Milhares de migrantes fugiram esta segunda-feira à noite do campo de Moria, na ilha grega de Lesbos, devido a um incêndio, aparentemente ateado de forma voluntária, indicou a polícia local.

Entre 3.000 e 4.000 migrantes fugiram do campo de Moria“, disse uma fonte policial citada pela agência noticiosa francesa AFP, sublinhando que ventos fortes estão a propagar as chamas.

Cerca de 150 jovens, instalados no campo, foram retirados das instalações e transportados para um jardim-de-infância na ilha.

As forças policiais afirmam que pode ter sido um grupo de migrantes a começar o incêndio que destruiu as instalações — tendas e unidades habitacionais, em protesto pela falta de condições do campo. A sobrelotação do espaço, a de condições sanitárias e os longos atrasos no processo dos pedidos de asilo têm causado tensões em Moria.

Já na segunda-feira de manhã, a tensão aumentou em Moria devido ao rumor de que os migrantes seriam deportados, em massa, para a Turquia, afirma a agência estatal ANA. Entretanto a polícia terá visitado o campo para acalmar os ânimos.

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De acordo com a UN Refugee Agency, cerca de 5,400 refugiados vivem na ilha grega de Lebos, mas a ilha só tem capacidade para 3,500 pessoas. Lesbos foi o principal destino para mais de um milhão de requerentes de asilo que chegaram às costas gregas da Turquia, desde que a crise de refugiados eclodiu em 2015.

Dados do Governo grego apontam que há mais de 13.000 pessoas em cinco ilhas, em instalações construídas para abrigar menos de 8.000.

Atualmente existem cerca de 60.000 refugiados e migrantes na Grécia, maioria dos quais quer viajar para a Alemanha e outros países do norte da União Europeia, mas não conseguem depois de vários desses países terem fechado as suas fronteiras, no início deste ano.

A situação é mais grave em Lesbos e outras ilhas do leste do mar Egeu, perto da Turquia, onde a maioria dos migrantes fica retida para registo. Os distúrbios nas ilhas gregas, que acolhem refugiados, são recorrentes.

O fogo parece estar agora sob controlo, mas os voluntários ainda estão trabalhar para distribuir água e a ajudar as famílias, na escuridão.

Refugiados na Grécia há seis meses à espera de respostas

Entre os 60 mil refugiados que estão na Grécia há alguns que esperam há seis meses por uma entrevista e outros que sabem que nunca terão o estatuto de refugiado, alertaram esta segunda-feira participantes numa missão humanitária naquele país.

Trinta e dois voluntários portugueses estiveram nos últimos meses a apoiar refugiados em Atenas e na ilha de Lesbos, na Grécia, uma iniciativa da Plataforma de Apoio aos Refugiados (PAR) e sobre a qual foi feito um balanço esta segunda-feira, em Lisboa.

Rui Marques, coordenador da PAR, lembrou, em declarações à Lusa, que os refugiados que estão na Grécia (24 mil deles crianças) não podem regressar aos países de origem, porque estão em guerra, mas também não têm um país de acolhimento, pelo que vivem “em grande angustia e desespero”.

E sobretudo, acrescentou, para os refugiados afegãos, que, ao contrário de sírios e iraquianos, não podem ser aceites no programa de recolocação, “por uma questão meramente administrativa”.

Rui Marques lembrou que no Afeganistão não há segurança e disse que nos campos da Grécia estão muitos afegãos desesperados.

O maior perigo para a Europa, para a segurança da Europa, para a fidelidade da Europa aos seus valores, é não dar uma resposta a estas pessoas, não ser capaz de as acolher”, alertou.
Paula Ferreira, uma voluntária que esteve nos últimos meses na ilha de Lesbos, onde trabalhou essencialmente com crianças, descreve assim o problema:

Conhecemos casos de pessoas que chegaram a 20 de março e estão à espera de poder formular o pedido de asilo, estão ali num vazio legal, não sabem como, quando, onde, o quê, não sabem nada”.
Explicou ainda que, apesar de alimentação aos refugiados, falta quase tudo e que às ilhas gregas se notou um aumento de chegadas de refugiados nos últimos meses, onde todos vão ficando “presos”, porque “não há escoamento”.

“São pessoas em situação de espera muito prolongada. Há um passado ao qual não vão voltar e há um futuro que é imprevisível. Têm duas entrevistas para serem recolocados noutro país e há pessoas que têm a primeira entrevista para daqui a seis meses”, relatou Inês Viterbo, outra voluntária, uma advogada do Porto, de 25 anos.

Diz Inês que as autoridades gregas fazem o que podem e que os gregos são muito solidários, mas que “há falta de recursos”, a mesma ideia que defendeu Rui Marques, quando disse que “o sistema tem de ser mais rápido” e lembrou que a Portugal chegaram muito menos refugiados do que aqueles que o país está disposto a receber.

Por agora, a PAR está na “linha da frente” e vai lá ficar mais seis meses, a ajudar pessoas “sem esperança, sem passado e sem futuro”. Mariana Barbosa, uma das coordenadoras da missão da PAR na Grécia, fala do “brilho de esperança” que deixou de ver nos olhos das pessoas.

O brilho no olhar que não lhe falta a ela nem a Miguel Oliveira ou Tiago Marques, outros coordenadores das missões, quando falam do trabalho em Atenas ou em Lesbos, o ensino e apoio psicossocial em Kara Tepe (Lesbos), mas também o desporto ou o cinema.

Ou o novo projeto de envolver os refugiados em ações para outros refugiados, como conta a Sofia, diretamente de Lesbos, o mesmo brilho dos coordenadores ou da voluntária Inês, quando fala do campo de Eleonas, em Atenas.

Assim, dito por Inês de um folego: “Levávamos 100 meninos do campo de Eleonas para uma escola e lá tinham aulas de inglês, matemática, grego, desporto, artes, e atividades, mas sobretudo ensinávamos os meninos a gerir emoções, impulsos, a conviverem uns com os outros, a dialogarem e a brincar como é suposto uma criança brincar, a aprender como é suposto uma criança aprender. É uma beleza retirar meninos de um campo de refugiados, levá-los para uma escola e proporcionar-lhes normalidade, como as crianças devem ter”.