O grupo naval Privinvest foi esta sexta-feira autorizado por um tribunal britânico a notificar o Presidente da República de Moçambique, Filipe Nyusi, no âmbito do caso das dívidas ocultas a decorrer em Londres.
Numa audiência no Tribunal Comercial, parte do Tribunal Superior de Londres [High Court], o grupo apresentou um requerimento para poder notificar Nyusi, que é referido como “quarta parte” [fourth party], e outros cinco assistentes [third parties] do processo sobre potenciais responsabilidades no processo.
Os cinco assistentes são o antigo Presidente moçambicano Armando Guebuza, o filho mais velho, Armando Ndambi Guebuza, o antigo ministro das Finanças moçambicano Manuel Chang, o antigo diretor de Inteligência Económica do SISE António Carlos do Rosário e o antigo diretor dos Serviços de Informação e Segurança do Estado (SISE) Gregório Leão.
Se Moçambique “conseguir estabelecer a ilegalidade dos pagamentos feitos, então os meus clientes têm pedidos de contribuições a fazer aos assistentes e à quarta parte tendo em conta que, se somos responsáveis em relação a esses pagamentos, também os destinatários são responsáveis por esses pagamentos“, justificou o advogado que representa a Privinvest, Duncan Matthews.
A Procuradoria-Geral de Moçambique iniciou este caso na justiça britânica em 2019 para tentar anular a dívida de 622 milhões de dólares da empresa estatal ProIndicus ao Credit Suisse e pedir uma indemnização que cubra todas as perdas resultantes do escândalo das dívidas ocultas.
Em causa estão as dívidas ocultas do Estado moçambicano de cerca de 2 mil milhões de dólares (1,8 mil milhões de euros) contraídas entre 2013 e 2014 em forma de crédito junto das filiais britânicas dos bancos de investimentos Credit Suisse e VTB em nome das empresas estatais moçambicanas Proindicus, Ematum e MAM.
O financiamento destinava-se à aquisição de barcos de pesca do atum e para equipamento e serviços de segurança marítima fornecidos pelas empresas da Privinvest.
Moçambique alega que Manuel Chang não tinha autoridade para assinar as garantias soberanas e que estas são inconstitucionais e ilegais porque o parlamento de Moçambique não aprovou os empréstimos.
A Privinvest, que nega qualquer irregularidade, pode ser condenada a pagar indemnizações se ficar provado que faz pagamentos corruptos a funcionários do Estado moçambicano.
Houve uma série de diferentes tipos de acordos e pagamentos, os quais, tanto é do conhecimento dos meus clientes, eram acordos e pagamentos legítimos. Entre aqueles a quem ou por conta de quem foram feitos pagamentos está o Presidente da República, o Presidente Nyusi, que era o ministro da Defesa”, vincou Matthews.
Filipe Nyusi e os outros dirigentes e antigos funcionários do Estado moçambicano já são alvo de notificações do Credit Suisse, que também quer que aqueles sejam responsabilizados no caso de perder o processo judicial.
A questão da imunidade do Chefe de Estado foi discutida esta sexta-feira em profundidade, mas por fim a juíza Sara Cockerill considerou que não devia ser obstáculo ao requerimento.
No entanto, não autorizou a notificação por meios alternativos, como correio eletrónico, pelo que terá de ser feita diretamente para o Palácio da Ponta Vermelha ou através dos tribunais moçambicanos, o que poderá atrasar ainda mais o processo.
Segundo Matthews, os advogados da Procuradoria-Geral da República não confirmaram se Filipe Nyusi foi informado destes desenvolvimentos, nem se opuseram ou aprovaram o requerimento.
É uma curiosidade deste processo que o Estado pareça estar disposto a lançar às feras todos os outros participantes no processo, exceto o agora Presidente”, ironizou.