A ameaça das autoridades francesas é clara: abrir a fronteira em Calais, no norte de França, e deixar que todos os imigrantes passem livremente. Emmanuel Agius, vice-presidente daquela cidade francesa, pôs a hipótese de não cumprir o Tratado Le Touquet, o que permitiria que os refugiados que atravessam o Canal fossem revistados em França e não no Reino Unido.
As declarações surgem depois de David Cameron ter dito, em entrevista a um canal vietnamita, que a onda de imigrantes que tenta chegar ao Reino Unido é como uma “praga de pessoas que atravessam o Mediterrâneo, em busca de uma vida melhor”.
As criticas às palavras do primeiro-ministro britânico têm surgido umas atrás das outras. Agora foi a vez de Emmanuel Agius reagir: “Se continuar assim, com tantas provocações, acredito que a dado momento vamos dizer que os imigrantes podem passar e Mr. Cameron terá de lidar com isso”. Mas é improvável que o vice-presidente de Calais tenha poder para dispensar o acordo introduzido pelos governos Francês e Britânico para gerir o campo de refugiados de Sangatte.
Também Trevor Willmott, bispo inglês da Igreja de Inglaterra, criticou a resposta oficial à crise: “Somos um mundo cada vez mais agressivo e quando somos duros uns com os outros e esquecemos a nossa humanidade, acabamos nestas situações limite”, disse ao jornal The Guardian. A diocese de Trevor Willmott abrange o lado inglês, numa extensão de 30 km, do canal marítimo que separa os dois territórios.
Gerir as travessias
A França e o Reino Unido já tinham pedido, ontem, apoio à União Europeia para lidar com a crise crescente de refugiados no norte francês que procuram entrar em Inglaterra, sujeitando-se a travessias clandestinas e perigosas.
O porto francês de Calais tornou-se um ponto essencial para os migrantes que querem entrar na Inglaterra para fugir da guerra no Médio Oriente e do norte de África. São grupos com mais de cinco mil refugiados que chegam a Calais e tentam atravessar o túnel ferroviário que liga a Grã-Bretanha a França. Alguns morrem a fazer a travessia para entrar no Reino Unido, país onde esperam ter uma vida melhor. As travessias têm provocado tensões entre os dois países, mas a ministra britânica do interior, Theresa May, e o seu homónimo francês, Bernard Cazeneuve, uniram forças e escreveram um comunicado em conjunto, alertando para a necessidade de ajuda de outros países da União Europeia: “Não há soluções fáceis – e isto não pode ser resolvido apenas pelo Reino Unido e por França”, alertaram, num texto publicado no Telegraph, sustentando que muitas das pessoas em Calais chegaram de Itália, Grécia ou outros países, outra das razões para pedirem apelo a outros membros da UE.
Os ministros escrevem ainda que o sonho europeu não é tão certeiro quando isso: “Muitos vêem a Europa, e particularmente a Inglaterra, como um lugar que oferece ganhos financeiros. Não é este o caso – as nossas ruas não são feitas com ouro”.
Mais controlo
Na sexta-feira, David Cameron e François Hollande decidiram tomar novas medidas de segurança para controlar as entradas de refugiados. O gabinete do primeiro-ministro inglês fez saber que ia financiar um número privado de guardas para patrulhar a entrada francesa do túnel. Novas vedações, câmaras de segurança e detetores infravermelhos fazem parte das novas medidas.
As autoridades francesas já aumentaram o número de polícias na zona: mais 120 elementos em apoio aos 300 que já faziam segurança no local.
As novas medidas e o reforço de segurança já começaram a dar resultados e na noite de ontem, domingo, cerca de 1700 imigrantes foram impedidos de chegar ao túnel do canal da Mancha perto de Calais: cerca de 1000 pessoas foram intercetados na área de acesso ao túnel e outros 700 já no interior do mesmo.
Um polícia acabou por ficar ferido, “no rosto e na cabeça” nesta operação, quando foi atingido por uma pedra arremessada por um imigrante sudanês. O refugiado foi detido.
Desde junho, já morreram dez imigrantes a atravessar o túnel.