No primeiro dia de modalidade “Casa Aberta” para renovar cartão de cidadão e passaporte, o ambiente era de descontentamento junto à Loja do Cidadão das Laranjeiras. O primeiro utente chegou às 03h00, às 11h00 já não havia senhas. A secretária de estado diz a afluência era expectável dado o número de utentes que precisavam de pedir ou renovar o cartão de cidadão.

A chamada modalidade “Casa Aberta”, que consiste em manter durante os próximos oito sábados algumas Lojas do Cidadão abertas com um horário alargado, entre as 09h00 e as 22h00, para a entrega e renovação do cartão de cidadão ou do passaporte, arrancou este sábado.

A medida visa ajudar a regularizar os casos em atraso até ao final do mês e recuperar algum do tempo perdido quando as Lojas do Cidadão encerraram devido à pandemia da Covid-19, explicou na sexta-feira à Lusa a ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública, Alexandra Leitão.

Este sábado de manhã, por volta das 11h00, o sentimento geral junto à Loja do Cidadão das Laranjeiras, em Lisboa, era de descontentamento, com as pessoas que chegavam por volta daquela hora a depararem-se com a impossibilidade de tratar dos documentos, por já não haver senhas.

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“Face à capacidade realisticamente instalada, que é a capacidade máxima de atendimento em cada loja, é normal que as senhas deixem de estar disponíveis”, reagiu, por seu turno, à SIC a secretária de estado da Inovação, Maria de Fátima Fonseca.

Seguranças e polícias iam-se alternando à porta, e a informação prestada às pessoas também alternava entre “as senhas estão interrompidas, sem previsão quando ou se retomam” e “já não há senhas”, duas repostas diferentes, que induziam comportamentos diferentes nos utentes: os primeiros, na maioria dos casos, optavam por esperar, os segundos, iam-se embora.

Foi o caso de Alexandra Mendonça, que veio de Carnaxide para tratar do cartão de cidadão e às 11h30 foi recebida com a informação de que tinham sido emitidas mais de 800 senhas, mas que “já não havia”.

“Vi que estava aberto até às 22h00, e ao meio-dia já não há”, indignou-se, afirmando à Lusa que veio de Carnaxide, perdeu tempo e gastou combustível, para nada.

“Não acho isto normal, nós estamos a tentar cumprir e o Estado não corresponde, não tem capacidade de resposta”, disse, deixando ainda um recado à ministra: “a dra. Alexandra Leitão tem que perceber que não podemos andar nisto, se o cidadão tenta mas não consegue, não exijam de nós”.

Reação semelhante teve uma outra cidadã, empregada doméstica, que preferiu não se identificar, quando chegou às 11:47 e percebeu que já não tinha senha.

“O segurança disse-me que isto estava aberto até às 22:30. Às 11:00 já não há senhas? Isto é uma brincadeira. Se tivesse vindo tarde, às 15h00 ou às 16h00… Mas ainda nem é hora de almoço”, lamentou, acrescentando que tinha tentado fazer marcação por telefone, mas não conseguiu.

Ao meio-dia, foram disponibilizadas novamente algumas senhas para o cartão de cidadão, mas esta informação não foi divulgada entre quem esperava, e quem nunca soube dessa possibilidade, já há muito tinha ido embora. Só casualmente, quem por aquela altura perguntasse se havia senha, tinha sorte em recebê-la.

Ainda assim, às 12h10 as senhas iam no número 144, enquanto o atendimento estava ainda na senha 31.

Com os passaportes a situação não era muito diferente, com os serviços a darem vazão apenas às entrega dos documentos já prontos.

Maria Ribeiro, médica, foi para a porta da Loja do Cidadão às 06:00, para tratar do passaporte, e a essa hora já tinha 23 pessoas à frente, a primeira das quais tinha chegado às 03:00, contou à Lusa.

Às 11h00 já não havia senhas para pedir ou renovar passaportes.

Quando as portas abriram, foi-lhe entregue uma senha impressa às 08:20, com o número 16, mas três horas depois ainda não tinha sido atendida, e o contador ia na senha 14.

Maria Ribeiro queixou-se ainda de falta de organização e de respeito por parte dos serviços.

“Deram-me a senha e disseram-me que podia tratar do pedido de passaporte nos dois andares, fui para o andar de cima, mas quando lá cheguei ainda estavam a reunir a equipa. Disseram depois que afinal não podia tratar em cima, que era só para entregas, e que os pedidos eram em baixo”.

A forma como as pessoas são tratadas também mereceu criticas por parte desta utente, que considera inadmissível que as senhas acabem e não avisem quem está na fila de que já não há mais senhas.

“As pessoas ficam imenso tempo na bicha, à espera da sua vez e só quando chegam à porta é que lhes dizem que já não há senhas, quando as senhas já tinham acabado muito tempo antes”, disse, acrescentando que “uma senhora que chegou às 07:00, quando tentou já não conseguiu”.

Maria Aurora Teixeira, emigrante nos Estados Unidos há 20 anos, recorreu à modalidade “Casa Aberta” também para atualizar o passaporte português.

Chegou à Loja do Cidadão por volta das 09:15 e já recebeu a senha 151, mas conta que só a conseguiu porque entrou “por sua iniciativa”.

“Quando cheguei, disseram-me logo que já não havia senhas. Mesmo assim, entrei por minha iniciativa e ainda consegui uma. O segurança que a tinha disse que era a última”, contou

“Vou estar aqui o dia todo. Não está correto”, lamentou Maria Aurora Teixeira, contando que perguntou a um funcionário se iria ficar à espera até às 22:00 e que lhe responderam “com arrogância”: “Provavelmente”.

Na opinião desta utente, o problema é não terem pessoal suficiente a trabalhar.

“Há balcões sem ninguém. Num dia como o de hoje, que abriu especialmente para despachar estes casos, deveria haver mais pessoas a trabalhar”.

Para Maria Aurora Teixeira, a forma como as pessoas são tratadas também não é aceitável: “não dão uma informação, viram as costas. Não é assim que se atende as pessoas”.

A modalidade “Casa Aberta” vai estar disponível em quatro lojas na área de Lisboa — Laranjeiras, Saldanha, Marvila e Odivelas –, duas na área do Porto — Porto e Vila Nova de Gaia –, e em Coimbra, Braga e Faro, além dos balcões de atendimento ao público do Instituto de Registos e Notariado (IRN), no Campus da Justiça de Lisboa.