O Chefe do Estado-Maior da Armada (CEMA) vai mesmo afastar o capelão da Marinha que teceu críticas ao próprio Gouveia e Melo no Facebook, no final de março. Licínio Luís usou o Facebook para criticar a forma como foi gerido o caso dos fuzileiros suspeitos de participar na morte de um agente da PSP à porta de uma discoteca de Lisboa e o almirante não gostou.

Várias fontes militares confirmaram ao Observador que o capelão atualmente em funções na Marinha, Licínio Luís, vai ser substituído pelo atual capelão dos Pupilos do Exército, o padre Diamantino Teixeira.

O bispo das Forças Armadas, D. Rui Valério, que tem a responsabilidade de exonerar e conduzir os párocos na estrutura militar, remeteu todos os esclarecimentos sobre o caso para o gabinete do CEMA. Já o gabinete de Gouveia e Melo não confirmou as mudanças em curso e o próprio capelão da Marinha recusou-se a falar sobre o caso.

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Mas o Observador sabe que o capelão dos Pupilos do Exército foi informado há pelo menos duas semanas de que ia ser colocado em novas funções, transferindo-se daquela escola militar para a Marinha.

No entanto, não foi possível apurar a partir de que momento Licínio Luís deixará as funções que ainda exerce na Marinha. Em parte, porque a saída do padre Diamantino Teixeira dos Pupilos do Exército e a sua integração na Marinha implicam uma mudança de ramo, o que, segundo fontes militares, torna estes processos mais “morosos”.

O afastamento do ainda capelão da Marinha surge cerca de um mês e meio depois de uma primeira tentativa de transferência. A 29 de abril, em resposta escrita às questões colocadas pelo Observador, o gabinete do CEMA referia que, naquela data, “o senhor capelão encontra-se exonerado” das suas funções, depois de um encontro presencial com o almirante CEMA.

Essa decisão surgia associada às críticas a Gouveia e Melo que Licínio Luís teceu nas redes sociais a propósito de um discurso que o CEMA fez na casa dos fuzileiros, na sequência da morte de um agente da PSP vítima de agressões em que alegadamente teriam participado dois militares daquela força especial.

O agente Fábio Guerra estava de folga na madrugada de 19 de março. À saída de uma discoteca de Lisboa, onde estava na companhia de outros colegas, deparou-se com um grupo que provocava distúrbios e interveio para serenar a situação. Acabou espancado por elementos desse grupo e, dois dias mais tarde, viria a morrer, não resistindo aos ferimentos provocados.

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Já depois de ser conhecido o alegado envolvimento de elementos dos fuzileiros nessas agressões, Gouveia e Melo deslocou-se à Base do Alfeite, casa dos fuzileiros, onde realizou um discurso no qual referia o homicídio.

“Os acontecimentos do último sábado já mancharam as nossas fardas, independentemente do que vier a ser apurado. O ataque selvático, desproporcional e despropositado não pode ter desculpas e justificações nos nossos valores, pois fere o nosso juramento de defender a nossa pátria. O agente Fábio Guerra era a nossa pátria, a PSP e as forças de segurança são a nossa pátria e nela todos os nossos cidadãos”, disse então Gouveia e Melo.

Essas palavras, e a ideia de que o CEMA estava a criticar abertamente aquele corpo, motivaram as críticas de Licínio Luís nas redes sociais. “O senhor almirante que aguarde pela Justiça. Julgar sem saber não corre nada bem”, escreveu o capelão da Marinha. Dias mais tarde, recebia a indicação do próprio Gouveia e Melo de que estava exonerado.

Essa notícia — e a possibilidade de expulsão do ramo que então se admitia que pudesse ocorrer — acabou a gerar reações no seio da Marinha que extravasaram para as redes sociais.

A condição de “exonerado” acabaria por não durar mais de 24 horas. Licínio Luís pediu desculpas na mesma rede social e, no dia seguinte, o almirante Gouveia e Melo recuava e voltava a integrar o capelão (na verdade, a ordem de marcha nunca chegou a ser efetivada). Mas já nesse momento várias fontes militares admitiam que seria uma questão de tempo até que o afastamento fosse concretizado.