A proposta do Governo sobre a utilização de sistemas de videovigilância pelas forças e serviços de segurança, que vai permitir aos polícias usarem câmaras nos uniformes, as chamadas bodycams, vai ser discutida na quarta-feira no parlamento. Esta mesma proposta refere também que passa a ser permitido às polícias captarem, acederem e tratarem dados biométricos dos cidadãos recolhidos por esses mesmos novos meios de vigilância, avança o jornal Público, que aponta que o Comité Europeu para a Proteção de Dados (CEPD) e a Autoridade Europeia de Proteção de Dados (AEPD) recusam essa mesma utilização.

Num parecer sobre o uso de inteligência artificial, o CEPD e a AEPD exigem “a proibição geral de qualquer utilização de IA para reconhecimento automatizado de características humanas em espaços acessíveis ao público — como de rostos mas também da maneira de andar, impressões digitais, ADN, voz, timbre e outros sinais biométricos ou comportamentais — em qualquer contexto”, cita o Público. As entidades consideram de “alto risco” o recurso a sistemas de reconhecimento facial, possíveis através, neste caso, da videovigilância que é capaz de recolher dados biométricos. O Comité Europeu para a Proteção de Dados como a Autoridade Europeia de Proteção de Dados defende também a proibição do uso de inteligência artificial — precisamente sob a forma de recolha de dados biométricos — que categorizem as pessoas por género, orientação política ou sexual ou por etnia.

Existem apenas algumas exceções, e uma delas é a existência de uma ameaça “substancial e iminente” de algum tipo de ato terrorista. Os dados biométricos recolhidos em espaços públicos ou de acesso público, cuja captação e armazenamento pode ser feito durante 30 dias, só podem ser tratados no âmbito de “prevenção de atos terroristas” e “mediante autorização de entidade judicial”. Segundo o artigo do diploma do Governo sobre esta mesma recolha e tratamento de dados prevê-se que “a visualização e o tratamento dos dados podem ter subjacente um sistema de gestão analítica dos dados captados, por aplicação de critérios técnicos de acordo com os fins a que os sistemas se destinam”, cita o jornal Público.

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A discussão da proposta deverá ter alguns entraves da Comissão Nacional de Proteção de Dados já que esta defende a proibição “por princípio” da recurso a esses dados por parte das entidades policiais envolvidas.

O que vai ser discutido no Parlamento

Além da proposta de lei do executivo socialista, a Assembleia da República vai também discutir o projeto de resolução do CDS-PP sobre a aquisição de câmaras de fardamento (bodycams), para veículos de serviço e para videovigilância em esquadras e postos.

A proposta que regula a utilização de sistemas de vigilância por câmaras de vídeo pelas forças e serviços de segurança prevê o alargamento do uso destas tecnologias pelas polícias, passando a ser permitidas as bodycams pelos elementos da PSP e da GNR, drones e várias câmaras de vídeo no apoio à atividade policial e no controlo de tráfego na circulação rodoviária, marítima e fluvial, circulação de pessoas nas fronteiras e em operações de busca e salvamento.

“Importa acomodar a utilização das câmaras incorporadas em sistemas de aeronaves não tripuladas, bem como em outros tipos de veículos, navios e embarcações, pelas forças e serviços de segurança, na sua atividade diária, e prever a utilização de câmaras de videovigilância portáteis de uso individual para registo de intervenções policiais, enquadrando legalmente a utilização deste mecanismo, que assume grande importância na segurança das intervenções policiais no terreno, bem como na salvaguarda dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos”, lê-se na proposta.

As bodycams, pequenas câmaras de vídeo incorporadas nos uniformes dos agentes da PSP, têm sido um dos instrumentos reivindicados pela polícia e alvo de debate, nomeadamente na sequência de alguns casos mediáticos em que imagens de operações policiais são divulgadas através de telemóveis. Por isso, esta proposta que contempla a possibilidade de os elementos da PSP e da GNR utilizarem câmaras de videovigilância portáteis em intervenções policiais tem sido bem acolhida pelos polícias.

Segundo o documento do Governo, a utilização das bodycams “para efeitos de registo de intervenção individual de agente das forças de segurança em ação policial, depende de autorização do respetivo dirigente máximo, sendo informado o membro do Governo que tutela a força de segurança”.

A proposta indica que as bodycams devem ser colocadas de “forma visível no uniforme ou equipamento”, sendo dotadas de sinalética que indique o seu fim”, e a captação e gravação de imagens e som podem apenas “ocorrer em caso de intervenção de elemento das forças de segurança, nomeadamente quando esteja em causa a ocorrência de ilícito criminal, situação de perigo, emergência ou alteração de ordem pública, devendo o início da gravação ser precedido de aviso claramente percetível, sempre que a natureza do serviço e as circunstâncias o permitam”.

As características e normas de utilização das bodycams, bem como a forma de transmissão, armazenamento e acesso aos dados recolhidos, vão ser ainda objeto de portaria a aprovar pelo ministro da Administração Interna.

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A proposta do Governo clarifica ainda os regimes especiais e densificam-se os procedimentos relativos à utilização, por parte da forças e serviços de segurança, de sistemas de videovigilância criados pelos municípios, bem como o acesso aos sistemas privados de videovigilância, instalados em locais públicos ou privados de acesso ao público, além de regular a possibilidade das polícias captarem imagens, “mediante recurso a câmaras fixas ou portáteis, exclusivamente para efeitos de visualização, sem que haja gravação”.

A proposta vai revogar a lei da videovigilância de 2005 e que foi alterada em 2012, justificando o Governo as atuais alterações com “os avanços tecnológicos, que motivaram alterações significativas no que diz respeito às características técnicas dos sistemas que o mercado oferece em cada momento”.

O Governo refere ainda que não foi pedido parecer à Comissão Nacional de Proteção de Dados, devendo esta entidade ser ouvida pela Assembleia da República em sede do processo legislativo. Por sua vez, na proposta de resolução, o CDS-PP considera que o Governo deve aproveitar a oportunidade de revisão da Lei de Programação de Infraestruturas e Equipamento das Forças e Serviços de Segurança para fornecer aos polícias os meios para se “defenderem de acusações, muitas vezes infundadas, de violência policial e, assim, permitir a descoberta da verdade em caso de procedimento criminal e disciplinar contra os mesmos”.

Notícia atualizada a 6 de outubro às 8h20 com informações sobre recolha de dados biométricos.