Com animais esfomeados e doentes, as voluntárias de dois abrigos em Kherson — a primeira das grandes cidades ucranianas a cair nas mãos dos russos — tentam encontrar comida e levá-la para os canis. “Os nossos meninos estão a perder muito peso“, dizem as mulheres, que vivem agora isolados com os companheiros de quatro patas.

A julgar pelo som dos bombardeamentos e da troca de tiros, os combates estão próximos referem as voluntárias em declarações ao El Confidencial. Uma delas, Angelina Rybchenko, nem se refugia dos ataques aéreos para proteger dos cães do abrigo, porque os via a ter “ataques de pânico” e reagir com agressividade.

Ela rasteja pela área, sob todo aquele horror e sob as bombas, e continua a resgatar cães, enquanto os soldados correm [para combater]. Eu nem sei como descrever toda esta loucura! Estou a chorar de dor e de impotência!”, lia-se na mensagem enviada ao jornal espanhol.

Assim que os russos avançaram pelo bairro industrial onde se localiza um dos dois abrigos, era inevitável não pensar qual seria o futuro das mulheres e das 700 criaturas que têm a seu cargo.

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Nas imagens a que o El Confidencial teve acesso, há cães amontoados nos corredores, à espera de comida. Estão infestados de pulgas e enfraquecidos por demodicose e sarna sarcóptica. Com ou sem guerra, os abrigos carecem dos medicamentos necessários e, mais ainda, do dinheiro necessário para operar os que precisam de cirurgia. “Também não há recursos para alimentar adequadamente os que estão doentes ou aqueles que acabaram de ser operados”, garantem as voluntárias.

Nos primeiros dias de guerra, os animais sobreviveram com a comida que restava. “A partir de agora, os animais morrerão de fome”, temem. Por exemplo, no dia 4 da invasão, três jovens de Kiev foram mortos pelas tropas russas quando voltavam de um abrigo no bairro de Bucha, onde foram entregar comida. E quando pensavam que as coisas não podiam piorar, chegou a notícia da morte de Alexandra Polishchuk, conhecida como Shasha, no final de fevereiro.

É aterrador. Dói. É insuportável. A cada segundo o nosso coração enche-se de uma dor que dá vontade de chorar. Simplesmente não sabemos mais o que fazer com tanto desespero. Perdemos a nossa maravilhosa, incrível, gentil e sincera Shasha. Não só foi uma mãe amorosa de dois filhos, mas um apoio para muitas caudas. Ela salvou muitas vidas! Ela não desejou esta guerra! Era uma pessoa comum e pacífica que vivia humildemente! E agora a sua existência foi roubada!”

Alexandra morreu na sequência de uma explosão que destruiu completamente o prédio onde vivia. O filho de 12 anos conseguiu sobreviver.

As voluntárias têm dois abrigos, um em Kherson e o outro a leste da cidade, em Oleshki, precisamente no meio da rota por onde os russos passaram. No total, cuidam de 794 animais: 507 cães e 94 gatos no abrigo em Oleshki e outros 193 cães em Kherson. Muitas vezes, uma única pessoa tem de cuidar de todo o abrigo.

O problema é que [o abrigo de Kherson] fica ao lado da ponte [Antonovsky], onde disparam continuamente. Nas nossas instalações há fragmentos das bombas que estão a ser lançadas. Nunca se sabe o que vai acontecer no dia seguinte ou como vamos conseguir mais comida ou quanto tempo o dinheiro que temos vai durar”, sublinhou Angelina.

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Muitos ucranianos, que fogem da guerra, levam os animais consigo, contudo, há quem não consiga transportar tantos animais. Várias organizações europeias estão a trabalhar para ajudar a retirar e a facilitar a adoção de animais ameaçados pela guerra. Há, no entanto, sérios problemas logísticos e administrativos para tirá-los do país que ainda não foram resolvidos.

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