O cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko, um viajante solitário do espaço, deixou de o ser em 2014. Foi perseguido pela sonda Rosetta, o primeiro veículo espacial a orbitar um cometa, e desde esta quarta-feira é “habitado” pelo módulo de “aterragem” Philae. Mas afinal que cometa é este? E porque motivou uma missão que começou há mais de 20 anos?
Apesar de ser um visitante regular da parte mais interior do sistema solar – a cada seis anos e meio completa a órbita à volta do Sol -, o cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko, também chamado Chury ou C-G, foi observado pela primeira vez em 1969 por um grupo de astrónomos ucrânianos que estudavam cometas no Instituto Astrofísico de Alma-Ata, no Casaquistão. Klim Churyumov descobriu-o numa fotografia tirada por Svetlana Gerasimenko e depois de uma análise mais profunda identificou-o como um novo cometa.
Depois disso foi possível observá-lo de cada vez que se aproximou do centro do sistema solar – em 1969, 1976, 1982, 1989, 1996, 2002 e 2009 -, mas as imagens foram sempre muito difíceis de obter, porque os telescópios na Terra viam-no sempre com um fundo carregado de estrelas, logo muito difícil de distinguir dos restantes pontos brilhantes. O melhor registo foi conseguido pelo Telescópio Espacial Hubble em 2003, tendo sido possível estimar o tamanho do cometa: três quilómetros de largura por cinco de comprimento. Quando a sonda Rosetta se aproximou do cometa este ano a forma irregular tornou-se evidente, como se dois corpos tivessem colidido – um corpo e uma cabeça, quase como um pato de borracha de brincar.
À medida que o cometa se aproxima do Sol, o gelo que se encontra à superfície e abaixo dela derrete libertando gases e poeiras – as primeiras análises aos vapores do cometa revelaram que cheirava a ovo podre. O halo à volta do cometa, que pode chegar a um milhão de quilómetros, torna-se mais brilhante, logo mais fácil de identificar no céu, mas ao mesmo tempo é mais difícil conseguir observar pormenores à superfície. A interação das partículas energéticas dos ventos solares com os gases do halo – como monóxido de carbono, dióxido de carbono ou cianeto de hidrogénio – transforma as moléculas em iões numa cauda que se pode estender por 100 milhões de quilómetros.
O período de cerca de seis anos e meio que o cometa Churyumov-Gerasimenko leva a dar a volta ao Sol permite um estudo muito mais regular do que o do conhecido cometa Halley que só é visível na Terra a cada 76 anos – passou a última vez junto à Terra em 1986, mas todos os anos ainda é possível observar os fragmentos do cometa durante o mês de outubro (chuva de Oriónidas). Ainda menos frequente é o cometa Siding Spring que passou junto a Marte durante o mês de outubro, mas que provavelmente não o tornará a fazer nos próximos milhões de anos.
Mas o percurso de um cometa que cruza as órbitas de vários planetas pode sofrer algumas perturbações. Imagine o poder que pode ter um planeta como Júpiter com 142 mil quilómetros de diâmetro (a Terra tem apenas 12 mil) e uma força gravítica duas vezes e meia superior à da Terra. Passar duas vezes junto ao maior planeta do sistema solar – uma em 1840 e outra em 1959 – fez com que a distância mínima ao Sol se tornasse cerca de três vezes menor – atualmente 194 milhões de quilómetros, contra a distância máxima que são 858 milhões de quilómetros.
Os gases e poeiras que são libertados pelo cometa, assim como as características químicas e geológicas à superfície e em profundidade podem fornecer informações importantes sobre a origem e desenvolvimento do sistema solar, assim como qual o papel dos cometas nesta evolução. Como quanto mais próximo do Sol, mais gases e poeiras serão libertados pelo cometa, a sonda Rosetta tentou alcançá-lo numa região mais fria do sistema solar e continuará a acompanhá-lo ao longo de um ano.
A missão Rosetta foi aprovada em novembro de 1993 e desde então, até ao lançamento em março de 2004, engenheiros e cientistas desenvolveram todos os equipamentos e programas necessários para que a missão fosse bem-sucedida. A sonda Rosetta viajou no sistema solar durante dez anos até encontrar o cometa a 6 de agosto de 2014. E assim se manterá até ao final de 2015 enquanto o cometa continua a órbita em volta do Sol. Esta quarta-feira o módulo Philae pousou na superfície do cometa pela primeira vez na história da humanidade.
O nome Rosetta foi escolhido como analogia à Pedra de Roseta, uma pedra basáltica com uma inscrição escrita em três línguas – hieroglifos em egípcio antigo, uma variante de egípcio mais recente e grego antigo. Esta combinação das três línguas permitiu descodificar os hieróglifos antigos, assim como se espera que a missão Rosetta decifre a informação contida no cometa, um viajante do universo primitivo. O módulo de “aterragem” Philae também está relacionado com o Egito. É o nome de uma ilha no rio Nilo onde foi encontrado um obelisco, que em conjunto com a Pedra de Roseta, ajudou a decifrar a antiga língua egípcia. O templo egípcio antigo que existia na ilha Philae foi transferido, pela UNESCO, para outra ilha por estar em risco de ser submerso pela construção de uma barragem no rio Nilo. A ilha que recebeu o templo chama-se Agilkia, tal como o local escolhido para a “aterragem” do módulo no cometa.
Embora a sonda Rosetta seja o primeiro engenho humano a orbitar um cometa, outras naves já se tinham aventurado no espaço à procura de cometas:
International Cometary Explorer (Explorador Internacional de Cometas)
Lançado a 12 de agosto de 1978, pela agência espacial norte-americana (NASA), o objetivo era realizar o primeiro encontro com um cometa. Depois disso cruzou a cauda de alguns cometas, como o Halley – esteve a 31 milhões de quilómetros do núcleo do cometa.
Sakigake e Suisei
As naves japonesas gémeas tinham como objetivo estudar o cometa Halley durante a viagem pelo interior do sistema solar em 1986. Lançadas durante o ano de 1985, Sakigake esteve a sete milhões de quilómetros do cometa e Suisei observou as interações do cometa com os ventos solares a 151 mil quilómetros.
Giotto
A missão da ESA também foi lançada para estudar o cometa Halley em 1986. Esta nave conseguiu a imagem mais próxima, obtida até então, de um cometa – a nave passou a 600 quilómetros. Anos mais tarde, em 1992, a nave esteve a 200 quilómetros de outro cometa, o Grigg-Skjellerup.