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Catarina Sarmento e Castro sucede a Francisca Van Dunem como ministra da Justiça
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Catarina Sarmento e Castro sucede a Francisca Van Dunem como ministra da Justiça

ANA MARTINGO/OBSERVADOR

Catarina Sarmento e Castro sucede a Francisca Van Dunem como ministra da Justiça

ANA MARTINGO/OBSERVADOR

Catarina, a promotora de consensos que vai gerir a Justiça

Filha de um ex-deputado do PS e do PCP, chumbou na sua primeira eleição para a juíza do Tribunal Constitucional, onde ficou conhecida por ser a magistrada que mais votou contra a austeridade.

Se António Costa não quer levantar ondas com o setor da Justiça, protegendo inclusive a sua imagem como ex-ministro do setor,  é difícil ter escolhido melhor. “Diplomata”, “simpática”, “promotora de bom ambiente e e de “consensos” — é assim que várias fontes que se cruzaram com Catarina Sarmento e Castro a descrevem.

Com uma carreira exclusivamente feita no setor público, Sarmento e Castro viu a sua carreira ficar manchada com uma primeira eleição falhada para o Tribunal Constitucional. Conhece António Costa desde os anos 90, na altura em que o aconselhou sobre a lei eleitoral, e foi eleita deputada na quota do secretário-geral do PS.

A nova ministra da Justiça chega a um setor com um perfil muito discreto e institucional mas sem que lhe conheça um pensamento público sobre o setor. Essa é a principal curiosidade dos principais agentes da Justiça sobre Sarmento e Castro: o que pensa a nova ministra sobre a Justiça?

Uma jurista da academia coimbrã e filha de dirigente da revolta estudantil de 1969

Catarina Teresa Rola Sarmento e Castro tem 51 anos, é casada e tem um filho com 17 anos. Nasceu na Marinha Grande, uma terra conhecida pela indústria vidreira onde o seu pai Osvaldo Castro criou raízes como funcionário e militante do Partido Comunista Português (PCP).

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Sarmento e Castro faz parte da academia de Coimbra. Foi ali, na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, que se licenciou em 1993, tendo começado a dar aulas como assistente na área do Direito Público (Direito Constitucional e Direito Administrativo). As memórias dos seus colegas indicam características que marcarão o seu percurso: uma estudante muito trabalhadora e com brio. Preferia os estudos às loucuras das repúblicas coimbrãs.

Catarina já tinha uma consciência política mais progressista mas sem grande intervenção pública num tempo, início dos anos 90, em que a contestação universitária ao cavaquismo marcava a atualidade política. Muito próxima do seu pai Osvaldo Castro, que tinha sido um importante dirigente da Associação Académica de Coimbra por volta da revolta da academia coimbrã de 1969, Catarina optou sempre pela discrição. E Osvaldo tinha um grande orgulho na sua filha

Catarina já tinha uma consciência política mais progressista e à esquerda mas sem grande intervenção pública num tempo, início dos anos 90, em que a contestação universitária ao cavaquismo marcava a atualidade política. Muito próxima do seu pai Osvaldo Castro, que tinha sido um importante dirigente da Associação Académica de Coimbra por volta da revolta da academia coimbrã de 1969, Catarina optou sempre pela discrição. E Osvaldo tinha um grande orgulho na sua filha.

“É um nome conceituado no mundo académico. Tem um conhecimento profundo do mundo da justiça por ter tido intervenção na área do Direito Administrativo, ter sido juíza do Tribunal Constitucional e ter passado pelo Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República. Tenho a convicção de que poderá introduzir reformas importantes no setor da Justiça”, afirma João Calvão da Silva, vice-reitor da Universidade de Coimbra, ao Observador.

Trabalhou com Costa nos anos 90 e foi eleita na quota do secretário-geral do PS

Com vários nomes apontados como sucessores de Francisca Van Dunem, com destaque para Alexandra Leitão, o nome de Catarina Sarmento e Castro acabou por surpreender. Apesar de ter sido juíza do Tribunal Constitucional, não é um nome muito conhecido no setor. Certo, contudo, é a sua proximidade a António Costa e outras pessoas próximas de Costa, com a ex-ministra Maria Manuel Leitão Marques e ao ex-secretário de Estado Fernando Rocha Andrade. Isto para não falar de João Gomes Cravinho, agora ministro dos Negócios Estrangeiros e que a levou para sua secretária de Estado no Ministério da Defesa.

O mais importante, contudo, terá sido a ligação a António Costa. Remonta à segunda metade dos anos 90, quando Costa era um jovem ministro dos Assuntos Parlamentares de António Guterres depois de se ter dado a conhecer à opinião pública como candidato do PS a Loures (com a rábula do Ferrari e do burro para evidenciar os problemas de trânsito). Costa queria reformar a lei eleitoral e foi através de um grupo de trabalho do qual fazia parte Catarina Sarmento e Castro e Rocha Andrade (os dois amigos e representantes da academia coimbrã) que o atual primeiro-ministro passou a defender a criação dos círculos uninominais.

Costa queria reformar a lei eleitoral nos anos 90 e foi através de um grupo de trabalho do qual fazia parte Catarina Sarmento e Castro que o atual primeiro-ministro passou a defender a criação dos círculos uninominais. Nas legislativas de janeiro, a jurista foi eleita como n.º 3 da lista do PS pelo círculo de Leiria por ali ter sido colocada na quota do secretário-geral do PS.

Foi desta essa altura que António Costa passou a acompanhar o trabalho de Sarmento e Castro, sendo certo que acabou por ser eleita como n.º 3 da lista do PS pelo círculo de Leiria por ali ter sido colocada na quota do secretário-geral do PS.

Além de ter colaborado com Costa, a nova ministra da Justiça foi igualmente adjunta em 2007 da então secretária de Estado da Modernização Administrativa do Governo Sócrates. Maria Manuel Leitão Marques conhecia Catarina desde a sua juventude (casada com Vital Moreira, importante ex-dirigente do PCP, era amiga de Osvaldo Castro e da sua mulher) e convidou-a para um trabalho curto que passava pela colaboração com OCDE na área da digitalização.

A área do Direito Digital é, aliás, a sua área de estudo enquanto investigadora universitária. A sua tese de doutoramento na Universidade de Coimbra, concluído em 2019, foi precisamente focada na digitalização e intitula-se: “A Administração Pública, novas tecnologias e as implicações no procedimento, no ato e na organização administrativos”

“A OCDE gostou muito do seu trabalho e convidou-a mais tarde para uma colaboração externa. A Catarina é uma pessoa muito trabalhadora, muito criativa e com muita determinação. Quando pega numa tarefa, tem brio. Faz bem e com profissionalismo. Não é uma pessoa medrosa”, afirma ao Observador.

A polémica do chumbo no Parlamento para o Constitucional

Ainda antes de trabalhar com Maria Manuel Leitão Marques, futura ministra da Presidência e da Modernização Administrativa de António Costa, Catarina Sarmento e Castro foi assessora de Luís Nunes Almeida, o malogrado presidente do Tribunal Constitucional que, em termos políticos, partilhava com António Costa o mesmo grupo político no PS: eram importantes apoiantes de Jorge Sampaio.

O trabalho como assessora do presidente do Tribunal Constitucional foi muito importante para perceber os mecanismo do tribunal e para evoluir em termos de conhecimento do pensamento constitucional português.

Foi em 2009 que surgiu a hipótese de ser indicada para juíza do Tribunal Constitucional. O conselheiro Mário Torres, ex-procurador-geral adjunto ligado ao PCP que tinha sido uma figura relevante no Ministério Público, jubilou-se. Torres tinha sido precisamente indicado pelos comunistas para o Constitucional, no contexto de um acordo histórico entre o PS e o PSD.

Foi em 2009 que surgiu a hipótese de ser indicada para juíza do Tribunal Constitucional. O conselheiro Mário Torres, ex-procurador-geral adjunto indicado pelo PCP, jubilou-se. Mas o primeiro-ministro José Sócrates não deixa que os comunistas indiquem o substituto. É precisamente Catarina Sarmento e Castro que é indicada pelo PS.

O acordo era simples: da lista de dez juízes para o TC eleitos pelo Parlamento, o PS e o PSD tinham uma prática constitucional de deixar que os seus partidos mais à esquerda (PCP) e à direita (CDS) indicassem dois candidatos. Todos eram eleitos em listas conjuntas. Quando Mário Torres se jubila, o primeiro-ministro José Sócrates rasga o acordo e não deixa que o PCP indique o substituto. É precisamente Catarina Sarmento e Castro que é indicada pelo PS.

Um pormenor relevante: Osvaldo Castro é o presidente da 1.ª Comissão dos Assuntos Constitucionais, onde toda esta matéria foi discutida. O que acrescentou gasolina à fogueira, pois o conflito de interesses era evidente. Na hora de votar no plenário o nome de Catarina, Osvaldo pediu escusa.

Certo é que o nome da atual ministra da Justiça foi chumbado a 12 de dezembro de 2009. Dos 230 deputados, apenas 139 votaram a favor, 67 votaram em branco e 10 votos foram considerados nulos. Foi a primeira vez que o Parlamento chumbou um candidato a juiz do TC. Um mês depois, Catarina Sarmento e Castro conseguiu a aprovação com 156 votos a favor.

A juíza anti-austeridade

A sua chegada ao Palácio Ratton não foi bem acolhida por todos. Além de fragilizada pela polémica do primeiro chumbo, Catarina Sarmento e Castro fugia um pouco ao padrão da professora universitária-com- doutoramento-em Direito-que-chega-a-juíza-do-Constitucional.

Apenas tinha um mestrado e o seu trabalho ciêntifico gerou críticas internas, talvez por ter apostado na digitalização — que não era propriamente uma área muito consensual naquela época.

Certo é que o seu mandato como juíza do TC ficou marcado pelos anos da troika. O Governo de Passos Coelho era obrigado a aplicar o memorando da troika, indo, inclusive, mais além do que tinha sido acordado com o Fundo Monetário Internacional, com a Comissão Europeia e com o Banco Central Europeu — e os chumbos do TC a diplomas estruturantes não se fizeram esperar.

Juízes mais desafinados à direita do que à esquerda no TC

Catarina Sarmento e Castro destacou-se claramente como a juíza conselheira mais anti-austeridade de todo o elenco do Palácio Ratton. Num trabalho publicado pelo Observador, constatou-se que a nova ministra da Justiça tinha chumbado 86,7% dos 16 principais diplomas do Governo apresentados pelo Governo de Passos Coelho (e necessários para executar o memorando de entendimento com a troika) que foram sujeitas a apreciação de constitucionalidade pelo TC.

Talvez por isso a fundamentação dos seus votos fosse vista pelo Governo de Passos Coelho como mais política do que jurídica. Além disso, Sarmento e Castro era vista internamente no TC como alguém que era uma correia de transmissão do PS.

Dois anos depois de ter tomado posse como juíza do TC, recebeu a notícia mais triste da sua vida: a morte de Osvaldo Castro, vítima de doença prolongada. Muito próxima do seu pai, foi a própria Catarina a escrever a nota à imprensa sobre as cerimónias fúnebres e a informar a Agência Lusa.

Os desafios da Justiça

Catarina Sarmento e Castro chega um setor que teve o privilégio de ter tido uma estabilidade invejável. Se retirarmos da equação o efémero segundo Governo Passos Coelho, entre 2011 e 2022 a Justiça só conheceu na prática duas ministras: Paula Teixeira da Cruz e Francisca Van Dunem.

Uma estabilidade que não só nasce do facto de os titulares da pasta cumprirem os mandatos completos mas também pelo facto de Van Dunem não ter feito nenhuma contra-reforma face às alterações promovidas por Teixeira da Cruz em todas as jurisdições.

Os desafios, contudo, são muitos. Desde logo os tempos absolutamente impensáveis de resolução da jurisdição administrativo-fiscal. Entre os 927 dias em média da primeira instância, os 1.105 dias na segunda instância e os 363 dias do Supremo Tribunal Administrativo, os tempos médios de resolução fazem a Justiça portuguesa corar de vergonha face aos restantes estados-membros da União Europeia. Uma reforma profunda desta área tem sido exigida pelos agentes judiciários e pelos partidos políticos e será, certamente, uma prioridade.

Fernando Medina. “Novas Oportunidades” no passado e agora

Sendo a digitalização uma das áreas de estudo de Sarmento e Castro, a continuidade do trabalho de Anabela Pedroso (atual secretária de Estado de Van Dunem nessa área) será a palavra de ordem. A nova ministra deverá fazer uma forte aposta nessa área.

O maior desafio passa claramente por conseguir um reforço do orçamento do Ministério da Justiça junto do novo ministro das Finanças (Fernando Medina), algo difícil para quem tem pouco peso político.

Existe ainda expetativa para perceber qual o seu pensamento sobre a Estratégia Nacional Contra a Corrupção — uma das grandes marcas do mandato de Francisca Van Dunem — e que ideias novas trará para resolver os estrangulamentos do financiamento do combate ao crime-económico financeiro e ao crime informático. O seu perfil de promover consensos (“não para promover a inércia, mas sim a decisão”, diz Maria Manuel Leitão Marques) poderá ajudar a nova ministra a encontrar as melhores soluções.

O perfil de Catarina Sarmento e Castro de promover consensos ("não para promover a inércia, mas sim a decisão", diz a ex-ministra Maria Manuel Leitão Marques) poderá ajudar a nova ministra a encontrar as melhores soluções para o setor da Justiça.

“A dra. Catarina Sarmento e Castro tem capacidade e perfil para promover mudanças numa área tão importante como a Justiça. Tem de ter uma agenda ambiciosa para tentar executar o maior número possível de objetivos. Já lá estive e sei que no final é que veremos o que conseguimos concretizar”, afirma a ex-ministra Maria Manuel Leitão Marques.

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