As vacinas da Pfizer/BioNTech e da Moderna parecem ser eficazes a neutralizar a variante do Reino Unido (B.1.1.7) e algumas outras variantes em circulação, mas não conseguiram demonstrar que impacto podem ter na variante da África do Sul (B.1.351). As empresas conseguiram demonstrar que houve uma redução significativa dos anticorpos capazes de neutralizar o vírus, quando em contacto com esta variante, mas não o que isso significa exatamente.

Estas duas empresas farmacêuticas desenvolveram vacinas baseadas em ARN mensageiro, a partir do vírus inicialmente sequenciado em Wuhan (na China). Mas a sequência original dos genes já sofreu várias alterações e este vírus foi praticamente substituído pela variante com a mutação D614G (até agora a mais comum em Portugal, na Europa e Estados Unidos, por exemplo). Ambas as empresas demonstraram que as vacinas são eficazes contra esta mutação, segundo as cartas enviadas ao editor da revista científica The New England Journal of Medicine (aqui e aqui).

A Moderna também testou a vacina contra outras variantes descobertas há vários meses — 20E (EU1), 20A.EU2, N439K-D614G e um grupo das cinco variantes dos visons —, e mostrou que a vacina era igualmente eficaz. A empresa revela ainda que a vacina se mostra eficaz contra a variante do Reino Unido.

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O problema surge quando se confrontam as vacinas com as novas variantes e as respetivas mutações que interferem com o local onde a proteína spike do vírus se liga às células humanas, para conseguir entrar, que é o mesmo local onde os anticorpos se tentam ligar. E isto vale tanto para a variante da África do Sul (B.1.351), como para as do Brasil (P.1 e P.2), mas também para as do Reino Unido.

Os ensaios da Pfizer/BioNTech mostram que o plasma sanguíneo (com anticorpos) dos voluntários dos ensaios clínicos tinham menos capacidade de neutralizar os vírus com as mutações E484K, N501Y e K417N (que, em diferentes combinações, aparecem nas novas variantes) e ainda menos capacidade para neutralizar os vírus que tinham proteínas spike iguais à da variante sul-africana. Menos dois terços de capacidade de neutralização da B.1.351, lê-se nos resultados. Já a Moderna diz que “a proteção contra a variante B.1.351 conferida pela vacina mRNA-1273 continua por determinar”.

Valerá a pena lembrar que a variante B.1.1.7 tem a mutação N501Y (que faz com que o vírus se ligue mais facilmente às células humanas para as invadir) e as variantes B.1.351 e P.1 que têm a mesma mutação e ainda a E484K (que permite ao vírus escapar-se aos anticorpos neutralizantes).

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O maior problema deste tipo de ensaios que avaliam a quantidade de anticorpos produzidos ou a capacidade dos anticorpos neutralizarem os vírus (e respetivas variantes) é que não se sabe qual a quantidade de anticorpos necessária para que as pessoas estejam protegidas. Assim, por comparação, parecem estar menos protegidas — pelo menos no que diz respeito aos anticorpos.

Mas as vacinas desencadeiam outro tipo de resposta imunitária: com células T. E não se sabe se esta resposta se mantém e é eficaz contra as novas variantes ou não. Todos os ensaios que têm sido feitos baseiam-se no uso do plasma de pessoas vacinadas ou que recuperaram da doença — ou seja, nos anticorpos presentes —, sem ter sido feito ainda qualquer estudo com as células T.

Assim, como refere a Pfizer/BioNTech, não se sabe que redução real existe na proteção contra a variante sul-africana. E se as empresas não conseguem provar que as vacinas são eficazes, também ainda não foi possível demonstrar com certeza que não são.

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A Pfizer/BioNTech destacou que, até agora, não há evidências de que as variantes consigam escapar à proteção que é oferecida pela vacina. “A Pfizer e a BioNTech estão a tomar as medidas necessárias, fazendo os investimentos certos e estão em conversações com os reguladores para estarem em posição de desenvolver e ter autorização para uma vacina de mARN que seja atualizada ou reforçada sempre que uma estirpe que reduz significativamente a proteção da vacina é identificada”, referiu a empresa Pfizer em comunicado.

A Moderna, por sua vez, disse, em comunicado, que a sua vacina “mantém a atividade neutralizadora” para as variantes do SARS-CoV-2. Segundo a empresa de biotecnologia, “é esperado que o regime de duas doses proteja contra as estirpes emergentes detetadas até à data”. Ainda assim, e “por precaução”, a empresa está a desenvolver uma “variante de reforço” da vacina contra a variante sul-africana e irá testar “uma dose adicional” para avaliar “a capacidade de aumentar ainda mais os neutralizadores contra estirpes emergentes”.

O artigo foi corrigido (às 14h10) porque afirmava que as vacinas eram eficazes contra a variante sul-africana quando, na verdade, ainda não foi demonstrado que assim seja.