Na semana passada, em São Bento, o primeiro-ministro António Costa recebeu os homólogos aliados nesta contenda com o norte da Europa e os seus frugais no palacete, com declarações lado a lado. Mas em Haia — casa de um frugal –, esta segunda-feira, ficou sozinho nas declarações pós-encontro. Mark Rutte recebeu-o, mas não está no mesmo trilho que o português na defesa de um fundo de recuperação europeu sem condições. Costa saiu a dizer que está na hora de haver cedências do lado de lá.

“Temos de estar disponíveis para ceder em alguma parte, as propostas em cima da mesa têm sido equilibradas mas têm defendido as posições dos quatro frugais [Áustria, Holanda, Dinamarca e Suécia]. Há um limite a partir do qual têm de ser os 23 a dizer não. Para não chegarmos a isso, os quatro frugais têm de fazer um movimento no sentido positivo”, disse Costa depois da reunião com Rutte. O primeiro-ministro holandês classificou de “agradável” o fecho do dia de reuniões preparatórias do Conselho Europeu ao lado de António Costa, mas através de uma mensagem no Twitter.

Os dois têm posições diferentes sobre as transferências para os Estados-membros ao abrigo do plano de recuperação económica da União Europeia. E saíram na mesma, com Costa a insistir que “tem de ser um plano que não pode ser nem um cheque em branco nem uma nova troika”, uma frase que repete a cada encontro sobre este mesmo tema.

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A busca, disse no fim da reunião já na rua, é por “pontos de convergência possíveis e esses pontos podem-se encontrar de diversas maneiras”. E sublinhou que o objetivo é que “ninguém fique nas mãos dos caprichos de um só país, mas também que ninguém fique livre de cumprir ou deixar de cumprir os desafios comuns”.

E a Rutte apresentou ainda o argumento da necessidade de proteger o mercado interno europeu, já que “Espanha e Itália representam 15% do valor do mercado interno. Holanda deve ser o primeiro ou segundo país que beneficia do mercado interno. Precisa que Itália e Espanha não estejam em recessão”, concluiu. “Ou saímos todos ao mesmo tempo do problema, ou ficamos no problema”, defende o primeiro-ministro português.

Para Costa é a proposta da Comissão Europeia que representa “um compromisso justo”. Embora não coloque totalmente de lado a proposta que veio recentemente do presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, que mantém o valor do Fundo de Recuperação proposto pela Comissão, prevendo que dois terços (500 mil milhões de euros) sejam canalizados para os Estados-membros a fundo perdido e o restante (250 mil milhões) na forma de empréstimos. E ainda reduz em 2% o montante global do Quadro Financeiro Plurianual da União Europeia para os próximos sete anos.

“Trata-se de uma grelha de compromisso” com a qual o primeiro-ministro diz que só concordaria se Mark Rutte concordasse com ela”, já que Portugal “só pode aceitar a redução do montante global dos quadro financeiro plurianual” se Rutte “aceitar o montante para o fundo de recuperação”.

Uma coisa é certa, Rutte e Costa não se entendem sobre este acordo e o primeiro-ministro português não saiu “com a certeza de um acordo, porque há ainda vários pontos de divergência”, no entanto, sentiu da parte do holandês “uma grande vontade de que o acordo exista, e de preferência já, neste mês de julho. E acho que o próximo Conselho seria uma oportunidade perdida se não fizéssemos já o acordo”, apontou.

Um dos pontos em que ainda diverge de Rutte é sobre o papel do Conselho Europeu que  a Holanda defende que deve ter uma palavra a dizer não só sobre a atribuição dos fundos, mas também sobre a execução. “Não creio que seja aceitável”, disse o primeiro-ministro português que considera “perigosa a excessiva politização da execução” colocando-a à mercê das “vicissitudes políticas” de cada estado-membro.

Uma negociação que ainda não tem luz verde e que precisa da unanimidade do Conselho Europeu que se reúne em Bruxelas no final desta semana para tentar chegar a um acordo. Entretanto, este terça-feira, Costa tem ainda encontro marcado com mais um líder europeu, o primeiro-ministro da Hungria Viktor Órban, sobre o mesmo assunto. Órban já condicionou o seu apoio ao plano de recuperação a eventuais condições que venham a ser colocadas ao respeito pelo Estado de Direito.