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Delação premiada: mitos e narrativas

A delação premiada já existe no quadro jurídico português. Mas a sua aplicação aos casos de corrupção depende de pressupostos que a inviabilizam. Ensaio de Nuno Gonçalo Poças.

A discussão entrou na ordem do dia, em Portugal, graças à Operação Lava-Jato, no Brasil. Desde então, a delação premiada tem sido muito comummente apresentada no debate público como um enorme perigo ao sistema judicial democrático. Com a vontade expressada pelo Governo relativamente ao alargamento da justiça negociada para combater a corrupção, o tema ganhou novo fôlego, mas mais uma vez debaixo de uma tremenda confusão no debate público, que num mesmo discurso mistura bufos da PIDE com corrupção, que confunde delação premiada com plea bargaining, que inclui direito premial e perseguições políticas. O debate, salvo raras excepções, não tem ajudado ao esclarecimento. E, antes que avancem quaisquer decisões políticas (e não meros anúncios ou declarações de intenção), é fundamental tirar dúvidas e aperfeiçoar um instituto fundamental no combate à corrupção. E, claro, não é menos essencial tomar uma posição que traga ao nosso ordenamento jurídico uma solução que não seja justicialista (como alguns pretenderão), mas que também não deixará tudo como está (como pretendem outros). Certo, certo é que é preciso fazer alguma coisa em matéria de combate à corrupção. Será a delação premiada uma boa forma de o conseguir?

“Delação premiada” vs. “colaboração” premiada

Entre “delação premiada” e “colaboração premiada”, talvez a segunda seja a melhor expressão para definir o que realmente se pretende abordar. Colaborar envolve cooperação; delação implica delatar, acusar, dar conhecimento a outrém da prática de um delito que se conheceu em primeiro lugar. Na verdade, as expressões confundem-se, vivem muitas vezes lado a lado, e a distinção entre uma e outra será mais útil para afastar fantasmas jurídicos do que para tratar objectivamente o tema.

Do que realmente se trata aqui é de obter confissões da prática de crimes por um autor que, por sua vez, denuncia mais intervenientes na prática desses mesmos crimes. Ou seja, de tratar juridicamente alguém que confessa a sua participação mas que também revela a participação de outros, facultando às autoridades meios de prova, nomeadamente documental, que ajudem ao apuramento da verdade material e, se for caso disso, a condenar os agentes envolvidos na prática do crime. A colaboração premiada trata-se, então, de facultar ao arguido um prémio (uma atenuação de pena, por exemplo) pela sua colaboração com a justiça.

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A “delação premiada” é um conceito que tem servido mais para confundir do que para esclarecer. Veremos adiante mais aprofundadamente como funcionam os mecanismos de direito premial noutros países, mas trate-se já de sublinhar que, para o caso, “delação” ou “colaboração” premiada poderão até ser tratadas da mesma forma. Assim, não é tanto o nome que lhe queiram dar – é o conteúdo do que se pretende legislar, ou não, que está aqui em causa.

A “delação premiada” é um conceito que tem servido mais para confundir do que para esclarecer. Veremos adiante mais aprofundadamente como funcionam os mecanismos de direito premial noutros países, mas trate-se já de sublinhar que, para o caso, “delação” ou “colaboração” premiada poderão até ser tratadas da mesma forma. Assim, não é tanto o nome que lhe queiram dar – é o conteúdo do que se pretende legislar, ou não, que está aqui em causa. E há, de facto, uma distância grande entre o que existe no sistema brasileiro ou americano e aquele por cuja implementação em Portugal bastantes vozes se têm erguido.

Delação premiada: uma novidade em Portugal?

Depois de a ministra da Justiça ter avançado com a intenção de aprofundar o mecanismo da colaboração premiada, enquanto elemento fundamental de uma estratégia de combate à corrupção, foram várias as vozes, como aqui lembrou Luís Rosa, que se levantaram contra a apologia da mentira ou do espírito do bufo que a proposta traria. É importante esclarecer o erro em que assenta esta interpretação.

O direito premial não é uma novidade no direito penal, mesmo no português. A colaboração premiada com a justiça é um objectivo avançado pelo Conselho da Europa há mais de trinta anos e as Nações Unidas já o deixaram expresso na convenção contra a criminalidade organizada, de 2000, e na convenção contra a corrupção, de 2003. Mesmo no ordenamento jurídico português, o direito premial dificilmente pode constituir uma surpresa. É verdade que, em Portugal, não existem mecanismos que privilegiem a colaboração com a justiça na fase de investigação mas, em julgamento, confessando a prática do crime, o arguido pode beneficiar de uma atenuação da pena. Como já explicou, em 2015, o procurador Rui Cardoso, “devia-se começar a estudar um regime que pense também nos casos em que o arguido colabora na investigação”. Ou seja, o arguido, agente do crime, pode, em julgamento, ver a sua própria pena atenuada caso confesse os factos por si praticados. Mas não tem qualquer incentivo para demonstrar que outros arguidos, ou até outros suspeitos, praticaram crimes de menor, igual ou maior gravidade. O enquadramento actual é, por isso, um convite aos pactos de silêncio.

Mas estaremos assim tão fora do quadro da colaboração premiada, em relação a outros países, como tantas vezes se quer fazer crer? Vejamos.

Relativamente ao crime de branqueamento, o n.º 9 do artigo 368.º-A do Código Penal prevê um prémio ao praticante do crime pela colaboração com a justiça, prevendo-se uma atenuação especial da pena se “o agente auxiliar concretamente na recolha de provas decisivas para a identificação ou captura dos responsáveis pela prática dos factos ilícitos típicos de onde provêm as vantagens”.

Rui Pinto é um dos casos em que mais se tem falado na possibilidade de colaboração com as autoridades

AFP via Getty Images

Na prática do crime de corrupção activa, previsto no artigo 374.º-B do Código Penal, o agente pode ser dispensado de pena se tiver denunciado o crime no prazo máximo de trinta dias após a prática do acto e sempre antes da instauração do procedimento criminal. Além disso, a pena pode ser especialmente atenuada se o agente, até ao encerramento da audiência de julgamento em primeira instância, auxiliar concretamente na obtenção ou produção das provas decisivas para a identificação ou a captura de outros responsáveis, o que constitui, na prática, um convite ao praticante de um crime à colaboração com a justiça, obtendo com isso um tratamento menos desfavorável – o que até pode ser entendido como uma real negociação da pena.

Também na legislação de combate ao tráfico de estupefacientes se prevê atenuação ou dispensa de penas se as mesmas condições se verificarem: se o agente auxiliar concretamente as autoridades na recolha de provas decisivas para a identificação ou captura de outros responsáveis.

Portanto, como se demonstra, o direito premial não é novidade em Portugal. Mas a questão é mais complexa quando está em causa a corrupção. Por exemplo, será suficiente oferecer ao praticante de crime de corrupção activa a denúncia no prazo de trinta dias após a prática do acto, antes da instauração do procedimento criminal? À partida, parece improvável que o seja: a corrupção é um crime com uma vítima não concretamente identificável, alimenta-se dos pactos de silêncio celebrados entre todos os praticantes do crime, e é um fenómeno transnacional e cada vez mais suportado por complicados mecanismos informáticos, financeiros e legais. Noutro exemplo, será suficiente que a lei portuguesa preveja algum tipo de prémio pela colaboração apenas para quem colaborou inicialmente com o acto corruptivo e exclua terceiros? Concretamente, porque não pode um terceiro que, tendo praticado um crime diverso para obtenção de prova documental da prática de um crime de corrupção, ser também premiado, através da atenuação especial da sua pena, pela colaboração com as autoridades (caso de Rui Pinto)? Porque se espera que o praticante do crime de corrupção se arrependa nos trinta dias após a prática do acto e antes da instauração do procedimento criminal se é mais provável que esse arrependimento se venha a revelar numa fase posterior e, com maior probabilidade ainda, quando já tem contra si aberto um procedimento criminal?

Ou seja, embora a delação premiada já exista no quadro jurídico português, actualmente a sua aplicação aos casos de corrupção depende de pressupostos que a inviabilizam e a torna improvável e pouco útil.

Há mesmo uma questão constitucional?

A figura da colaboração ou da delação premiada tem levantado várias dúvidas no debate público. A mais importante de todas é a que se relaciona com o nosso texto constitucional. Que princípios podem, afinal, estar em causa? Vejamos ponto a ponto.

O princípio da legalidade. O princípio é incontestável num Estado de Direito e visa garantir que os cidadãos se podem defender de forma justa e eficaz, e que a acção processual deve estar vinculada à lei. É por isso que a colaboração do arguido com as autoridades deve ser acompanhada de investigação séria e legal, independentemente do prémio que o arguido venha a ter pela colaboração (a suspensão provisória do processo, o arquivamento em caso de dispensa de pena, a atenuação especial da pena, a suspensão da pena, etc.). E é por isso que a decisão última sobre o prémio a conferir ao arguido pela sua colaboração é uma decisão judicial, proferida por um juiz. Ou seja, a colaboração não se pode equivaler à celebração de acordos entre a entidade acusadora, o Ministério Público, e o arguido. Se estas condições se verificarem, não há conflito com o princípio da legalidade.

O princípio da igualdade. Tem sido adiantado que o princípio da igualdade, pilar fundamental do Estado de Direito, pode estar em causa quando se atribui um benefício ao arguido denunciante ou colaborar, em detrimento dos outros arguidos. Não creio que seja um receio justificado. É verdade que o princípio da igualdade proíbe o tratamento distinto de situações iguais, mas também proíbe o tratamento igual para situações desiguais. O arguido que colabora com a justiça não está em situação igual, no processo penal, à do arguido que não colabora – tal como o arguido que confessa não é igual ao arguido que não confessa; o arguido que se arrepende não é igual ao arguido que não mostra arrependimento. O importante a garantir é que o tribunal possa avaliar os benefícios conferidos ao processo pela colaboração de um arguido, de forma a que a lei garanta a igualdade, que deverá ser avaliada em função dos factos, das circunstâncias e das condições de cada caso concreto.

O arguido que colabora com a justiça não está em situação igual, no processo penal, à do arguido que não colabora – tal como o arguido que confessa não é igual ao arguido que não confessa; o arguido que se arrepende não é igual ao arguido que não mostra arrependimento.

O princípio do contraditório. É um princípio fundamental no nosso modelo processual penal e que também tem sido visto como um grande entrave ao aprofundamento dos mecanismos de colaboração premiada no nosso ordenamento jurídico. Mas não se apresenta como obstáculo: é possível garantir que a prova documental oferecida por aquele que colabora com a justiça seja contraditada em audiência de julgamento.

Conclusão? Já aqui esclareci, em parte, o que é essencial assegurar quando se aborda este tema da delação premiada e, sobretudo, quando o mesmo for transposto para o nosso ordenamento, sem colidir com o texto constitucional. Repito-o: “A instituir-se a figura da delação premiada no combate à criminalidade económico-financeira, não se percam de vista alguns pontos essenciais para que os méritos do nosso sistema processual penal não sejam beliscados: em primeiro lugar, que a mera delação, por simples testemunho, não pode chegar, não pode ser dispensada a investigação, a reprodução de prova documental e o cruzamento com outros meios de prova. Em segundo lugar, que ao arguido seja mantida a faculdade de contrariar os factos resultantes da colaboração premiada. Por fim, que a mera delação sem suporte probatório (ou que a investigação venha a concluir ser falsa) não coloque em causa a aplicação do regime da denúncia caluniosa.”

Que modelos existem lá fora?

Os modelos mais consensualmente recusados em Portugal têm sido o americano e o brasileiro. Mas existem outros. Como configuraram outros ordenamentos a figura da colaboração premiada? O que podemos aprender, de bom e de mau, de forma a que possamos aprofundar o instituto em Portugal?

Estados Unidos. A tão mencionada figura do plea bargaining, que não existe deste lado do Oceano Atlântico, é, resumidamente, um sistema de negociação da culpa declarada. Trata-se de um acordo efectuado entre o Ministério Público e o arguido, através da sua defesa, sendo que este último declara aceitar-se como culpado das acusações contra si deduzidas, devendo fornecer informações que detenha sobre os co-arguidos e a prática do crime. A negociação torna-se válida assim que ambas as partes cheguem a acordo e tem como prémio legal a redução da medida da pena proferida em sentença condenatória. Na prática, o arguido pode beneficiar de uma acusação por um crime menos grave, por exemplo, oferecendo em troca a confissão da sua culpa.

Trata-se, na verdade, de um modelo popular mas que tem recebido imensas críticas, uma vez que muitas vezes os arguidos, apesar de inocentes, acabam por declarar a sua culpa para que possam obter um tratamento mais favorável por parte da acusação e do juiz — evitando um processo que pode ser demorado, os custos associados e a exposição mediática, além de evitar o risco de uma condenação mais severa que aquela que pode obter com a negociação. É, efectivamente, um problema sério: de acordo com um estudo realizado a centenas de arguidos que negociaram a sua condenação, mais de 50% estariam inocentes e só o fizeram para não serem alvo de processo judicial. É um modelo que se tem tornado regra, que aprofunda a desigualdade nas penas aplicadas e que confere ao Ministério Público o monopólio, sem fiscalização judicial, das condenações. Mas também é um mecanismo célere e que, muitas vezes, se torna benéfico para os próprios arguidos, que acabam por cumprir penas menos severas do que aquelas a que poderiam ser condenados caso o processo fosse a julgamento. É, contudo, um mecanismo incomportável para a nossa realidade jurídica: a confissão é entre nós um meio de prova e não se equipara a uma decisão judicial definitiva.

Brasil. Foi graças à Operação Lava-Jato que a delação premiada ganhou relevância no debate público e tem sido o modelo que mais celeuma tem levantado, muitas vezes acusado de ser violador de direitos fundamentais e de fomentar condenações sem provas, com base exclusivamente na denúncia. Como funciona, afinal, a delação premiada no Brasil?

A legislação de combate ao crime organizado é dotada de vários mecanismos de investigação, e um deles é o da colaboração premiada como forma de obtenção de meios de prova. Note-se, porém, que a confissão por parte do arguido é essencial para que o mesmo assuma a figura de colaborador, e que o prémio pela colaboração só lhe é concedido se oferecer provas ao processo, pelo que a mera confissão não bastará. Ou seja, exige-se também que da sua colaboração resultem provas que possibilitem a fundamentação de uma decisão judicial.

Marcelo Odebrecht, um dos homens que "falaram" na operação Lava Jato

HEDESON ALVES/EPA

No Brasil, a acusação e a defesa podem celebrar um acordo, com base na confissão do arguido, que será homologado judicialmente e que constituirá prova do processo. Mas no processo de negociação, que antecede a homologação por juiz, há várias regras a respeitar. Uma delas é a necessidade de corroborar a colaboração prestada pelo arguido com elementos de prova que confirmem as declarações, pelo que não se afastam outros meios de prova. Outra é a de que os acordos devem ser realizados com criminosos de menor importância penal.

A participação do juiz no processo é feita numa fase inicial, para homologação do acordo, mas também a final, para aplicação concreta dos benefícios ao colaborador, depois verificada a legalidade do acordo. E mesmo na fase da homologação, não podem ser validados os acordos que estabelecem redução de penas em concreto, uma vez que é ao juiz que cabe a aplicação do prémio a conferir ao colaborador, e que se poderá traduzir na sua absolvição ou na redução da pena aplicada. Trata-se, na verdade, de um mecanismo susceptível de colmatar as falhas do Estado na obtenção de provas consistentes, o que favorece o combate ao crime organizado e à corrupção. Fundamental, e a lei brasileira prevê-o, é que a colaboração seja confirmada através de elementos de prova suficientes para garantir a condenação de agentes do crime mais poderosos ou hierarquicamente superiores aos do colaborador.

Itália. A colaboração premiada, em Itália, ganhou força a partir dos anos 70 do século passado, com o intuito de combater a máfia e a criminalidade altamente complexa que lhe era associada. Já em 1991, os italianos reconheceram que a máfia e o terrorismo associado se tratavam de actos de difícil combate, pelo que se tornava imperativo obter informações de agentes que faziam parte dessas organizações, o que veio a provocar um aumento de arrependidos e colaboradores em busca de benefícios penais, como aconteceu com a Operação Mãos Limpas.

No ordenamento italiano são conhecidas três figuras: a do arrependido, a do dissociado e a do colaborador. E também nele é exigido que a declaração do arguido cooperante seja acompanhada de outros elementos de prova, para garantia do exercício do direito ao contraditório, além de que a colaboração do arguido deve ser voluntária e consciente, envolvendo a participação de um juiz na homologação dos acordos celebrados entre aquele e a acusação.

Alemanha. Desde a década de 70 do século passado que se celebra uma espécie de acordo informal, através do qual o acusado confessa o crime e, com essa confissão, obtém uma vantagem quanto à pena aplicada. O Tribunal Constitucional alemão decidiu aceitar esses acordos e veio, então, a estabelecer-se a regra da necessidade da confissão do arguido, num quadro normativo que abrange a prática de crimes de terrorismo, lavagem de dinheiro, corrupção ou pornografia infantil, e que rejeita a negociação formal. O que o tribunal pode fazer é atenuar ou dispensar a pena se a confissão, por parte do arguido, feita voluntariamente, contribuir para a descoberta de factos relevantes, podendo mesmo o titular da acção penal arquivar o processo se o acusado prestar informações para permitir a chamada à acção penal de outros autores do crime. Note-se, também, que a possibilidade de extinção da pena só é possível para crimes com penas inferiores a três anos.

O que concluir? Duas ideias-chave a reter

Em primeiro lugar, a colaboração premiada não é uma novidade entre nós. Na verdade, novidade é apenas o contexto: a sua aplicação só se tornou uma questão de grande debate público e de grandes clivagens filosófico-jurídicas a partir do momento em que se começou a discutir a institucionalização do mecanismo junto da chamada criminalidade de colarinho branco. O debate centrou-se, então, num prós e contras sem meio termo ou ponderação.

Assim, o que importa discutir não é se deve ou não existir “delação” ou “colaboração” premiada, porque já existe, mas sim a adequação do seu actual enquadramento no combate a crimes mais complexos, como os de corrupção. E, para essa discussão, não faltam opções: o mecanismo da colaboração premiada não é único, varia de país para país, assume diversas componentes, e cabe-nos, face ao que conhecemos e ao que já dispomos, optar pelo regime que mais se adequa à nossa realidade constitucional. Isto porque, se o debate for feito de boa fé, podemos assumir desde logo algo essencial: que a colaboração premiada é um mecanismo importante no combate à corrupção e que a sociedade exige, hoje mais que nunca, que esse combate seja feito. Portanto, exige que as autoridades políticas e judiciais respondam a essa necessidade dentro de um quadro de normalidade democrática e constitucional.

A colaboração premiada é um mecanismo importante no combate à corrupção e a sociedade exige, hoje mais que nunca, que esse combate seja feito. Portanto, exige que as autoridades políticas e judiciais respondam a essa necessidade dentro de um quadro de normalidade democrática e constitucional.

É por isso que faz sentido falar-se em extinguir o prazo de 30 dias para que alguém possa arrepender-se de um acto de corrupção por si praticado, confessar e denunciar terceiros e que apresente prova documental que sustente essa denúncia. E que, preenchidos todos estes pressupostos, possa acordar com a acusação uma pena inferior à que teria sem o acordo, com determinação de um mínimo e um máximo, ou até a dispensa de pena, num acordo que seja homologado por um juiz. Excluindo toda a confusão que se tem gerado, parece ser isto que está em causa – e é o que faz sentido em Portugal.

Em segundo lugar, há uma outra discussão a fazer que tem ficado esquecida. Relembre-se a questão da protecção de denunciantes, que não pode ser, em termos de ordenamento jurídico, desassociada do tema da delação premiada. É essencial que o quadro normativo preveja a protecção daquele que, fazendo parte da organização e tomando conhecimento de factos ilícitos de boa fé, denuncia esses factos às autoridades. É esse mecanismo de protecção que pode permitir ao Estado ficar menos dependente dos praticantes de crimes que se venham a arrepender ou que simplesmente denunciam outros crimes de natureza mais grave.

No entanto, face à realidade dos dias de hoje e aos desafios que vão surgindo e de cuja realidade o Direito parece sempre afastado, por manifesto atraso nas respostas, parece fundamental discutir, por exemplo, se aquele que denuncia de má fé, não podendo beneficiar do estatuto de denunciante nos termos mais estritos, pode beneficiar de mecanismos de colaboração premiada. Isto é, se aquele que, tendo obtido, ainda que de forma ilegítima ou criminosa, informação sobre a prática de ilícitos graves e especialmente danosos do interesse público ou privado, e de natureza diversa dos por si praticados, pode, confessando livre e voluntariamente os seus crimes, beneficiar de uma atenuação ou dispensa de pena. Parece claro que sim. E é cada vez mais difícil argumentar contra esta possibilidade.

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