Os pressupostos já tinham sido enunciados pelo deputado Duarte Pacheco mas, esta terça-feira à noite, Rui Rio clarificou aquilo que pode levar o PSD a pedir (ou não pedir) uma nova comissão de inquérito à Caixa Geral de Depósitos. “Só se justificará ter a comissão de inquérito no caso de a auditoria ter qualquer coisa que altere aquilo que possamos estar a ver, caso contrário, o principal objetivo é ter a auditoria”, disse o presidente do PSD.

Para Rui Rio, que já tinha dito estar a “avaliar” a posição do PSD relativamente a uma nova — a terceira — comissão de inquérito ao banco público, há duas condições para defender essa via: o Banco de Portugal não disponibilizar aos deputados a auditoria, por um lado, e que essa auditoria, sendo disponibilizada, tenha “qualquer coisa que altere aquilo que possamos estar a ver” (dados novos).

O primeiro pressuposto do presidente do PSD estará assegurado. A Caixa Geral de Depósitos disse ao Observador que pediu “ao Banco de Portugal e à Procuradoria-Geral da República autorização para divulgar aos deputados o relatório final da auditoria”. Essa luz verde foi dada pelo Ministério Público, que deixava nas mãos da Caixa a decisão de remeter o documento ao Parlamento, depois de expurgado de informação sigilosa. Ainda esta terça-feira, a TSF adiantou a informação de que, ainda antes de o comunicado da PGR ser divulgado, a CGD já tinha pedido à consultora EY para limpar do documento os dados protegidos.

Falta saber se, aos olhos de Rui Rio, a autoria tem ou não “qualquer coisa que altere aquilo que possamos estar ver” — não ficando claro a que se reportava exatamente o presidente do PSD nesta formulação. Neste momento, e quando já muita informação acerca do relatório da EY foi publicada, fica claro que a auditoria trouxe a público a forma como vários créditos concedidos pelo banco público foram aprovados contra o parecer do grupo de análise de risco ou, noutros casos, sem que tivesse sido feita a análise desse risco.

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A auditoria revela que, no banco público, sobretudo entre 2007 e 2012, houve:

  • Operações aprovadas com parecer de análise de risco desfavorável ou condicionado e para as quais não foram encontrados documentos ou justificações para suportar a tomada de risco contra o parecer dos serviços técnicos;
  • Casos em que não foi apresentado um parecer técnico da direção de risco para aquela a operação, sem que exista justificação para tal;
  • Casos onde não foi encontrada evidência de que tenha sido levantada toda a informação necessária para fundamentar a aprovação da operação (por exemplo, estudos de viabilidade e licenças);
  • Casos em que as garantias no contrato não são suficientes para assegurar o rácio de cobertura de 120%, como estava previsto no quadro normativo.

O CDS tomou a dianteira da discussão sobre uma eventual nova comissão de inquérito, já na noite de terça-feira. Imediatamente depois de a Procuradoria-Geral da República ter emitido um comunicado onde dizia não levantar quaisquer objeções ao envio da auditoria ao Parlamento —, empurrando essa decisão para o Banco de Portugal —, o deputado João Almeida dizia ao Observador que a proposta de constituição da comissão de inquérito seria apresentada “o mais depressa possível”. À imagem das anteriores, esta comissão deverá concentrar-se em “apurar as responsabilidades pelas imparidades que a CGD vai registando“.

Mais contido, o PS apresentou determinadas condições para que se posicionasse a favor de uma nova comissão. Contrariamente ao PSD, os socialistas fazem depender a comissão de inquérito da entrega da auditoria à Caixa no Parlamento — se o documento chegar às mãos dos deputados, não se justifica nova comissão. A segunda condição passa por garantir que Marcelo Rebelo de Sousa promulgue um diploma aprovado há três semanas pelo Parlamento e que obriga os bancos a fornecer toda a documentação bancária requerida pelas comissões de inquérito.

Se essas duas condições estiverem reunidas, o PS apresentará essa proposta para uma nova comissão parlamentar”, afirmou o deputado socialista João Paulo Correia no Fórum TSF.

À esquerda, as posições dividem-se. Depois de PSD e CDS terem acusado comunistas e bloquistas de impedirem as duas primeiras comissões de inquérito de chegar a conclusões, o secretário-geral do PCP não vê vantagens em voltar a esse modelo e responde que, na verdade, houve conclusões.

“Nós achamos que não seria necessário” uma nova comissão de inquérito, “na medida em que estão apuradas responsabilidades políticas por parte de quem indicou a gestão, o Governo PS, PSD e CDS”, disse Jerónimo de Sousa. “Em relação a outras responsabilidades, designadamente individuais, passíveis de sanções, isso não é um poder da Assembleia da República, é do Ministério Público e deveria ser concretizado” pela investigação criminal.

O Bloco de Esquerda assume posição diferente. “Haja matéria” na auditoria à Caixa e o partido de Catarina Martins lá estará para aprovar a terceira comissão. “O Bloco de Esquerda pensa o mesmo agora que pensava na altura. Foi importante tirar as conclusões da comissão de inquérito porque ela ficar suspensa ‘ad eternum’ impedia-nos de mandar aquelas conclusões para o Ministério Público e avançar a investigação”, diz sobre as comissões anteriores. E, depois, focou-se no documento que a EY entregou ao Banco de Portugal. “Cheguem esses novos dados e haja matéria, deve haver nova comissão de inquérito”, defendeu Catarina Martins.