O vice-primeiro-ministro italiano Matteo Salvini, líder do partido anti-imigração Liga, defendeu esta sexta-feira, em tribunal, a sua política migratória enquanto ministro da Administração Interna, afirmando-se orgulhoso de ter prestado “um serviço útil” a Itália.

Salvini compareceu esta sexta-feira perante o tribunal de Palermo, na Sicília, para uma audiência no quadro de um processo iniciado em outubro de 2021, no qual é acusado de rapto e abuso de poder, por ter bloqueado 147 migrantes no mar durante três semanas, em 2019, ao recusar o seu desembarque do navio de socorro e salvamento da organização não-governamental (ONG) espanhola Open Arms.

Considero que prestei um serviço útil ao país. Assumo total responsabilidade pelo que fizemos, com resultados que nunca foram alcançados antes ou depois, não só em termos de luta contra o tráfico de seres humanos, mas sobretudo em termos de vidas salvas”, declarou, numa intervenção de quase uma hora perante o tribunal de Palermo, que deverá determinar se o antigo ministro da Administração Interna impediu ilegalmente os migrantes de desembarcarem num porto.

A situação acabaria por ser desbloqueada pelo Tribunal Administrativo de Lázio, que permitiu a chegada dos migrantes à ilha de Lampedusa, a sul da Sicília, devido à situação precária das pessoas a bordo, incluindo menores, após 20 dias de bloqueio.

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Matteo Salvini, atual aliado da primeira-ministra Giorgia Meloni (partido Irmãos de Itália), numa coligação de direita e extrema-direita no poder desde 2022, integrava, à data dos factos, em 2019, o primeiro governo de Giuseppe Conte (Movimento 5 Estrelas), que durou pouco mais de um ano – de junho de 2018 a agosto de 2019.

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A sua curta era enquanto ministro da Administração Interna ficou marcada por uma política de “mão dura” relativamente à imigração, que incluiu o encerramento dos portos italianos aos navios de ONG que resgatam náufragos no Mediterrâneo.

Na audiência desta sexta-feira, o antigo ministro da Administração Interna, que incorre numa pena de prisão de 15 anos, rejeitou categoricamente as acusações de privação de liberdade e abuso de poder que lhe são imputadas, enfatizando que, sob a sua política, as travessias de migrantes diminuíram 90%, enquanto as mortes de migrantes no mar caíram para metade, e garantiu que agiu no interesse da segurança nacional.

“Protegi a segurança nacional, como demonstra o facto de pelo menos três incidentes criminais em França, na Alemanha e na Bélgica serem imputáveis a pessoas que desembarcaram em Lampedusa”, sustentou ainda.

Durante o julgamento que decorre em Palermo já foram chamados a depor antigos membros do “Governo Conte I”, que responsabilizaram Salvini pelo sucedido, incluindo Giuseppe Conte, agora na oposição, segundo o qual a política de “portos fechados” fazia parte da estratégia de “propaganda” do antigo ministro da Administração Interna, com o intuito de se apresentar como o elo forte e responsável do executivo.

Já Salvini argumenta que a política de “portos fechados” que impediu o desembarque dos migrantes a bordo do navio da Open Arms foi partilhada pelo então primeiro-ministro e líder do Movimento 5 Estrelas, que, no entanto, viria a “mudar de ideias”.

Conte partilhou todas as opções sobre a política de migração, exceto a que diz respeito ao Open Arms, e isto explica-se facilmente se considerarmos que entre 08 e 09 de agosto começou a crise governamental”, sublinhou Salvini.

O governo viria a cair nesse mesmo mês, depois de Salvini retirar o seu apoio a Conte, na expectativa de o vencer nas eleições antecipadas que se seguiriam, mas seria o líder do Movimento 5 Estrelas a conseguir formar de novo uma coligação governamental, e desta feita sem a Liga.

Matteo Salvini é agora ministro das Infraestruturas e Transportes, num governo de coligação encabeçado pelos Irmãos de Itália de Giorgia Meloni e do qual faz ainda parte a Força Itália, que também adotou uma política dura relativamente à imigração, mas sem os resultados esperados, já que 2023 foi dos anos com maior número de chegadas a Itália: mais de 157 mil migrantes, um aumento de cerca de 50% face ao ano anterior.

Por seu lado, o fundador da Open Arms, Oscar Camps, declarou esta sexta-feira, ao entrar na sala de audiências, que no processo ficou provado que “foi uma decisão pessoal dele (Salvini) infligir este castigo desnecessário” aos imigrantes a bordo do navio, “privando-os da assistência necessária e mantendo-os no mar”.

“Já sabemos que o governo não apoiou a sua decisão, que se tratou de uma decisão pessoal, e estamos obviamente à espera da decisão do sistema judicial italiano”, completou Camps.

O processo prosseguirá no próximo mês, com o depoimento em tribunal do atual ministro da Administração Interna, Matteo Piantedosi, de acordo com fontes judiciais.