apoiada por vários historiadores, tem reafirmado sistematicamente que 1,5 milhões de pessoas foram assassinadas às mãos das forças do império Otomano em 1915, num massacre que é visto por estudiosos em todo o mundo como o primeiro genocídio do século XX. A Turquia, contudo, nega esta classificação, afirmando sempre que o número de mortes está inflacionado e que se tratavam de vítimas da guerra civil. Segundo Ancara, o número de mortes não ultrapassa as 500 mil.

A maior parte dos países europeus e ocidentais reconhece o massacre como genocídio, apesar de países como Itália e os EUA evitarem usar o termo oficialmente, dada a importância que a Turquia representa como aliado estratégico. O governo de Ancara também é visto como um potencial aliado da Igreja Católica, nomeadamente na luta contra o fundamentalismo islâmico, que ameaça cada vez mais a paz mundial.

Perante uma plateia de fieis, o líder supremo da Igreja Católica começou por dizer que a humanidade viveu “três tragédias massivas e sem precedentes” no último século. “A primeira, que é considerada globalmente como o primeiro genocídio do século XX, atingiu o povo arménio”, disse, aludindo a palavras já usadas em 2001 pelo Papa João Paulo II. Depois, referiu-se aos “crimes perpetrados pelo nazismo e o estalinismo” e ainda aos genocídios que se seguiram no Camboja, Rwanda, Burundi e Bósnia.

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O Papa Francisco, que tem estreitas ligações com a comunidade arménia, defendeu a sua declaração, que já se antevia ser polémica, dizendo que era seu dever honrar a memória dos homens, mulheres, crianças, padres e bispos, que foram “assassinados sem sentido”. O presidente arménio Serzh Sargsyan assistia na plateia.

“Ocultar ou negar o mal é como permitir que uma ferida continue a sangrar sem a estancarmos”, disse o Papa no início da missa de domingo, na cerimónia católica arménia levada a cabo na Basílica de São Pedro em homenagem ao centenário do massacre.

Entretanto, o embaixador turco na Santa Sé cancelou uma conferência de imprensa prevista para este domingo, presumivelmente por já saber de antemão que o Papa iria pronunciar a palavra “genocídio”. A Turquia já reagiu, pedindo que o representante do Vaticano em Ancara explicasse as declarações do Papa.

De acordo com a Aljazeera, o anúncio chegou poucas horas depois de as afirmações de Francisco terem vindo a público. Segundo informações avançadas pelos canais de televisão NTV e CNN-Turquia, o Ministro dos Negócios Estrangeiros turco terá pedido ao representante que se apresente no ministério. A informação ainda não foi confirmada oficialmente, mas espera-se que um comunicado seja divulgado ao final do dia.

Em 2001, já o Papa João Paulo II tinha assinado um comunicado conjunto com o patriarca arménio onde denunciava o “genocídio”. Mas até hoje nenhum outro Papa tinha pronunciado a palavra proibida para definir as mortes naquele país entre 1915 e 1917.