O primeiro-ministro, António Costa, considerava “inoportuno” o Banco de Portugal estar a tentar afastar Isabel dos Santos da administração do EuroBic, quando estava em curso, em 2016, uma solução para a saída da filha do ex-Presidente angolano do capital do BPI. É o próprio António Costa que o diz, segundo apurou o Observador, num SMS que enviou a Carlos Costa cerca de hora e meia após a pré-publicação do primeiro excerto do livro “O Governador” – uma mensagem eletrónica onde desmente que tenha dito que não se podia “tratar mal” a filha do Presidente de um “país amigo”.

De acordo com informações recolhidas pelo Observador, o primeiro-ministro dirigiu-se diretamente ao antigo governador do Banco de Portugal para rebater aquilo que está escrito na obra que chega esta semana às bancas – “O Governador”, de Luís Rosa, jornalista do Observador. Garantindo que é falsa a declaração sobre a filha de José Eduardo dos Santos, o primeiro-ministro confirma na mensagem eletrónica agora enviada que telefonou a Carlos Costa após uma reunião em que o Banco de Portugal tentou afastar Isabel dos Santos do EuroBic (então chamado Banco Bic) em 2016.

No relato feito por António Costa nesta mensagem recente, o primeiro-ministro teria contactado o governador do Banco de Portugal – um supervisor financeiro independente – para sublinhar a “inoportunidade” da medida que o regulador bancário tinha levado a cabo, relativamente ao Banco Bic. E era inoportuno tendo em conta o processo da venda da participação de Isabel dos Santos num outro banco, o BPI, aos espanhóis do La Caixa.

O Observador tentou, sem sucesso, contactar Carlos Costa, esta manhã. Também contactado esta manhã, o gabinete de comunicação do primeiro-ministro não fez comentários – esta notícia será atualizada com uma resposta de António Costa, quando esta chegar.

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Em 2016, o BPI vendeu 2% da sua posição de 51,6% no Banco Fomento Angola a Isabel dos Santos, no âmbito de um processo complexo em que o banco esteve sob pressão para reduzir o nível de exposição, neste caso, a Angola – o chamado “limite dos grandes riscos”. O acordo para a saída de Isabel dos Santos foi facilitado pelo facto de o Governo de António Costa ter feito uma alteração legislativa que facilitava o fim da blindagem dos estatutos dos bancos, o que, por sua vez, facilitaria a compra por parte do La Caixa do capital da instituição.

Aliás, o próprio António Costa, na mensagem que envia a Carlos Costa, apresenta, segundo as informações recolhidas pelo Observador, como “inoportuna” a iniciativa do governador de, na altura, vetar Isabel dos Santos da administração do Bic. Isto porque estaria a ser preparada uma solução relativamente à sua participação no BPI mas, ao fracassar essa hipótese, o Governo acabou por intervir diretamente com o que ficou conhecido como “decreto BPI”. O primeiro-ministro estará, assim, a atribuir a Carlos Costa a responsabilidade pela necessidade de intervenção legislativa.

Na mensagem recente, António Costa diz, também, a Carlos Costa que sempre agiu para reduzir a influência de Isabel de Santos na banca portuguesa – e critica o então governador por, na sua ótica, não ajudar nesse objetivo.

A reunião entre Isabel dos Santos e Carlos Costa foi a 12 de abril de 2016 e foi também nesse dia, segundo “O Governador”, que António Costa ligou ao governador do Banco de Portugal. O diploma que levaria à saída de Isabel dos Santos do BPI é posterior – 20 de abril – tendo sido aprovado em Conselho de Ministros a 14 de abril e promulgado a 18 de abril (para entrar em vigor a 1 de julho).

O “problema” do BPI acabou por se resolver quando o banco passou, a 100%, para o La Caixa. No Banco Bic, Fernando Teixeira dos Santos – ex-ministro das Finanças, próximo de Carlos Costa – acabaria nomeado para presidente do banco, que passou então a chamar-se EuroBic. Após a publicação de um capítulo de “O Governador”, António Costa fez saber que vai processar Carlos Costa, antigo governador do Banco de Portugal.

“Foram proferidas pelo doutor Carlos Costa declarações que são ofensivas do meu bom nome, da minha honra e da minha consideração. Contactei o doutor Carlos Costa, ele não se retratou, nem pediu desculpas e, portanto, falei com o meu advogado, o doutor Manuel Magalhães e Silva”, confirmou o primeiro-ministro, aos jornalistas.

Entretanto, o PSD veio dizer que quer saber se o primeiro-ministro pressionou o ex-governador do Banco de Portugal para “manter Isabel dos Santos intocável”. O vice-presidente do PSD Leitão Amaro disse querer saber “se e porque” o Primeiro-ministro “interferiu junto de uma instituição independente”. “O país precisa dessa resposta”, insistiu Leitão Amaro.

Teixeira dos Santos admite “enormes pressões” sobre antigo governador do Banco de Portugal