Esta era a semana em que devia arrancar a nova etapa da primeira fase da vacinação contra a Covid-19 — que abrange os idosos acima dos 80 anos e também um conjunto de decisores políticos incluindo os presidentes das câmaras municipais. Mas ainda não estão implementados os procedimentos a adotar, sobretudo no que diz respeito ao modo como será distribuída a vacina aos autarcas.

Em declarações esta terça-feira ao Observador, o coordenador da task-force criada para implementar o plano de vacinação, Francisco Ramos, disse não existir um modelo específico para a vacinação dos presidentes de câmara. Questionado sobre o modo como deverá ser organizada a imunização dos autarcas — sobretudo devido à especificidade dos responsáveis políticos em questão, um em cada concelho, e às condições de transporte e armazenamento das vacinas, com várias doses por frasco —, Francisco Ramos disse que não haverá uma abordagem particular.

Vão ter de ir com as outras pessoas, não há uma forma de vacinação específica para os presidentes de câmara“, disse Francisco Ramos, rejeitando também que esteja a ser equacionada, por exemplo, a deslocação de profissionais de saúde às instalações das autarquias para administrar a vacina.

De acordo com um conjunto de contactos feitos pelo Observador, é ainda escassa a informação nas autarquias sobre como será feito o processo de vacinação. No caso do Porto, por exemplo, o gabinete do presidente Rui Moreira remeteu qualquer questão para a Administração Regional de Saúde do Norte. Fonte da ARS do Norte disse não conseguir ainda esclarecer o modo como os autarcas serão contactados e convocados para a receber as vacinas, assumindo que ainda vai ser necessário encontrar a melhor solução.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Em Coimbra, fonte da câmara disse que a principal prioridade da autarquia tem sido a preparação da próxima fase, sobretudo dirigida aos mais idosos — e não a vacinação do próprio autarca. Na cidade está já praticamente preparado um pavilhão para vacinação das pessoas incluídas na próxima etapa de vacinação, mas o processo ainda não começou porque ainda não chegaram as vacinas.

Já a câmara de Lisboa não respondeu às perguntas do Observador até à publicação deste artigo.

Alguns autarcas, como se sabe, estão envolvidos nos casos abusivos de vacinação, tendo recebido a vacina quando ainda não estavam no grupo de prioritários.

Ainda não se sabe quantos políticos serão vacinados

Inicialmente, a primeira das três fases do plano de vacinação contra a Covid-19 em Portugal deveria incluir apenas três grandes grupos de pessoas: 1) os profissionais da chamada “linha da frente”, como profissionais de saúde e outros trabalhadores das unidades de saúde, 2) as pessoas com mais de 50 anos e um conjunto de patologias graves associadas aos casos mais complexos de Covid-19, e 3) os profissionais e residentes dos lares de idosos.

O plano de vacinação está, porém, envolvido em controvérsia desde os primeiros dias: logo ao início, devido à não inclusão dos idosos na primeira linha de prioridade, como acontece na maioria dos países; depois, devido ao lugar que nela deviam ocupar os titulares dos principais órgãos de soberanias, do Presidente da República ao primeiro-ministro, passando por vários políticos.

Após a chegada das primeiras vacinas e as críticas públicas, a task-force que coordena o plano de vacinação anunciou um conjunto de alterações à ordem das prioridades, nomeadamente a inclusão de todos os idosos acima dos 80 anos — independentemente do quadro clínico — e a vacinação prioritária de decisores políticos relevantes para o funcionamento do Estado. Para estes, foram reservadas 2 mil doses de vacinas, que serviram para vacinar mil pessoas (devido às duas doses necessárias). Porém, a inclusão de um tão grande número de decisores políticos não tem sido consensual.

Vacinação. Haverá 2 mil doses para titulares de cargos políticos e de órgãos de soberania, ministros infetados ficam de fora

Enquanto o Presidente da República continua a insistir na seleção de um grupo reduzido de decisores essenciais para o funcionamento do Estado, o recente despacho do primeiro-ministro sobre o assunto considera como prioritários 20 membros do Governo, todos os presidentes de câmara e um grande número de elementos (decididos por cada órgão) da Assembleia da República, do Conselho de Estado, das estruturas governativas das Regiões Autónomas, do Tribunal Constitucional, do Tribunal de Contas, do Ministério Público, do Conselho Superior da Magistratura, da Provedoria de Justiça e dos Tribunais Administrativos e Fiscais.

Ao longo dos últimos dias, os vários órgãos têm estado a remeter para o Governo as listas de elementos e funcionários considerados prioritários para a vacinação, mas com critérios diferentes. O Parlamento, por exemplo, enviou a lista de deputados a vacinar, mas foi alterando-a ao longo de 72 horas, com deputados a recusarem estar entre os prioritários e os partidos a reclamarem da decisão de Ferro Rodrigues ter incluído alguns nomes que não indicaram. O presidente da Assembleia manteve a lista, mas decidiu entretanto criar um grupo de trabalho para coordenar a vacinação dos deputados.

Ferro propõe grupo de trabalho para acompanhar vacinação de deputados

O Presidente Marcelo Rebelo de Sousa remeteu esta terça-feira os elementos da Presidência a incluir, apenas ele e três profissionais de saúde que trabalham na Presidência. Também o Tribunal de Contas e o Tribunal Constitucional já enviaram a lista de nomes ao Governo, feita de forma completamente diferente: o Tribunal de Contas, por exemplo, decidiu indicar para vacinação todos os seus 16 juízes e dois diretores; o Supremo Tribunal de Justiça optou por dar prioridade máxima aos funcionários.

O processo de recolha dos nomes ainda continuava esta terça-feira e, ao Observador, Francisco Ramos disse que “ainda não” sabia o número total de decisores políticos que serão vacinados nesta primeira fase.

Marcelo só se indicou a ele e a três médicos para serem vacinados