A transportadora aérea portuguesa TAP planeia aderir ao regime de “lay-off simplificado” do Governo — uma hipótese que permitiria à empresa reduzir custos num contexto de grande paralisação do setor da aviação, devido à pandemia do novo coronavírus, evitando também o despedimento de trabalhadores.
A administração da empresa esteve reunida esta segunda-feira com sindicatos de trabalhadores. A intenção de aderir ao novo regime de lay-off foi sinalizada na reunião. À Rádio Observador, Nuno Silva, dirigente do Sindicato Nacional Dos Trabalhadores Da Aviação Civil (SINTAC), confirmou a notícia: “A reunião foi só para transmitir aos sindicatos que estão presentes na TAP que a empresa irá pedir o lay-off para os próximos três meses — abril, maio e junho“. O dirigente sindical diz que o pedido de adesão vai abranger pessoal das “tripulações, cabine, tudo…” e que serão afetados mais de três mil trabalhadores.
Antes da confirmação da intenção pelo SINTAC, fonte da TAP explicava que o pedido de adesão ao lay-off só seria oficializado, materializado e anunciado depois de comunicação aos funcionários. “Ainda nenhum trabalhador foi oficialmente informado” e até lá a empresa não confirmava a intenção de adesão, referia fonte da TAP, escusando-se a avançar um número de trabalhadores abrangidos. O pedido ainda não seguiu para a Segurança Social.
A SIC tinha avançado esta noite que a TAP “vai pedir a adesão ao regime de lay-off” e que “serão abrangidas todas as categorias profissionais, o que inclui pilotos e pessoal de bordo”. Ao todo, a TAP tem mais de 10 mil trabalhadores.
Transportadora está limitada a cinco voos semanais
Esta semana estão a ser realizados os últimos voos de longo curso da transportadora aérea, para o Brasil e para os Estados Unidos da América. Além da notória diminuição da atividade da empresa devido à quebra abrupta do turismo e à restrição de circulação de pessoas entre países, há também restrições ao tráfego aéreo de Portugal Continental para as ilhas.
Este domingo, por exemplo, a Região Autónoma da Madeira anunciou limitações ao desembarque semanal de passageiros no Aeroporto do Funchal — também conhecido como Aeroporto Cristiano Ronaldo. O desembarque no aeroporto está agora limitado a 100 passageiros por semana. E já esta segunda-feira, o Público noticiou que a partir de dia 1 de abril e até 4 de maio, a TAP irá voar apenas para os Açores e para a Madeira, deixando de operar voos de e para o estrangeiro e suspendendo a ligação entre Lisboa e Porto.
A ligação entre Lisboa e Funchal passa de dois voos diários para dois voos por semana. A ligação a Ponta Delgada também é reduzida de um voo por dia para dois semanais. Para a Terceira, a TAP passará a voar apenas uma vez por semana, em vez de três. Todos os passageiros que tenham bilhetes para os voos cancelados vão poder trocar de voo o requerer a emissão de um voucher.
A TAP reduz assim as suas operações para cinco voos semanais. Neste momento, a Transportadora Aérea Portuguesa tem 90 aviões parados, o que representa cerca de 85% da frota da empresa.
Bruxelas levantou travão a ajudas
A 19 de março, o Observador noticiava que a empresa estava a estudar todas as hipóteses de redução de custos para resistir à quebra de receitas. As primeiras medidas tomadas passaram pela suspensão de contratações previstas, não renovação de contratos a prazo, paragem de investimentos planeados e pelo corte de despesas consideradas não essenciais, mas já na altura uma das hipóteses estudadas passava precisamente pela adesão ao novo regime de lay-off, que prevê a suspensão dos contratos até seis meses, com o Estado a pagar 70% dos dois terços de salários — até ao limite de 1.905 euros — que o trabalhador tem direito ao abrigo desta modalidade.
Na altura, porém, o regime de lay-off simplificado tinha outros moldes, entretanto corrigidos, que obrigavam as empresas a provar quebras de faturação de 40% durante pelo menos dois meses, para ter acesso a apoio estatal.
TAP tenta cortar todos os custos. Não renovar contratos, licenças sem vencimento, adiar pagamentos
O recurso ao lay-off permitirá aliviar a tesouraria da TAP numa altura em que quase não há entrada de receitas, ganhando tempo para uma solução mais estrutural que passará por um pacote de ajudas de Estado. Os contornos deste plano terão de ser negociados pelo Governo com a Comissão Europeia que já suspendeu o regime comunitário que impede ajudas de Estado ao setor da aviação. Entre os cenários em cima da mesa está a concessão de aval do Estado a empréstimos bancários, mas também entradas, ou reforços no caso da TAP, do capital público que atualmente está nos 50%.
Mas qualquer solução para a TAP só deverá ficar definida quando for possível ter maior clareza quanto ao futuro a médio prazo do negócio da aviação civil, o que passará por saber quantos meses é que as operações comerciais ficarão seriamente condicionadas pelas medidas de combate ao Covid -19, um pouco por todo o mundo.
Sindicato critica e prevê: “Algumas empresas vão-se aproveitar disto” e despedir à mesma
À Rádio Observador, o dirigente sindical do SINTAC, Nuno Silva deixou críticas à intenção da TAP e ao modelo de lay-off simplificado gizado pelo Estado. “Se falarmos de grandes grupos, estamos a falar de grupos que em alguns casos tiveram lucros no ano passado. Ou que têm pelo menos lucros em várias partes do grupo. O Estado ao tomar esta decisão em cima do joelho…”.
Não vai ser só a TAP, a maior parte das empresas grandes do país do ramo da aviação vão todas a correr pedir isto. E estamos a falar de empresas que tiveram milhões de lucro o ano passado e simplesmente querem poupar ao máximo. Se depois continuar este problema, vamos acabar no inevitável que é um de dois caminhos. ou injeção de capital por parte de alguém, ou já sabemos o que vai acontecer aos trabalhadores. Se as empresas tiverem de se redimensionar, cortar, cortar, cortar…”, apontou o dirigente do Sindicato Nacional Dos Trabalhadores Da Aviação Civil.
Para Nuno Silva, “estas medidas não vão resolver nada, é apenas tentarem poupar à custa dos trabalhadores”. O regime de lay-off simplicado proíbe as empresas que a ele recorram de despedir trabalhadores nos 70 dias seguintes, mas essa imposição é curta, entende o dirigente do SINTAC: “Se isto melhorar para a altura do final do verão, não tenho dúvidas que algumas empresas vão-se aproveitar disto [lay-off] e vão fazer à mesma grandes despedimentos. Isto é um remendo que não vai remendar nada. Estar a estourar já isto [lay-off], estar a abranger já empresas grandes do país que têm milhões, porque há lucros, acho que é o Estado estar a passar cheques em branco”. O sindicalista defende “medidas mais apertadas” porque a garantia de 70 dias sem despedir “é uma migalha”.
Nota – Artigo atualizado às 22h38 de 30/03/2020, com declaração de dirigente do SINTAC que confirmou a adesão da TAP ao lay-off