Independência, autonomia e referendo são três das palavras que mais temos ouvido nos últimos tempos. Desde a Escócia, passando pelo Reino Unido, olhando obviamente para a Catalunha e agora Itália. A Europa anda numa roda viva de plebiscitos e o país da pizza e da pasta é só o mais recente.
Duas das regiões mais ricas de Itália vão protagonizar referendos este domingo para ganhar maior autonomia face ao governo central. Lombardia e Veneto, que juntas são responsáveis por um quarto da população italiana, estão à procura de uma semi-autonomia que lhes dê maior controlo sobre as finanças e a administração daqueles territórios. Ainda que ambas as regiões já tenham assistido a grandes campanhas pela total independência de Roma, os líderes de cada uma já deixaram bem claro que a consulta popular é sobre autonomia e não secessão.
Ainda que, ao abrigo da lei italiana, não seja obrigatório realizar um referendo, os governos das duas regiões insistem que as pessoas têm de votar. Mas tecnicamente, os plebiscitos são mesmo desnecessários – a constituição italiana permite às regiões que procurem alargar o poder local através do diálogo com o governo central, sem ser preciso que a população vote. A região de Emília-Romanha, por exemplo, iniciou este processo esta quarta-feira.
As regiões só têm de provar que têm as contas em ordem. Se existir défice no orçamento regional então isso é um obstáculo ao reconhecimento de maiores poderes”, explica Gian Candido De Martin ao The Guardian. O professor de direito constitucional na Universidade Luiss, em Roma, lembra que “este é o caminho que a Emília-Romanha decidiu tomar, não o referendo”.
A Lombardia e Veneto são ambas lideradas por governos de extrema-direita que querem um maior controlo sobre a emigração, assim como a educação e a indústria. A Lombardia, que tem como capital Milão, e Veneto, que conta com Veneza como principal cidade, correspondem individualmente a 20% do PIB italiano.
O referendo é apoiado pelo Movimento Cinco Estrelas, enquanto que o Partido Democrata, atualmente no governo central, rejeita a consulta popular e recomenda aos apoiantes que se abstenham. Alessandro Alfieri, o vereador democrata na Lombardia, refere que a posição do partido advém do custo do referendo.
Todos nós concordamos em ter mais controlo sobre a investigação científica, a educação e a inovação, mas não concordamos em deitar fora 55 mil euros”, atira Alfieri, acrescentando que “o referendo é uma despesa enorme e não muito necessária, especialmente se pudermos fazer o mesmo que a Emília-Romanha”.
Alessandro Alfieri ainda afirmou que outro motivo para os governos das regiões quererem fazer este referendo é o facto de a Liga do Norte, o partido de extrema-direita que controla a Lombardia e Veneto, estar a perder apoiantes no norte do país. Desta maneira, o referendo é uma tentativa de atrair apoiantes e reforçar o respaldo numa época pré-eleitoral em Itália.
Contudo, Luca Zaia, presidente de Veneto, e Roberto Maroni, presidente da Lombardia, garantem que tentaram dialogar com o governo central mas este nunca se mostrou recetivo; daí avançarem para os referendos.
Antes da própria região, uma cidade já se antecipou. Sappada, uma localidade montanhosa que fica na fronteira entre Veneto e Friuli-Veneza Giulia, está prestes a tornar-se a primeira cidade a mudar oficialmente de região: de Veneto para Friuli-Veneza Giulia, uma das cinco que são semi-autónomas. A mudança foi aprovada pelo governo italiano em setembro depois de um longo processo burocrático.
“Os motivos para as pessoas quererem fazer parte de Friuli são variados: nós temos o nosso próprio dialeto, que deriva do alemão, e culturalmente sentimo-nos mais próximos de Friuli”, explica Manuel Piller Hoffer, presidente da Câmara Municipal de Sappada. Em declarações ao The Guardian, Hoffer revela que “o principal motivo é económico: ao viver ao lado de uma região semi-autónoma, as pessoas vêem vantagens que não têm. Vêem as finanças a ser melhor controladas, um melhor serviço de saúde e investimentos sustentáveis a ser feitos – vêem um melhor nível de vida”.
E é este nível de vida que a Lombardia e Veneto querem. E que, muito provavelmente, vão conseguir.