Uma equipa de investigadores da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) criou um programa informático que “reconhece automaticamente a diferença entre músicas alegres e tristes, tensas e melancólicas”, foi esta segunda-feira anunciado.
O programa agora inventado “pode vir a ser aplicado em diversas indústrias”, desde “entretenimento e videojogos, a marketing e publicidade ou mesmo na área da saúde”, afirma a FCTUC, numa nota enviada esta segunda-feira à agência Lusa.
“Genericamente, estamos perante um sistema informático bimodal inovador que junta informação textual e acústica, obtida através de tecnologias de inteligência artificial, ‘machine learning’, processamento de sinal áudio e processamento de linguagem natural, para classificar as músicas com base no seu conteúdo emocional, ou seja, detetar e entender as emoções contidas na música”, explicita a Faculdade.
O sistema bimodal foi desenvolvido no âmbito de um projeto financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), do qual resultaram as teses de doutoramento de Renato Panda e Ricardo Malheiro, sob orientação de Rui Pedro Paiva.
Tendo em conta que “identificar a emoção é um processo extremamente complexo e subjetivo, os investigadores tiveram de superar vários desafios até chegarem a um protótipo fiável”, que permitisse juntar num único sistema informático duas abordagens distintas: a análise do som e a análise da letra”, refere a FCTUC.
Renato Panda focou-se no reconhecimento de emoções musicais com base em sinais de áudio, com “recurso a técnicas de análise da onda sonora”, e criou designadamente “descritores acústicos explorando oito dimensões musicais: melodia, harmonia, ritmo, dinâmica, tom, expressividade, textura e forma musical”.
Para “testar e validar a eficácia desta abordagem no reconhecimento de emoções, foi construída uma base de dados pública (disponível em mir.dei.uc.pt, que pode e deve ser usada por outros investigadores da área) contendo 900 músicas”, explica a FCTUC.
“Os algoritmos inteligentes desenvolvidos mapearam as músicas e classificaram as emoções presentes em cada uma delas”, acrescenta.
Ricardo Malheiro explorou, por seu lado, a informação textual das letras das canções.
Com recurso a “técnicas de processamento de linguagem natural”, o especialista criou “atributos estilísticos e semânticos”, entre outros, “com relevância emocional que possibilitassem o estudo da relação entre as letras e as emoções”, encontrando “combinações de palavras que correspondem a uma música triste, romântica ou alegre”.
Ambos os estudos, esclarece a FCTUC, foram “desenvolvidos a partir do modelo circumplexo da emoção de Russell, um modelo psicológico que assenta em dois eixos: horizontal (valência) e vertical (ativação) – a valência relaciona-se com o tipo de emoção, positiva ou negativa, e a ativação com a energia” presente na música.
“Se pensarmos que a música tem um impacto socioeconómico muito relevante, este tipo de sistemas é muito vantajoso, já que permite pesquisas automáticas avançadas adequadas às exigências dos utilizadores”, sustenta, citado pela FCTUC, Rui Pedro Paiva.
Serviços como o Spotify (serviço de streaming de música, podcast e vídeo) ou Pandora (serviço de rádio streaming) “terão muito a ganhar com sistemas de reconhecimento automático de emoções na música, permitindo gerar rapidamente ‘playlists’ adequadas a cada contexto emocional desejado, por exemplo, uma festa ou prática de exercício físico”, especifica o especialista em reconhecimento de emoções musicais da FCTUC.
Mas não só – frisa – “este sistema poderá ser aplicado no cinema ou na publicidade, tornando muito mais fácil a elaboração de uma banda sonora adequada ao tema de um filme ou a procura de músicas específicas para captar os clientes desejados”.
Outra aplicação possível é na área da saúde, sublinha a FCTUC, pois a música tem o potencial de induzir emoções em quem a ouve (o sistema poderá ser aplicado, por exemplo, na musicoterapia).
A classificação de emoções em música através do computador é uma área de investigação muito recente, com várias possibilidades em aberto e espaço para melhorias.
Nesse sentido, Rui Pedro Paiva esclarece que o sistema desenvolvido “ainda carece de melhorias, nomeadamente ao nível de precisão, para que possa entrar no mercado real”.
“Queremos realizar mais testes e explorar outras possibilidades”, designadamente “avaliar a variação das emoções ao longo de uma música”, concluiu