Os rebeldes sírios começaram a planear o ataque para derrubar o regime de Bashar al-Assad há pelo menos um ano. As revelações são de Abu Hafs al-Hamwi, o principal comandante militar do principal grupo rebelde — o Hayat Tahrir al-Sham (HTS), na sua primeira entrevista aos meios de comunicação social estrangeiros, citada pelo The Guardian.

Esta foi uma operação altamente disciplinada, contando com a estreita coordenação entre os grupos da oposição em todo o país. O plano para derrubar Assad, apelidado de “dissuasão da agressão”, começou de forma organizada há um ano, mas vários grupos rebeldes estavam a preparar-se há mais tempo.

Al-Hamwi falou ainda sobre a forma como o seu grupo, com base no noroeste do país, comunicou com os rebeldes do sul para criar uma força de guerra unificada com o objetivo de cercar Damasco, objetivo alcançado no fim de semana passado. “Tivemos uma convicção, apoiada por precedentes históricos, de que ‘Damasco não poderia cair até que Aleppo caísse’. A força da revolução síria estava concentrada no norte, e acreditávamos que, uma vez que Aleppo fosse libertada, poderíamos mover-nos para o sul em direção a Damasco”, disse Al-Hamwi.

Com a ajuda do HTS, uma sala de operações foi fundada a sul, reunindo os comandantes de cerca de 25 grupos rebeldes. Cada um deles tinha a cargo a coordenação dos movimentos dos seus combatentes internamente e entre si e com o principal grupo do norte da Síria. O destino final de todos, tanto dos que partiam do norte como do sul, era a capital, onde no final se encontraram enquanto tomavam a cidade.

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O HTS enviou mensagens aos rebeldes no sul há um ano e começou a explicar-lhes como criar a tal sala de guerra unificada. O sul da Síria estava sob o controle do regime desde 2018 e os grupos rebeldes foram forçados a esconder-se. Grande parte da liderança militar da oposição do sul estava no exílio na Jordânia, onde mantinham contacto com os respetivos grupos.

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Rebeldes sírios criaram drones inovadores que deitaram por terra a superioridade militar de Assad

Desde 2019, o principal grupo da oposição síria desenvolveu não só a doutrina militar que utilizou para transformar combatentes provenientes de grupos de oposição e jihadistas desorganizados numa força de combate disciplinada, como também começou a produzir suas próprias armas, veículos e munições.

Sabendo que o regime de Assad tinha recursos militares extensos e o apoio da Rússia e do Irão, o grupo sabia que precisava de criatividade para usar os meios limitados de que dispunha. Criou então uma unidade de drones, que começou a produzir este tipo de armas em 2019. Para tal, reuniu engenheiros, mecânicos e químicos. “Unificamos o conhecimento deles e estabelecemos objetivos claros: precisávamos de drones de reconhecimento, drones de ataque e drones suicidas, com foco no alcance e resistência”, disse Al-Hamwi.

O HTS criou um um novo modelo de drone suicida, chamado “Shahin”, que significa falcão em árabe. Segundo o chefe militar dos rebeldes, o nome “simboliza a sua precisão e poder”. O drone foi usado pela primeira vez contra as forças do regime este mês, demonstrando alta eficácia e tornando-se elemento chave do ataque contra o regime de Assad.

O jornal Al-Hamwi conta que uma das principais caras do ataque rebelde é um engenheiro agrónomo formado na universidade de Damasco e deslocado pelo regime de Assad juntamente com a sua família para Idlib.

Sobre o futuro do país, o porta-voz da principal força rebelde garante que “as minorias na Síria fazem parte da nação e têm o direito de praticar os seus rituais, educação e serviços como qualquer outro cidadão sírio”. “O regime plantou a divisão e nós estamos a tentar, tanto quanto possível, ultrapassar essas divisões”, acrescentou, na entrevista.