Uma dezena de deputados do PSD vão apresentar uma declaração de voto quanto à tomada de posição da bancada sobre a criação de uma comissão de inquérito ao SIS, proposta que acabou chumbada com os votos contra do PS. O PSD votou a favor — e impôs disciplina de voto –, e apesar de ninguém ter violado essa orientação, 10 deputados discordam da posição tomada pela bancada social-democrata e o ex-líder parlamentar, Paulo Mota Pinto, faltou mesmo ao momento da votação.
António Maló de Abreu, José Silvano, António Topa Gomes, António Proa, André Coelho Lima, João Dias Coelho, Carlos Eduardo Reis, Maria Emília Apolinário, Tiago Moreira de Sá e Fernando Negrão vão entregar nos próximos dias uma justificação sobre o sentido de voto.
Entre os deputados que discordam deste sentido de voto da bancada estão situações diferentes. José Silvano e André Coelho Lima estão atualmente envolvidos nos trabalhos da comissão para a revisão constitucional, enquanto Fernando Negrão é o atual presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Já o deputado Carlos Eduardo Reis tinha solicitado o levantamento da disciplina de voto por integrar o Conselho Superior de Informações.
Como deu conta a Agência Lusa, o deputado social-democrata enviou um email a Joaquim Miranda Sarmento a solicitar que pudesse votar de forma diferente da bancada — abstenção ao invés do voto a favor –, por integrar este órgão de aconselhamento do primeiro-ministro sobre os serviços de informação. O deputado social-democrata invocou um dever de independência por integrar este Conselho Superior de Informações que devia ser acautelado na votação, mas o pedido não mereceu resposta positiva da direção parlamentar.
Na manhã desta sexta-feira o líder parlamentar enviou um email à bancada a dar conta de que “não pode abrir nenhuma exceção relativamente à disciplina de voto” e, na hora da votação, todos os deputados corresponderam. Ainda assim, há uma outra situação que também saltou à vista. O ex-líder parlamentar e antigo juiz do Tribunal Constitucional, Paulo Mota Pinto, não marcou presença no momento da votação.
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Esta semana, em entrevista à Rádio Renascença e ao jornal Público, Mota Pinto tinha dito que não concordava com a ideia de avançar para um inquérito parlamentar sobre a atuação do SIS: “Não vejo com bons olhos. Os trabalhos dessa comissão de inquérito poderiam ter efeitos bastante negativos para uma estrutura fundamental para o Estado. (…) Os factos não justificam isso”, disse o antigo líder da bancada.
Ex-líder parlamentar do PSD discorda de uma comissão de inquérito aos serviços de informações
Esta entrevista de Paulo Mota Pinto terá sido um catalisador para que outros deputados quisessem votar contra ou pelo menos abster-se na votação, o que seria debatido na reunião do grupo parlamentar que chegou a estar marcada para quinta-feira mas que acabou por ser cancelada horas antes de acontecer por motivo de doença de Joaquim Miranda Sarmento. Este conjunto de deputados esperava pela reunião para poder debater a possibilidade de levantar a disciplina de voto.
O deputado André Coelho Lima concorda a linha argumentativa de Mota Pinto, ao esclarecer, na declaração de voto que apresentou, que “o PSD não pode deixar de ser visto pela função pública como estando à altura de a poder gerir” e “sobretudo, o PSD não pode deixar o PS sozinho nessa posição”, correndo assim o risco de deixar “o PS isolado no espaço do institucionalismo“.
O deputado social democrata, que na liderança de Rui Rio tinha a pasta da segurança interna, entende que não há “necessidade de convocação de uma comissão de inquérito quando os factos conhecidos são já suficientes para a devida qualificação”, discordando da posição adotada pelo partido.
Ainda que nem todos os deputados que vão apresentar declarações possam ter discordâncias de fundo com a abordagem do PSD à polémica com a atuação das secretas, queriam a dispensa da disciplina imposta pela direção parlamentar para poderem votar de forma diferente a criação de uma comissão de inquérito que foi proposta por outros dois partidos à direita: a Iniciativa Liberal e o Chega.
A violação da disciplina de voto aciona de forma automática a abertura de um procedimento disciplinar, mas tal não se verifica tendo em conta que, apesar da dezena de deputados que mostraram insatisfação pública, todos cumpriram com a orientação dada pela direção do grupo parlamentar.