A Assembleia da República já votou um texto saído da Comissão de Cultura e Comunicação do Parlamento, relativo a festivais e espetáculos inicialmente previstos para este verão mas que ficarão sem efeito. A proposta foi aprovada depois de ter sido limada em sede de especialidade — após aprovação na generalidade —, com votos a favor de todos os partidos exceto CDS, PCP, PEV e IL, que se abstiveram, e detalha alguns pormenores sobre o que acontecerá com espetáculos e festivais que ficam sem efeito até 30 de setembro, devido à Covid-19.
O texto confirma que festivais e espetáculos “de natureza análoga”, que decorram ao vivo em recintos cobertos ou ao ar livre, só se poderão realizar até 30 de setembro “com lugar marcado, mediante autorização da IGAC [Inspeção-Geral das Atividades Culturais] e no respeito pela lotação especificamente definida pela Direção-Geral da Saúde”. O motivo é a proteção da saúde pública, em contexto de pandemia do novo coronavírus.
O texto aprovado esta quinta-feira em plenário dá alguns detalhes sobre as compensações a que terão direito consumidores que sejam portadores de bilhetes de eventos culturais e artísticos que não se realizem na data prevista. A proposta confirma que não há obrigação de reembolso imediato.
Vale pode ser utilizado em outro espetáculo ou festival mais caro
Os portadores de bilhetes de festivais e espetáculos “de natureza análoga” — os eventos que se encontram abrangidos podem ser consultados num decreto-lei de 2019, lia-se no texto depois de apreciação em sede de especialidade — terão direito, isso sim, “à emissão de um vale de igual valor ao preço pago” pelo seu bilhete. O vale “é emitido à ordem do portador do bilhete de ingresso e é transmissível a terceiros por mera tradição”, de acordo com a proposta, e será “válido até 31 de dezembro de 2021”.
O vale poderá ser utilizado “na aquisição de bilhetes de ingresso para o mesmo espetáculo a realizar em nova data” — que não poderá nunca ficar mais caro para quem já tinha comprado o bilhete — “ou para outros eventos realizados pelo mesmo promotor”. Se o vale não for utilizado até 31 de dezembro de 2021, “o portador tem direito ao reembolso do valor do mesmo, a solicitar no prazo de 14 dias úteis”. O modelo era defendida pelos promotores de espetáculos e festivais, que temiam uma crise profunda no setor se fossem obrigados a reembolsarem os portadores de bilhetes de espetáculos que ficaram sem efeito.
Os moldes são semelhantes àqueles que foram definidos para reservas de hotéis feitas até ao mesmo dia de 30 de setembro, mas não para as viagens de avião, que por enquanto ficam de fora da ausência de obrigatoriedade de reembolso a consumidores. O modelo de voucher, para já, não se aplica portanto aos bilhetes para viagens aéreas.
Viagens canceladas valem voucher até final de 2021. Só depois há direito a reembolso
Este texto detalha, no entanto, alguns pormenores relativos à materialização prática de utilização do vale. Por exemplo, o “voucher” com o mesmo valor do espetáculo ou festival que ficou sem efeito poderá ser utilizado em outro espetáculo ou festival do mesmo promotor, mesmo que mais caro — nesse caso, “poderá ser utilizado como princípio de pagamento de bilhetes de ingresso de valor superior“, a que se deverá somar o valor em falta. Já se for utilizado num espetáculo ou festival mais barato, “o remanescente pode ser utilizado para aquisição de bilhetes de ingresso para outros eventos do mesmo promotor”.
Espetáculos adiados têm de ter nova data até 30 de setembro
Outro dos detalhes que o texto final clarifica é o campo de possibilidades para promotores de espetáculos e festivais não organizarem os seus eventos nos moldes permitidos pelas autoridades (lugar marcado, autorização da IGAC e respeito pela lotação definida pela DGS). “Entende-se que um espetáculo não pode ser realizado sempre que estiver abrangido por uma proibição ou interdição legal ou sempre que as limitações impostas à sua realização por razões de saúde pública desvirtuem a sua natureza ou tornem economicamente inviável a realização“.
Outro dado passa pela data de reagendamento de eventos e festivais que ficarem sem efeito: os promotores têm de anunciar uma nova data até 30 de setembro, “sob pena do adiamento dever ser havido, para todos os efeitos, como cancelamento”.
Caso não seja “objetivamente possível” reagendar o espetáculo ou festival que não se pôde realizar, e quando a impossibilidade de agendamento “não possa ser imputada ao promotor”, o espetáculo “deve ser cancelado”.
Está aprovado na generalidade: festivais este verão, só se tiverem lugar marcado e lotação reduzida
Quando é o Estado a pagar, tem de garantir já 50% dos “pagamentos estipulados” antes da pandemia
A proposta estipula ainda o que deverá acontecer em espetáculos ou festivais “financiados maioritariamente por fundos públicos”, sejam de Governo ou autarquias. Nesses casos, “deve o promotor, quer nos casos de cancelamento quer nos casos de reagendamento, realizar os pagamentos nos termos contratualmente estipulados, devendo garantir que, o mais tardar, na data que se encontrava inicialmente agendado o espetáculo, é pago um montante mínimo equivalente a 50 % do preço contratual, sem prejuízo, nos casos de reagendamento, da nova calendarização do espetáculo e da realização dos demais pagamentos a que houver lugar nos termos do contrato”.
Já os espetáculos de entrada livre “financiados maioritariamente por fundos públicos” podem também ser reagendados, aqui “até ao prazo de 18 meses após a cessação da vigência das medidas legislativas de proibição ou limitação de realização de espetáculos”.
É ainda notado no texto que “o cancelamento de espetáculos decorrente de interdições e limitações de funcionamento de atividades ou recintos de espetáculos é considerado como resultando de motivo de força maior para todos os efeitos legais e contratuais em relação a contratos e negócios jurídicos celebrados, bem como a outras obrigações e compromissos assumidos que tenham por causa a realização do espetáculo cancelado”.
As partes contratualmente envolvidas deverão, de acordo com a proposta, “sempre que possível, manter os respetivos contratos, assegurando os seus objetos e objetivos, e cumprindo as suas obrigações em relação a data que vier a ser escolhida para reagendamento e, em qualquer caso, procurar alcançar a repartição equitativa de custos e riscos contratuais, evitando prejuízos ou benefícios injustificados”.
A decisão está tomada, só falta a lei: não haverá festivais este verão em Portugal
(Atualizado às 19h38 com informação relativa à aprovação da proposta na AR, em plenário)