“Houve um excesso” e “as coisas descontrolaram-se”. As declarações fazem parte do primeiro interrogatório judicial do arguido Pedro Inverno, um dos três seguranças envolvidos no caso das agressões na discoteca Urban. O julgamento do caso, que aconteceu em novembro de 2017 quando os três seguranças foram filmados a agredir violentamente dois jovens à porta do estabelecimento, prosseguiu esta terça-feira, no Tribunal Central Criminal de Lisboa, exatamente com a audição desse interrogatório.

Pedro Inverno descreveu as agressões e admitiu que desferiu várias “chapadas” na cara de uma das vítimas. O arguido negou que tivesse usado alguma arma branca e justificou o corte que Magnunson Brandão apresentava na perna com vidros partidos de garrafas que pudessem estar no chão, em frente à discoteca. “Ele estava aparentemente alcoolizado. Sem dúvida que houve um excesso”, disse ainda.

As alegações finais do julgamento foram entretanto adiadas devido a um problema no som do computador que fez com que este interrogatório não pudesse ser ouvido em qualidade. O procurador chegou mesmo a disponibilizar-se a trazer as suas próprias colunas na próxima sessão. Mas não foi preciso: alguns minutos mais tarde, um funcionário do tribunal trouxe colunas à sala de audiências. Ainda assim, os problemas impediram que o interrogatório fosse ouvido na totalidade, o que levou a juíza Catarina Pires a agendar duas novas sessões: 21 e 28 de maio.

“Estado de raiva, sono e eventual exaustão.” Seguranças do Urban começam a ser julgados

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Em maio do ano passado, Pedro Inverno, João Ramalhete e David Jardim foram acusados de homicídio qualificado na forma tentada, depois de terem agredido Magnunson Brandão e André Reis no exterior da discoteca. Foi o primeiro caso de agressões à porta do Urban Beach — entre centenas de agressões reveladas e denunciadas — a chegar à justiça. O MP entendeu que os seguranças “agiram de forma livre, deliberada e conscientemente” e sabiam que nas zonas do corpo que atingiram com as agressões “se encontravam órgãos vitais e que os ferimentos daí resultantes poderiam determinar a morte do mesmo”.

[Recorde o vídeo que mostra as agressões à porta do Urban Beach, na madrugada de 1 de novembro de 2017]

Os três seguranças requereram a abertura de instrução, mas, em novembro do ano passado, o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa decidiu levar a julgamento os arguidos “nos exatos termos” do MP. Para começar, considerou como prova válida o vídeo que captou as agressões — algo que a defesa tinha pedido para ser considerada uma “gravação ilícita”. Entendeu ainda que “não existem indícios” de que Magnuson e André “estivessem a praticar um furto ou sequer estivessem a provocar desacatos que lesassem o direito à integridade física de terceiros”, segundo o despacho de pronúncia a que o Observador teve acesso.

Considerando que os seguranças se encontravam em “estado de raiva, carência de sono e até eventual exaustão psicológica, que os animou à extrema violência que se visiona”, o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, entendeu, porém, que “todos os factos” descritos pelo MP se “encontram suficientemente indiciados e que os mesmos integram a prática do crime de homicídio qualificado na forma tentada”.

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