A petrolífera anglo-holandesa Shell fez pressão para que o pacote Clima e Energia, que os 28 países da União Europeia (UE) negociaram em outubro do ano passado, tivesse metas fracas para as energias renováveis. E com sucesso, de acordo com o jornal britânico Guardian, que teve acesso a documentos que provam a pressão exercida pela Shell.

O compromisso sobre o pacote Clima e Energia contém metas vinculativas para a redução das emissões de gases com efeito de estufa em 40%, em relação aos níveis de 1990. Mas nas negociações tinha havido desacordo entre os Estados membros sobre a melhor forma de o conseguir. O Reino Unido e outros países tinham resistido a estabelecer metas vinculativas individuais para os Estados membros em matéria de eficiência energética e energias renováveis e isso acabou por não ser incluído no acordo final.

Os defensores das energias renováveis afirmam que essa era uma medida chave e que a oportunidade de mostrar aos investidores que a UE estava seriamente empenhada na energia limpa se perdeu. Agora os documentos divulgados mostram que já em outubro de 2011 a Shell estava a pressionar o presidente da Comissão Europeia, na altura Durão Barroso, para eliminar as metas para os cortes de carbono associadas à legislação favorável às energias renováveis.

Na altura, os ambientalistas consideraram o compromisso fraco, culpa talvez da dificuldade em gerir as vontades e necessidades diferentes dos 28 países. O New York Times deu dois exemplos: a Polónia, que é altamente dependente do carvão, e o Reino Unido, que não se mostrou disposta a assinar metas vinculativas sobre medidas como a percentagem de energia proveniente de fontes renováveis.

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A Shell argumentou que a aposta numa estratégia de expansão de gás com composição química semelhante à do petróleo levaria a UE a poupar 500 mil milhões de euros, na transição para um sistema energético de baixo carbono, em comparação com uma aposta centrada nas energias renováveis. “O gás é bom para a Europa, e a Europa é boa com gás“, escreveu o diretor-executivo da Shell, Malcolm Brinded, numa carta de cinco páginas endereçada a Durão Barroso.

A Shell acredita que a UE devia focar-se na redução dos gases de efeito estufa como o único objetivo climático para o pós-2020, e permitir ao mercado identificar a forma mais rentável e eficiente de atingir este alvo, preservando assim a competitividade da indústria, a proteção do emprego e o poder de compra dos consumidores, de modo a levar ao crescimento da economia.

De acordo com o Guardian, a Shell é o sexto maior lobista em Bruxelas, gastando entre 4.500 e cinco mil milhões de euros ano, de acordo com o Registo de Transparência do bloco.

Para além da redução das emissões de gases com efeito de estufa em 40%, o compromisso sobre o pacote Clima e Energia alcançado em outubro, em Bruxelas, contém metas vinculativas para a incorporação de energias renováveis (27%) até 2030, e objetivos indicativos em relação ao aumento da eficiência energética (27%) e interconexões (15%).