“Queremos dar uma mensagem de confiança aos investidores estrangeiros. Para diminuir a confiança, já chega o Governo. Não precisa da ajuda da oposição”. Foi assim que António Costa justificou esta quinta-feira o discurso que fez por ocasião do Novo Ano Chinês, no Casino da Póvoa de Varzim e que motivou polémica e a desfiliação de um dos fundadores do PS, Alfredo Barroso. “Fico perplexo que pensem que a oposição ao governo me impede de defender o país”, acrescentou.
Segundo Costa, que falou esta quinta-feira na sede do PS a propósito de um novo projeto digital do jornal oficial do partido, “bem podem pôr as palavras num outro contexto”, mas os portugueses conhecem “o aumento brutal do desemprego, da pobreza e os cortes dos salários”, nos últimos quatro anos.
“Nenhum português tem dúvidas do que eu penso sobre o atual Governo e a necessidade de mudar de Governo”, afirmou Costa, que, na Póvoa do Varzim, admitira que o país estava melhor do que em 2011. O líder do PS lembrou as conclusões da Comissão Europeia, divulgadas esta quinta-feira, que indicam que os cortes motivados pela austeridade em Portugal atingiram os mais pobres: “Portugal mantém desequilíbrios excessivos, que determinam vigilância reforçada”, “cortes nos apoios sociais afetaram desproporcionalmente os mais pobres”, “Portugal foi o país que sofreu maior aumento da pobreza, mais 210.000 pessoas entre 2012 e 2013”.
Na Póvoa do Varzim, Costa declarara que, “em Portugal, os amigos são para as ocasiões, e numa ocasião difícil em que muitos não acreditaram que o país tinha condições para enfrentar e vencer a crise, a verdade é que os investidores chineses disseram ‘presente’, vieram, e deram um grande contributo para que Portugal pudesse estar na situação em que está hoje, bastante diferente daquela em que estava há quatro anos”.
Na plateia estavam vários membros da comunidade chinesa em Portugal, mas também os deputados do PS Vitalino Canas e José Magalhães, o presidente da Câmara de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, e o diretor do JN, Afonso Camões.
O fundador do PS, Alfredo Barroso, não gostou e anunciou no Facebook que ia enviar uma carta a pedir a desfiliação do partido, devido à intervenção “vergonhosa” de António Costa.
“Sou um dos fundadores do PS (em 1973) e sou, hoje, o militante número 15 do partido (com as quotas em dia). Mas já chega! Nunca me passou pela cabeça que um secretário-geral do PS se atrevesse a prestar vassalagem à ditadura comunista e neoliberal da República Popular da China, e se atrevesse a declarar, sem o menor respeito por centenas de milhares de desempregados e cerca de dois milhões de portugueses no limiar da pobreza, que Portugal está hoje melhor do que há quatro anos. A declaração de António Costa é uma vergonha!”, escreveu numa nota, intitulada “Depois da ignóbil ‘chinesice’ de Costa, demito-me do PS, e é já!”.
Fonte da direção do PS disse, durante a noite, à agência Lusa que a intervenção de António Costa perante a comunidade chinesa foi “caraterizada pelo sentido de Estado”. “Perante o exterior, António Costa recusa-se a falar mal do país, mesmo que não goste deste Governo. PSD e CDS estão a tentar um ‘fait-divers’ com esse assunto”, justificou ainda a mesma fonte da direção dos socialistas. E esta quinta-feira de manhã, Costa fez uma declaração também à Lusa anunciando que quer esclarecer pessoalmente com Barroso o contexto das suas declarações.
“Tenho muita estima e consideração por Alfredo Barroso, respeito qualquer que seja a sua decisão. Lamento-a”, disse. Também Ferro Rodrigues, líder parlamentar, comentou o caso. “Lamento a desfiliação de Alfredo Barroso, lamento os termos em que ela se processou”, declarou à entrada para a reunião semanal da bancada socialista.