“Só o conhecia da televisão, mas o senhor é uma brasa!”, ouve-se uma senhora dizer, à passagem de Pedro Passos Coelho na Rua Direita do Montijo. Passos “até fico(u) corado”, mas continuou rua fora a receber elogios. “É muito elegante”, disse outra, esta mais nova, na casa dos 40, e a quem Passos pede licença para retribuir o elogio: “A senhora também é muito elegante, desejo-lhe tudo de bom e boa sorte”. Elogios à parte, na primeira vez que Passos saiu à rua ao fim de três dias de campanha oficial – e logo no Montijo, Setúbal – não houve sinais de manifestações organizadas, lesados do BES, nem de senhoras de cor-de-rosa. 500 metros, 30 minutos e muitos beijinhos depois, a coligação respirou de alívio.

O encontro com a população tinha sido anunciado aos jornalistas ao início do dia, numa alteração de última hora à agenda habitualmente distribuída com pelo menos um dia de antecedência. Estava marcado para as 17h, mas às 16h30 já Passos tinha chegado ao cruzamento da Bulhão Pato e começava a caminhada para “contactar com a população”. Não seriam, no entanto, precisos tantos cuidados, já que o ensaio de arruada no Montijo pouco teve de intervenções espontâneas e menos ainda de intervenções desagradáveis. As que houve, entre gritos de “para a rua!” ou “vai mas é arranjar emprego para os jovens trabalharem”, foram à margem do cordão de segurança.

A ideia era essa. O cordão de seguranças, apoiantes e jornalistas à volta do primeiro-ministro era tal que era difícil as pessoas se aproximarem. Duas crianças tentaram fazê-lo o caminho todo mas só tiveram sorte no fim. Era, na maior parte dos casos, Passos quem se aproximava das esplanadas e distribuía cumprimentos. Mas mesmo quem conseguia chegar-se à frente, e que até tinha uma história de crise, tinha coisas positivas para dizer: “Oiço dizer que há 20 mil vagas no IEFP mas é tudo mentira, estou desempregada e só me dão formações para fazer”, começou por dizer. Mas – surpresa – não foi em tom de queixa: “Eu sei que o senhor está a fazer o melhor, por isso continue. Bem haja”. Era o que se queria.

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“Oh menina, diga lá para ele olhar para aqui”, pede-nos uma mulher, na casa dos 70, que por acaso se encontrava num café onde a enchente tinha entrado. Passos olhou e …”Por mim, está no papo!”. Confiante mas não tanto assim, Passos alertou que ainda tinha duas semanas “difíceis pela frente”, mas que se estava a “esforçar muito” por conseguir resolver as coisas e garantir a “estabilidade” de que o país precisava. “Eu concordo consigo, precisamos de estabilidade”. Ufa. Depois de entrar em vários cafés e drogarias, de pisar a praça onde esteve Sá Carneiro em 1979 com a coligação da AD, que Passos fez questão de comparar com os tempos que correm, a arruada termina sem incidentes a registar.

Campanha à porta fechada

A palavra de ordem é não cometer erros. E para isso é preciso seguir o guião à risca, sem uma vírgula a mais nem uma vírgula a menos. O guião é, nada menos do que visitas oficiais a empresas, produtoras agrícolas e misericórdias culminando com almoços e jantares entre militantes, à porta fechada. Ou seja, sem encontros com a população.

O programa oficial desta terça-feira era, à semelhança do dos dias anteriores, o espelho disso mesmo: visita ao Museu Industrial e ao Parque Empresarial da Baía do Tejo, no Barreiro, visita à Santa Casa da Misericórdia do Barreiro, visita à empresa agro-alimentar Raporal, no Montijo e jantar-comício em Setúbal a fechar. A pequena saída à rua veio, portanto, destoar.

Passos Coelho é o primeiro a admitir, aos jornalistas, que a campanha de 2015 é diferente da campanha mais aberta e espontânea que foi em 2011. “É diferente, desta vez não estou na oposição, e já estive nas ruas de Portugal nos últimos quatro anos quando os tempos eram mais difíceis”, disse, admitindo que o ritmo de campanha, a saltitar de empresa em empresa, não tem sido o mais eficaz para os jornalistas poderem transmitir a “campanha lá para casa”. Mas já estava planeada assim “há muito tempo”.

Agora, o objetivo é outro: mostrar o que foi feito com “tranquilidade”, exibir o que foi feito e os planos de investimento para o futuro. “Temos do nosso lado alguma coisa para mostrar, nomeadamente investimentos importantes no setor agrícola e tecnológico”, disse aos jornalistas no Barreiro, junto ao espaço para o segundo terminal de contentores.

Certo é que os distritos de Lisboa e Setúbal e a região do Alentejo e Algarve são o terreno mais difícil para a direita, daí que tenham sido escolhidos como os indicados para começar a maratona e para aprofundar as áreas que consideram de maior sucesso: exportações, agricultura, turismo e requalificação industrial. Amanhã a caravana segue para Viana do Castelo, já não saindo do norte – onde se sente mais em casa.