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Alexandre Cavalleri. De porteiro a rei do pernil

Perfil. Do "Maria Bolachas" até aos negócios milionários com a Venezuela, o líder da Iguarivarius cultivou a sua paixão por carros desportivos, lutou contra Bruno de Carvalho e ficou cheio de dívidas.

Quem vê pela primeira vez Alexandre Cavalleri não o esquece. É comum fazer-se transportar em carros vistosos de luxo quando vai levar os filhos ao colégio e mesmo nas férias é difícil não dar nas vistas. Em Vilamoura, no Algarve, é visto com frequência no seu iate pouco discreto: com o nome “Brutus”, é o único de cor preta que o Google mostra numa qualquer pesquisa por este nome.

O homem que agora o Ministério Público constituiu arguido na Operação Navidad por suspeitas de corrupção no comércio internacional, fraude fiscal e branqueamento de capitais com a empresa que o catapultou, a Iguarivarius, casou em outubro pela segunda vez com uma das suas funcionárias. Alvo de buscas esta semana, foi detido por ter na sua posse uma arma de guerra, uma pistola metralhadora Uzi, mas acabou por ser libertado e indiciado pelo crime de detenção de arma proibida no âmbito de um segundo processo judicial.

Afinal, quem é o rei do pernil de porco?

A discoteca e o matadouro familiar

Quem conhece Alexandre Cavalleri lembra-se dele ainda novo, quando era um porteiro entroncado de uma discoteca na Praia das Maçãs, a Maria Bolachas, orgulhoso por ter o poder de decidir quem entrava e saía da discoteca. Corriam os anos 90 e a discoteca atraía clientela da zona da Grande Lisboa que ali passava férias. Sabiam que o pai dele era dono de um matadouro na zona de Sintra, no qual Cavalleri acabaria por ir trabalhar.

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O matadouro familiar, contudo, teve o mesmo destino que os seu congéneres com o advento das novas regras sanitárias importadas da União Europeia: faliu.

Mais tarde, Cavalleri transferiu-se para outra empresa de carnes, de maior dimensão, chamada Montebravo. Foi através do departamento comercial da Montebravo que começou a visitar a Venezuela em 2007 e a ter mais ambição, levando-o a anunciar aos patrões que iria trabalhar por conta própria. A Carnes Primor e a Sapropor eram, juntamente com a Montebravo, as sociedades de carnes que começaram a explorar o mercado venezuelano.

Corriam os anos 90 e a discoteca "Maria Bolachas" atraía clientela da zona e da Grande Lisboa que ali passava férias. Sabiam que o pai dele era dono de um matadouro na zona de Sintra, no qual Cavalleri acabaria por ir trabalhar. O matadouro familiar, contudo, acabou por falir. E Alexandre foi trabalhar para outra empresa de carnes.

Fundou em 2010 a Iguarivarius, que estaria na origem, cinco anos depois, de um grupo empresarial detido maioritariamente pela sua holding, a Ribeiro Carvalho Cavalleri. “O que começou com uma empresa, desenvolveu-se este ano para um grupo empresarial a que chamamos Grupovarius, com a constituição de novas empresas”, lê-se no relatório e contas da Iguarivarius de 2016. Dentro deste grupo, existiam à data oito empresas — entre empresas de segurança (para se dedicar “à segurança de VIP especializados que venham a Portugal”, nas palavras do CEO da Iguarivarius ao Negócios), industriais (tintas Kenitex adquiridas à família de uma das cunhadas de Alexandre Cavalleri e que se encontrava em dificuldades económicas) e de consultadoria, entre outros objetos sociais.

A paixão pelos carros potentes

Do Grupo Varius fazia parte uma empresa chamada Racingvarius. E o que fazia esta sociedade? Disponibilizava carros desportivos de luxo para simulação de corridas no Autódromo do Estoril, que tem no seu ativo uma frota automóvel avaliada em mais de 1 milhão de euros.

O Observador teve acesso a uma proposta que esta empresa fez em 2018 a um cliente e a oferta é vasta, tal como mostra o site da empresa:

  • LamborghiniAventador (avaliado em 450 mil euros)
  • Lamborghini Huracán (237 mil euros)
  • Rolls Royce Phantom (520 mil euros)
  • Bentley Continental GT (250 mil euros)
  • Bentley Bentayga (294 mil euros)
  • Ferrari GTC4 Lusso (348 mil euros)
  • Ferrari 488 GTB (272 mil euros)
  • MacLaren Mp4 (carro anterior a 2011 com um valor na época de 260 mil euros)
  • Porsche 911 Turbo S (241 mil euros)
  • Aston Martin Rapid (281 mil euros)
  • BMW M4 (107 mil euros)
  • Porsche Cayman (85 mil euros)
  • E, entre outras viaturas, diversos Mercedes desportivos avaliados em mais de 100 mil euros cada um.

No total, a frota da Racingvarius está avaliada em cerca de 4 milhões de euros e algumas dessas viaturas eram utilizadas por Cavalleri no seu dia-a-dia. Uma das suas grandes paixões são os carros desportivos.

A Racingvarius tinha serviços diferentes, sendo que um dos pacotes que oferece aos seus clientes custa 15 mil euros e inclui carro, duas voltas no Autódromo do Estoril, coffee break, duas voltas e seguros. Esta empresa do Grupo Varius viu-se obrigada a reduzir a operação desde que a Venezuela começou a ter cada vez mais dificuldades financeiras para pagar a dívida que tinha para com o grupo de Alexandre Cavalleri.

Entre Ferrari, Porsche, McLaren, Rolls Royce, Bentley, Aston Martin e Lamborghini, Alexandre Cavalleri comprou vários destas marcas desportivas e criou uma empresa chamada Racingvarius. No total, a frota estava avaliada em cerca de 4 milhões de euros e algumas dessas viaturas eram utilizadas por Cavalleri no seu dia-a-dia.

A 12 de setembro de 2017, Alexandre Cavalleri escreveu a Nicolas Maduro e pedia, num estilo emocional, “com a mão no coração, que nos ajude sr. Presidente para que esta situação seja resolvida com urgência e da melhor maneira possível”. Estava em causa o pagamento de uma dívida superior a 30 milhões de dólares relativa a 2016 que veio a ser desbloqueado mais tarde.

A empresa tinha ainda um barco Sunseeker 34, que tem um valor de mercado de cerca de três milhões de euros.

Alexandre Cavalleri ficou também conhecido por estacionar uma pequena parte da sua vasta coleção de carros em frente ao seu barco Sunseeker na Marina de Vilamoura durante o mês de Agosto. A frota de carros e a embarcação, chamada “Brutus”, chamavam a atenção até por terem materiais de revestimento preto exatamente iguais.

A Venezuela o nascimento da Iguarivarius

Aos 48 anos, Alexandre é o mais velho de sete irmãos (dois rapazes e cinco raparigas). São todos praticantes de judo, mas o apelido Cavalleri consagrou-se neste desporto no nome da sua irmã, Filipa Cavalleri, que foi campeã nacional de judo e atleta olímpica (participou nos Jogos Olímpicos de Barcelona, Atlanta e Sidney) e chegou a alcançar o 3.º lugar na categoria – 57 kg no Campeonato do Mundo de 1995.

Por isso, as empresas de Alexandre Cavalleri chegaram a patrocinar a secção de judo do Sporting Clube de Portugal e a equipa de rugby do CDUL.

Mas foi o seu trabalho na empresa Montebravo que o catapultou. Foi no departamento comercial daquela empresa de distribuição de carnes que começou a visitar a Venezuela a partir de 2007. Quem o acompanhou nas viagens de negócio com a Montebravo diz que ele andou cerca de três anos a fazer o trabalho de casa, construindo uma rede de contactos com a base da administração venezuelana. “Esperto, proativo e dinâmico”, nas palavras de um empresário que participou nas mesmas viagens, Alexandre Cavalleri costumava levar presentes de cortesia para todos os seus contactos sempre que visitava a Venezuela — era assim que solidificava relações.

Alexandre Cavalleri com o general Lucas Ricon Romero, embaixador da Venezuela em Portugal desde 2006. Foto retirada do Facebook do Grupovarius)

A partir de determinada altura, e antes de serem realizados os primeiros contratos com os produtores portugueses, Cavalleri percebeu que podia fazer dinheiro criando a própria empresa. Uma empresa com um fim muito específico: concentrar em si os esforços de várias empresas interessadas em exportar, diminuindo os custos de exportação de cada uma delas. Cavalleri fazia assim nascer a Iguarivarius. Numa entrevista ao Jornal de Negócio, Cavalleri explicou mesmo que “começou a aglomerar posições em empresas em 2008, quando chegou à conclusão que não era fácil trabalhar em conjunto com outras sociedades”.

Fundou a Iguarivarius em 2010 e acabaria por formar, cinco anos depois, um grupo empresarial detido maioritariamente pela empresa de família, a Ribeiro Carvalho Cavalleri, e pela Raporal. “O que começou com uma empresa, desenvolveu-se este ano para um grupo empresarial a que chamamos Grupovarius, com a constituição de novas empresas”, lê-se no relatório e contas da Iguarivarius de 2016. Dentro deste grupo, existiam à data oito empresas.

A Iguarivarius começou por ser uma sociedade anónima a 18 de outubro de 2010 (um mês depois da sua constituição) com um capital de 55 mil euros em ações ao portador — o que significa que o acionista é aquele que detém as ações. Quase oito anos depois, a sociedade anónima continuava a ter ações ao portador, mas já com um capital social de 10 milhões de euros, após sucessivos aumentos — o que acaba por demonstrar a dimensão do seu balanço.

A estratégia de Cavalleri com a criação da Iguarivarius sempre foi clara: criar um intermediário entre produtores portugueses e as autoridades venezuelanas. Na prática, criar uma nova empresa que fosse um trader que comprasse o produto final aos produtores e o revendesse à Venezuela, assegurando o respetivo transporte.

A influência de Alexandre Cavalleri na Venezuela foi construída de baixo para cima, sendo que no seu período de ouro em Caracas era recebido por membros destacados do Governo de Nicolás Maduro, (muitas vezes sem o conhecimento da embaixada de Portugal em Caracas) e escrevia diretamente cartas a Nicolas Maduro.

Curiosamente, alguns que acompanharam este início da caminhada ainda numa fase pré-Iguarivarius não viam Alexandre Cavalleri como líder dessa futura empresa. “Não era nem nunca foi visto como um chief executive officer. Era essencialmente um comercial que sabia vender o seu peixe”, conta uma fonte que acompanhou de perto a criação da Iguarivarius.

A influência de Alexandre Cavalleri na Venezuela foi construída de baixo para cima, sendo que no seu período de ouro em Caracas era recebido por membros destacados do Governo de Nicolás Maduro (muitas vezes sem o conhecimento da embaixada de Portugal em Caracas) e escrevia diretamente cartas ao Presidente venezuelano quando existiam dificuldades no pagamento das faturas da Iguarivarius.

O Observador contactou em 2018 várias vezes Cavalleri, convidando-o para uma conversa sobre a história da Iguarivarius e a sua história enquanto empresário mas o porta-voz da empresa respondeu: “O Alexandre Cavalleri agradece a vossa proposta mas não vê qualquer interesse em dar uma entrevista ao Observador.” Também não houve qualquer resposta às mensagens enviadas ao próprio via Facebook.

A paixão pelo Sporting e as dívidas da Iguarivarius

O Facebook é, aliás, a rede social que mais utiliza para mostrar outra das suas paixões: o Sporting. Cavalleri é sócio do Sporting com o número 10.384 e, após o ataque à Academia de Alcochete, não hesitou em criticar o presidente Bruno de Carvalho.

Tenho uma enorme vergonha do actual momento e vejo um futuro muito negro”, disse através do Facebook do Grupovarius. O empresário ameaçou retirar os patrocínios à secção de judo do Sporting e não hesitou em responder um a um aos adeptos apoiantes do presidente que o criticavam ferozmente. Mas as suas respostas, algumas mais agressivas, foram entretanto eliminadas da rede social.

Pôs-se depois ao lado de Jaime Marta Soares para destituir o então presidente do Sporting e integrou a comissão de gestão por ele dirigida. Cavalleri ainda integrou a lista candidata à presidência do Sporting liderada por José Maria Ricciardi. Em setembro último voltou a tecer duras críticas à SAD e ao seu atual presidente, Frederico Varandas.

[Veja o vídeo onde Alexandre Cavalleri fala da candidatura de Ricciardi à sucessão de Bruno de Carvalho]

José Maria Ricciardi, entretanto, passou a ser o presidente do Conselho de Administração da GRPVRS Holding, SGPS, SA. Esta é holding do Grupo Varius. Já a Ribeiro Carvalho Cavalleri é a holding pessoal que Alexandre Cavalleri usa para controlar o Grupo Varius. Acossado com uma elevada dívida bancária e sem a liquidez de outrora que a Venezuela lhe proporcionava, Cavalleri pediu ajuda a Ricciardi, que, entretanto, fundou uma boutique de investimento com Jorge Tomé.

Ricciardi tem ajudado Cavalleri a renegociar a dívida com os bancos, sendo que a holding do Grupo Varius tem conseguido honrar os seus compromissos e reduzido muito significativamente o seu passivo bancário. De qualquer forma, Cavalleri tem agora que enfrentar a justiça.

Artigo atualizado às 14h27m de 1 de dezembro de 2019 com a retificação do nome da empresa da qual José Maria Ricciardi é chairman.

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