A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) não está contra o Banco de Portugal na questão do papel comercial do BES, mas a decisão de resolução do Banco Espírito Santo representa “uma profunda limitação” da missão da CMVM de proteger os investidores de retalho, realça Carlos Tavares.

O presidente da CMVM está esta terça-feira no parlamento a fazer um ponto de situação sobre o papel comercial do Grupo Espírito Santo (GES) vendido aos cliente de retalho do BES.

Carlos Tavares diz que da análise aprofundada da situação e dos pareceres externos pedidos sai reforçada a tese de que os clientes têm juridicamente o direito ao reembolso.

Admitindo que que a solução não passará pela regulação, já que o Banco de Portugal decidiu retirar esta responsabilidade do Novo Banco, o presidente da CMVM apela a uma solução comercial que já foi proposta à gestão da instituição.

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Uma solução possível, sugerida por Carlos Tavares, seria a troca de papel comercial de empresas do GES (Rioforte e ESI) por dívida subordinada do Novo Banco, o que não consumiria no imediato capital da instituição ou liquidez, podendo ser bem aceite pelo comprador, sobretudo se fosse permitida o reconhecimento do impacto nos resultados num período alargado.

Para além da troca por dívida, ainda sem rácio de troca e prazo definidos, a CMVM admite que o Novo Banco possa avançar a alguns clientes necessitados uma liquidez imediata, mediante o reembolso parcial ou abertura de uma linha de crédito com penhor dos títulos até 100 mil euros por titular.

O presidente da CMVM revela que um dos três candidatos à compra do Novo Banco já contactou o regulador do mercado, mostrando interesse em resolver o problema por causa do incómodo e o efeito reputacional deste problema. “Prefiro uma solução menos boa a nenhuma solução”, realça Carlos Tavares a propósito de propostas que abram a porta a um reembolso gradual. Em causa estão cerca de 500 milhões de euros. A alternativa é a via judicial que é a pior.

Esta solução permitiria resolver o problema do reembolso do papel comercial a prazo. Carlos Tavares reconhece contudo que não tem qualquer garantia de que esta solução seja viável. A autoridade de resolução, ou seja o Banco de Portugal, sobrepõe-se neste caso à CMVM.

Há 2080 clientes do BES que aguardam reembolso do papel comercial, 800 apresentaram queixa à CMVM. Os dados compilados pelo regulador, a partir de informação sobre os clientes e as queixas recebidas, revela que cerca de 27% destes clientes são reformados e há 8% que estavam desempregados. Quase 38% das pessoas aplicaram mais de 50% do património que tinham no BES em papel comercial.

Clientes satisfeitos com proposta da CMVM

Os clientes lesados do BES ficaram satisfeitos com a proposta apresentada pelo presidente da CMVM. Aos jornalistas, Nuno Lopes Pereira, da associação de Lesados do Papel Comercial do BES, classifica esta proposta como “excecional” e “justa”.

“É uma proposta excecional que vai de encontro às nossas expectativas. É uma solução integrada, faseada no tempo, para não prejudicar os rácios e a solvabilidade do banco”, disse. Ou seja, com esta proposta, se o Novo Banco aceitar e fizer uma proposta comercial, os clientes ficam com dívida subordinada do Novo Banco para serem compensados pelas perdas das empresas do GES.

“É uma proposta justa, adequada para repor a normalidade no sistema e a confiança”, finalizou.

Os clientes ainda não recebam qualquer reação do Novo Banco sobre esta solução, o processo de discussão das alternativas está suspenso, considerando que a venda do Novo Banco está na fase final. No entanto, recordam que a gestão liderada por Stock da Cunha já terá apresentado três possíveis soluções que foram rejeitadas pelo Banco de Portugal. E no entanto, Carlos Tavares lembrou que a instituição conseguiu encontrar soluções para outros investimento feitos por clientes do BES.

Provisão para papel comercial tem sido eliminada do Novo Banco

Na apresentação inicial, o presidente da CMVM qualificou considerou que houve um pecado capital na venda de papel comercial da Espírito Santo Internacional (ESI), cujas contas estavam falsificadas, e operações realizadas pelo GES que transformaram a Rioforte numa empresa insolvente.

Lembra que as condições de comercialização do papel comercial destas entidades dava aos investidores o direito de pedir o reembolso antecipado em caso de informação falsa do emitente e do intermediário financeiro. Mas os clientes de retalho não acionaram a cláusula porque lhes foi assegurado, pelo BES e pelo Banco de Portugal, que esse reembolso seria feito, tendo sido constituída uma provisão para o efeito.

O presidente da CMVM realça que a autoridade de resolução, o Banco de Portugal, mudou de entendimento sobre a questão, o que é visível na redução progressiva da provisão no balanço do Novo Banco (NB) para esta responsabilidade que, por ordem do regulador bancário, ficou no BES. Só 69 milhões de euros dessa provisão foram utilizados para reembolsar os clientes. Para o regulador do mercado a eliminação de provisões para responder a responsabilidades com clientes BES, de 600 milhões de euros em dezembro de 2014 e de mais 300 milhões com a publicação do balanço do ano passado já em junho deste ano, “suscita a necessidade de explicação que, até agora o NB não formulou.

Por outro lado, o regulador do mercado assinala que o Novo Banco tem proposto e encontrado soluções para outros clientes de produtos BES, obrigações e séries comerciais sobre ações preferenciais, cuja dimensão é comparável.

Apesar das contas do banco mau não serem ainda conhecidas, Carlos Tavares conhece os grandes números e conclui que a percentagem de recuperação seria irrelevante.