A Firerisk era uma aplicação que foi criada em 2015, em Castelo Branco, por quatro portugueses. Em 2016, foi uma das apps escolhidas pelo concurso startup Simplex, da agência para a Modernização Administrativa, por ser uma “proposta de valor ligada à área do risco, ambiente, sustentabilidade e participação do cidadão“. Em 2018, o município albicastrense foi o primeiro a contratar o serviço. A aposta da Câmara “na prevenção [de incêndios] e alerta às populações, através do uso das novas tecnologias” e o cumprimento “dos objetivos estratégicos no âmbito do planeamento da defesa da floresta e proteção civil” foi notícia. Mas o projeto acabou em 2019.
[a+Apresentação do projeto no Startup Simplex em 2016]
Ao Observador, na sequência dos incêndios que deflagram noutros concelhos do distrito, a fundadora Teresa Fonseca diz: “Não podemos continuar a utilizar as mesmas estratégias e as mesmas ferramentas porque vemos que, ano após ano, as coisas falham“.
Quando lançámos a aplicação e fomos validados no startup Simplex, tivemos contactos com a GNR e, na altura, propusemos a solução de integrar a rede viária e de, antecipadamente, o cidadão poder ser alertado, por exemplo, para não seguir por uma determinada via. Isto antes dos incêndios de Pedrógão, atenção. Nós não fomos reativos na nossa proposta. Já tínhamos pensado nela antes de esta tragédia acontecer. Portanto, o que é que posso dizer? É tudo uma questão de decisão institucional e de saber usar devidamente essa ferramenta. Ela não pode ser só adquirida e dizer que têm. Não. É preciso fazer um trabalho sério de sensibilização e que as pessoas reconheçam que aquela aplicação lhes é útil”, diz Teresa Fonseca.
Foi em março deste ano que o projeto criado por Teresa Fonseca, Paulo Marques, Rogério Dionísio e Hélio Silva encerrou definitivamente, como foi divulgado pela empresa na página oficial de Facebook. Como explica Teresa Fonseca, atualmente professora no agrupamento de escolas José Sanches e especialista na área de planeamento de emergência, o objetivo da app era envolver entidades públicas e cidadãos para, com o serviço, referenciar-se zonas de riscos de incêndios e rapidamente a informação de alertas poder chegar a quem tinha a aplicação instalada. Em todo o país, houve mais de 10 mil downloads, e a Firerisk só estava disponível para o sistema operativo móvel Android.
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Contudo, mesmo com uma missão de serviço público, surgiram problemas para a empresa que nasceu em dezembro de 2015, no Centro de Empresas Inovadoras de Castelo Branco. “Os nossos clientes eram sobretudo as entidades públicas, nomeadamente as que tinham responsabilidades de proteção civil“, conta a antiga sócia da startup. O primeiro objetivo “foi tentar vender ou criar uma parceria com a autoridade nacional de proteção civil”, que seria “um parceiro privilegiado”. Com o reconhecimento do programa Simplex e tendo sido uma das startups escolhidas do programa europeu Finodex, o futuro parecia promissor, mas “apenas um município aderiu à aplicação”: Castelo Branco.
Fomos desenvolvendo algumas ideias de negócio paralelas. O caminho foi fazendo-se assim. Ganhámos alguns prémios de reconhecimento. Mas, na verdade, a sustentabilidade do projeto não se conseguiu realizar”
A empresa tentou fazer o pitch a mais municípios e entidades, mas não foi bem sucedida. Ao que o Observador apurou, alguns municípios criticaram o funcionamento da plataforma, motivo pelo qual não contrataram o serviço da Firerisk. Mesmo assim, em 2018, a autarquia de Castelo Branco contratou o serviço da startup. Com esta parceria, o concelho teve “a integração da cartografia de risco e a disponibilização de um back office [plataforma interna de controlo de serviço digital] que permitia ao município emitir alertas municipais”.
Do município [de Castelo Branco], o apoio que tivemos foi estarmos incubados no centro de empresas inovadoras e a contratualização de um serviço que prestámos, como podíamos ter prestado a qual município”, afirmou.
Com esta parceria, a câmara podia configurar mensagens como: “Atenção: a estrada x está fechada. Atenção, pedimos aos munícipes ou cidadãos que estão na freguesia x que há um incêndio a decorrer e é preciso tomar x medidas”, explica Teresa Fonseca. Ao todo, foram gastos pela autarquia “cerca de cinco mil euros”, conta a fundadora. Além disso, seriam também imputados às entidades que quisessem utilizar a Firerisk custos variáveis para a manutenção da plataforma. Contudo, com apenas uma entidade parceira, o projeto não pôde continuar.
Acho importante fazer-se este tipo de reflexões e ver o potencial inovador que Portugal tem, mas de facto, as instituições e as empresas têm de ter coragem para arriscar. Tem de haver essa coragem de dar o salto. Não podemos continuar a utilizar as mesmas estratégias e as mesmas ferramentas porque vemos que, ano após ano, as coisas falham. As pessoas continuam a ficar feridas, a ficar isoladas em locais e, se ficam isoladas, é porque não são avisadas antecipadamente. As instituições têm de mudar o paradigma e perceber que a tecnologia hoje está ao serviço delas”, acrescentou.
Quanto a vantagens para mitigar os efeitos dos fogos que deflagram noutros municípios do distrito de Castelo Branco, Teresa Fonseca é perentória na resposta: “Claro que sim [que podia ser uma mais valia]. Com esta aplicação, a partir do momento que o município fosse aderente poderia ter sido emitido um alerta”. No entanto, não deixa de referir as limitações: “Nem toda a gente tem um telemóvel e nem todas as pessoas têm rede. Infelizmente, com os incêndios dos últimos anos, sabemos que muitas áreas do país estão com fragilidades até de rede de telemóvel, quanto mais de rede de Internet”.
https://observador.pt/2019/07/20/tres-incendios-em-castelo-branco-mobilizam-mais-de-370-operacionais-e-12-meios-aereos/
“A app surgiu demasiado cedo e houve resistência em implementá-la”
À semelhança de outros projetos, como o fogos.pt, um serviço gratuito criado pelo programador João Pina (Tomahock), a Firerisk disponibilizava informação em tempo real de situações de incêndios. Para Teresa Fonseca, a app “surgiu demasiado cedo” e sentiu “que algumas entidades tinham sobretudo alguma resistência em implementá-la”. A professora diz também: “Enquanto estivemos a gerir o risco e a emergência muito fechados naquilo que são as responsabilidade estatais e o cidadão não for devidamente envolvido, ferramentas como é o Firerisk ou outras que possam surgir nunca vão ter o sucesso devido”.
A Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC), através daquilo que foi o nosso reconhecimento do concurso startup simplex, disponibilizou-nos — como disponibilizou à aplicação fogos.pt –, acesso aos dados deles e estávamos constantemente a beber informação do site ANPC. Depois, não me vou pronunciar. A ANPC terá a sua visão sobre como chegar ao cidadão e que ferramentas utilizar”, adiantou.
Ao Observador, João Pina afirma que a “Proteção Civil está focada em ferramentas de combate aos incêndios”, mas diz que entidade “está a mudar o paradigma e a fazer para mudar isso dentro das suas possibilidades”. O responsável deste outro projeto afirma que o importante é utilizar a tecnologia atual para a informação “chegar em tempo real aos cidadãos”. Mas, para isso, é preciso um trabalho prévio de sensibilização.
Mais de 400 mil utilizadores seguiram incêndios no site que João criou para ajudar os amigos