O melhor resumo dos debates onde André Silva tem participado foi feito pelo próprio: “Matérias como o ambiente e o combate às alterações climáticas só se abordam quando está presente o PAN”. São, aliás, quase sempre o único tema dos frente-a-frente com outros líderes políticos. E se isso inclina o campo para o lado de André Silva, o debate desta noite com António Costa foi, na maior parte do tempo, um jogo amigável. O secretário-geral do PS também fez um bom resumo: “Relativamente aos objetivos não há divisão entre nós. Haverá divergência quanto ao ritmo”.
Quem diz ritmo, diz datas. André Silva quer um governo que se comprometa de forma “mais exigente” com a meta da neutralização carbónica até 2030, considerada o ponto de não retorno. Costa diz que o governo tem “metas muito ambiciosas” tendo em vista 2030, mas aponta para 2050 porque prefere “compatibilizar bons resultados na descarbonização com a transição económica”. E não considera “realista” que em 11 anos “as famílias e as empresas possam reverter totalmente o seu modo de vida e o seu modo de consumo energético”.
André Silva insiste, acusa o PS de hipotecar “as gerações futuras porque coloca a primazia do crescimento económico relativamente à conservação dos habitat e dos ecossistemas” e garante que “é perfeitamente possível do ponto de vista económico e de resiliência da rede” fechar centrais a carvão até 2023.
Na resposta, o líder socialista puxa dos galões de primeiro-ministro e lembra que “Portugal foi em 2016 o primeiro país a nível mundial, a assumir o objetivo da neutralidade carbónica em 2050. Só a Finlândia e a Suécia têm metas mais ambiciosas”. Se der para ser mais cedo, será. Mas Costa prefere “um compromisso razoável”.
Sobre a declaração de emergência climática que PAN e BE propuseram e que o PS chumbou no Parlamento, Costa relativiza chamando-lhe uma “declaração proclamatória” e diz que o seu governo tem “assumido e executado” a emergência com medidas como a passagem dos transportes urbanos ou a energia para o ministério do Ambiente.
Sem nunca mostrar com o secretário-geral do PS a agressividade com que brindou Rui Rio no anterior debate, André Silva foi contestando a ação governativa, dizendo que Portugal está muito atrasado nas metas de reciclagem, ou lembrando que o PS nunca esteve ao lado do PAN na taxa de resíduos, ou traçando diferenças na forma como os dois partidos veem a economia.
O líder do PAN fala de uma “visão completamente distinta” em que a grande diferença é “este modelo económico de faz primeiro, remedeia depois”. E dá exemplos no turismo ou no olival intensivo. “O PS está a transformar o Alentejo num olival intensivo com um gasto de água absolutamente excessivo que não é admissível num contexto de alterações climáticas”, atirou.
Costa voltava a relativizar: “A região do Alentejo tem 3 milhões de hectares. A área de olival são 170 mil hectares. A parte relativa ao olival intensivo representa 1,5% “. E defendeu uma “visão equilibrada”: “Não podemos ter um regime económico de predador, mas também não podemos deixar de ter um regime económico que gere riqueza e autossuficiência para o país”.
André Silva contra-atacou: “O PS não está a aproveitar, está a depredar os recursos e a pôr em causa a nossa sustentabilidade”. Mas Costa não queria alimentar o “drama” com o PAN por causa de “1,5% da área do Alentejo”. Até porque entre os dois partidos há muita “convergência”: “Temos convergências em matérias de prioridades de transporte, em bem estar animal”, exemplificou.
O líder do PAN riu-se, mas na verdade foi o primeiro a sublinhar a aproximação de posições do PS nos últimos quatro anos em questões ambientais. “Isso deve-se, acima de tudo, à oposição competente, pequenina, de um deputado apenas”, disse. E por isso pediu “mais força” ao PAN para condicionar o próximo governo: “O futuro governo será tanto mais competente se a oposição for também competente”, em matérias ambientais.
Até porque de outras matérias muito pouco se falou. E quando se falou, da gestão orçamental à Europa, foi para mostrar que, mais depressa ou mais devagar, mais agressivo ou mais conservador, os dois poderão conversar sem “dramas”, se for preciso, depois das eleições.