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A temperatura do debate público sobre alterações climáticas tem vindo a aumentar a um ritmo muito mais rápido do que a temperatura média da Terra. O assunto do aquecimento global entrou na agenda mediática há cerca de 30 anos, com a assinatura do Protocolo de Kyoto, mas levou tempo a conquistar lugar na mente do cidadão comum. O tema receberia forte impulso em 2006, com a estreia do documentário Uma verdade inconveniente, de Al Gore (vice-presidente de Bill Clinton e candidato derrotado nas eleições presidenciais de 2000), e com as subsequentes tournées mundiais – mais de um milhar de palestras (principescamente remuneradas) – que Gore empreendeu para o divulgar. Porém, a atenção dos governantes e das massas foi desviada, em 2007, pelo estoiro da “bolha” das hipotecas subprime nos EUA, cujos estilhaços espoletaram a crise das dívidas soberanas na Europa, que se prolongou até meados da década seguinte. Com a assinatura, em 2015, do Acordo de Paris (uma admissão implícita de que o Protocolo de Kyoto não fora levado a sério pelos seus signatários), as alterações climáticas entraram no léxico corrente dos cidadãos do mundo desenvolvido, sem, contudo, conseguir inflamar o seu empenho e mobilização. Por mais pertinentes que sejam os seus alertas e por mais sólidos que sejam os seu argumentos, cientistas e tecnocratas têm dificuldade em cativar a atenção das massas e seria precisa a entrada em cena, em 2018, de Greta Thunberg para que as alterações climáticas fossem tomadas a sério fora do círculo restrito das organizações ambientalistas.

Greta Thunberg tinha apenas 15 anos quando iniciou a sua “greve pelo clima” (Skolstrejk för Klimatet), em frente ao edifício do Parlamento sueco, e não trazia consigo dados novos sobre o degelo dos glaciares, mas a sua aura de santinha visionária inflamou as mentes e gerou uma reviravolta, se não nas atitudes e nas medidas efectivas, pelo menos no discurso público sobre alterações climáticas. A maioria dos cidadãos do mundo desenvolvido passou a colocar estas no topo das suas preocupações (quando respondem a inquéritos ou são entrevistados na rua, não tanto nas escolhas quotidianas e estilo de vida); os governantes e líderes políticos (com excepção do segmento mais à direita no espectro) ganharam o hábito de polvilhar generosamente os seus discursos com as palavras “descarbonização”, “sustentabilidade” e “biodiversidade” (ainda que nem todos compreendam estes conceitos e as suas implicações); as empresas, independentemente de distribuírem gás, fabricarem refrigerantes ou providenciarem cruzeiros marítimos, entraram em competição para transmitirem a impressão de serem mais “verdes” do que as suas rivais e reivindicaram como seus principais desígnios, não a venda de produtos e serviços, mas a salvação dos pandas-gigantes, dos ursos polares, da Amazónia e da Grande Barreira de Coral Australiana; as estrelas do showbiz começaram a fazer prelecções às massas ignaras sobre como deveriam levar uma vida mais frugal e sustentável, ainda que elas mesmas levem a vida de dissipação (ver Urinar no duche não adia o fim do mundo); e os media passaram a acompanhar as Conferências das Nações Unidas Sobre Alterações Climáticas (COP) e as suas deliberações com a febricitação que usualmente estava reservada à eleição de um novo papa ou aos sorteios do calendário de jogos da Champion’s League.

O presidente Joe Biden discursa na COP-27, em Sharm el-Sheikh: Hoje são raros os países que não se fazem representar ao mais alto nível nas COPs, sinalizando o seu (suposto) empenho na resolução da crise climática

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