A inspetora Marta Gonçalves disse esta sexta-feira que a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) não encontrou evidências de que as gémeas tenham tido tratamento preferencial quando receberam o Zolgensma ou que o erário público tenha sido lesado.

“Esse tratamento preferencial não foi evidenciado”, afirmou a inspetora da IGAS numa audição na comissão de inquérito ao caso das gémeas luso-brasileiras tratadas no Hospital de Santa Maria.

Marta Gonçalves disse que, tal como concluiu a investigação da IGAS, a primeira consulta das crianças foi marcada “de forma irregular”, mas o tratamento “decorreu como decorreria o de qualquer outra criança”.

Na resposta ao deputado Paulo Muacho, do Livre, a inspetora indicou também que a IGAS não apurou que “tivesse sido lesado o erário público, porque elas eram elegíveis para aquele medicamento”, que tem um custo de cerca de dois milhões de euros por pessoa.

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Mais à frente, a deputada social-democrata Eva Brás Pinho quis saber se o IGAS sofreu alguma pressão ou influência externa no decorrer da investigação, o que a inspetora recusou.

“Essa resposta é muito simples, não. Não sofremos nenhum tipo de pressão seja para o que for”, indicou.

Ainda em resposta ao PSD, Marta Gonçalves disse que “quer a anterior ministra, quer a sua chefe de gabinete, quer o próprio doutor Lacerda Sales e o seu chefe de gabinete, todos referiram que uma secretária não tem autonomia para fazer este tipo de diligências”, nomeadamente para pedir a marcação da primeira consulta das gémeas no Santa Maria, “a não ser que tenham tido ordem superior”.

A responsável afirmou também não ter sido encontrada motivação pessoal que pudesse indicar que a secretária do antigo secretário de Estado António Lacerda Sales tivesse feito o contacto por motivação própria.

Marta Gonçalves recusou comentar se Carla Silva poderá estar a ser usada como bode expiatório, e afirmou “que houve uma indicação superior para que a consulta fosse marcada”.

A inspetora defendeu também que o que se vem sabendo sobre o caso não alteraria as conclusões do relatório.

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Já em resposta a André Ventura, do Chega, a inspetora da IGAS disse que foram questionados os “vários níveis de decisão” do Hospital de Santa Maria e que não foi encontrada “nenhuma evidência que sustentasse esses ditos rumores que estavam a circular pelo hospital” sobre uma alegada intervenção de Marcelo Rebelo de Sousa.

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À deputada Ana Abrunhosa, do PS, Marta Gonçalves justificou que não foi mais investigada a ligação ao Dona Estefânia, hospital contactado pela Casa Civil do Presidente da República, uma vez que as crianças não foram tratadas nessa unidade e que esse contacto teve como objetivo um “pedido de informação”. E salientou que a IGAS não está “a apurar interferências políticas”.

Questionada pela deputada Joana Cordeiro, da IL, sobre o porquê de não terem ouvido o filho do Presidente da República, que alertou para o caso das crianças, a inspetora justificou que, “tendo havido ou não essa interferência”, interessava à IGAS “perceber o que tinha havido da parte do Ministério da Saúde, não da parte de Nuno Rebelo de Sousa”.

A outra investigadora da IGAS inquirida corroborou o que havia dito Marta Gonçalves, na primeira audição da tarde, dizendo que a intenção da investigação era perceber “como tinha sido o acesso das crianças às entidades hospitalares” e não a interferência política.

“O objeto do processo não era esse. Nós queríamos perceber como tinha sido o acesso das crianças às entidades hospitalares, ou à entidade hospitalar, onde os cuidados lhes foram prestados. Daquilo que nos apercebemos, não houve aqui intervenção do Presidente da República. O Presidente da República foi informado ou questionado pelo filho e pronto”, realçou Maria de Lurdes Lemos.

Esta observação motivou um momento de maior exaltação, quando a deputada do PS Ana Abrunhosa disse que “há uma lacuna no relatório” e que “há contradições”.

“Por um lado, diz que não há evidência de interferência, por outro, diz que o objeto da investigação não foi a atuação do Presidente [da República], por outro, lado a Casa Civil [da Presidência] diz que houve telefonemas da Casa Civil para o [Hospital] Dona Estefânia e depois dizem aqui que a altura em que o Presidente da Casa Civil remete a informação não vos dá tempo nem para voltarem a questionar?”, inquiriu a socialista.

Maria de Lurdes Lemos explicou que o Presidente da República fez um comunicado em 4 de dezembro de 2023, “em que admite que houve contactos” e na altura falava do Centro Hospitalar Lisboa Norte.

“Nessa altura, nós já tínhamos marcado as diligências para começarmos a ouvir os diversos intervenientes. Claro que com essa informação nós centrámos as perguntas relativamente aos contactos às entidades hospitalares, essas perguntas foram centradas nos dirigentes do Centro Hospitalar Lisboa Norte”, sustentou.

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