790kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

Empresa de Pedro Nuno Santos e do pai fez contrato com o Estado. Lei prevê demissão, ministro defende-se com parecer antigo da PGR

Empresa detida pelo pai de Pedro Nuno Santos e pelo próprio fez um contrato público. Lei prevê demissão. Ministro defende-se com parecer da Procuradoria sobre lei anterior.

Uma empresa detida, em conjunto, pelo ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, e pelo pai (a Tecmacal), beneficiou de um contrato público por ajuste direto, o que constitui uma incompatibilidade de acordo com a lei que estabelece o regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos. A sanção prevista na lei para os casos em que um titular de cargo político detém mais de 10% de uma empresa em conjunto com um “ascendente” e faz um contrato público é a demissão.

O ministério de Pedro Nuno Santos, em resposta ao Observador, considera que não existe nenhuma incompatibilidade, escudando-se num parecer da Procuradoria-Geral da República. Mas esse parecer foi feito em relação à anterior lei de incompatibilidades e impedimentos (de 1993). Mais: distingue os casos em que as empresas são dos titulares dos cargos e aquelas em que as sociedades são apenas propriedade de familiares. O parecer em causa não aborda a situação que se verifica neste caso, em que o titular do cargo e o familiar têm ambos participações: Pedro Nuno Santos só tem 1% da empresa, mas, em conjunto com o pai — que tem 44% — e outros familiares ultrapassa em muito os 10% apontados na lei.

Há pouco mais de três meses, no dia 27 de junho de 2022, o Centro de Formação Profissional da Indústria de Calçado — uma entidade pública reclassificada com sede em São João da Madeira, concelho de origem de Pedro Nuno Santos e de onde a família é originária — fez um ajuste direto com a Tecmacal no valor de 19.110,00 euros para compra de equipamentos no setor da marroquinaria.

A atual lei n.º 52/2019 — no artigo referente aos “impedimentos” — diz que “as empresas em cujo capital o titular do órgão ou cargo detenha, por si ou conjuntamente com o seu cônjuge, unido de facto, ascendente e descendente em qualquer grau e colaterais até ao 2.º grau, uma participação superior a 10  por cento” não podem “participar em procedimentos de contratação pública”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

De acordo com o registo comercial, consultado pelo Observador, o pai do ministro das Infraestruturas, Américo Augusto dos Santos, detém uma percentagem de 44% da empresa Tecmacal, enquanto o próprio ministro aparece com 0,5%. Segundo a declaração de rendimentos entregue pelo ministro no Tribunal Constitucional, era de 1% a 28 de junho de 2022. Isto significa que o ministro tem mais de 10% de uma sociedade “conjuntamente” com um ascendente — o que faz com que a empresa fique impedida de fazer contratação pública. A isto — de acordo com o relatório estrutural do diretório E-informa, feito com base em informação cedida pela empresa — ainda ter-se-á que ter em conta uma percentagem da mãe do ministro, que tem 5%, e da sua irmã, a quem é atribuído nesse documento igualmente 0,5%. Os restantes sócios da empresa são da família Laranjeiro, que, de acordo com as últimas informações disponibilizadas pela sociedade, são donos da outra metade da empresa.

O contrato público em causa é assinado pelo pai de Pedro Nuno Santos, Américo Augusto dos Santos, como se pode comprovar no documento. O próprio contrato assume que está sujeito às regras do Código dos Contratos Públicos.

O pai de Pedro Nuno Santos é um dos representantes da empresa e assina o contrato

A lei não diz apenas que há um impedimento a que esta situação ocorra, como também estabelece um regime sancionatório para o titular do cargo político. Segundo o seu artigo 11.º, a “infração” implica, “para os titulares de cargos de natureza não eletiva, com a exceção do primeiro-ministro, a demissão”.

A empresa da família Santos (e da família de Fernando Laranjeiro) beneficiou de contratos públicos num valor total de 1,1 milhões de euros desde 2008 até à atualidade. Destes, 517.045 euros foram realizados desde que Pedro Nuno Santos tomou posse como governante até à entrada em vigor da lei n.º 52/2019, em julho de 2019. Desde essa altura, não tinha existido mais nenhum contrato público da Tecmacal. Isto até ao contrato que está agora em causa, de junho deste ano.

A Tecmacal — empresa da qual Pedro Nuno Santos chegou a ser adjunto da Administração entre outubro de 2012 e novembro de 2015 — tem ainda uma participação de 98.91% na empresa OPTIMA, o que significa que o ministro e os seus familiares acabam por deter, de forma indireta, mais de 10% também desta outra empresa.

Isto torna problemático um outro contrato. A empresa OPTIMA, gerida pelo pai de Pedro Nuno Santos, beneficiou de um outro contrato, no valor de 11.500,00 euros, num procedimento por consulta prévia que teve como adjudicante o Instituto Politécnico de Leiria.

A defesa do ministro: situação é a mesma de 2019

Pedro Nuno Santos acredita que não existe qualquer incompatibilidade, tendo por base um parecer pedido pelo primeiro-ministro António Costa à Procuradoria-Geral da República, em 2019. Nessa altura houve um grande debate público centrado no facto de a contratação pública por parte de familiares de governantes poder levar à demissão imediata de governantes e António Costa pediu um parecer à Procuradoria-Geral da República, que foi publicado em setembro de 2019, já depois da entrada em vigor de uma nova lei (n.º 52/2019), mas que incidiu ainda sobre a anterior (a lei n.º 64/93).

Há, portanto, uma lei nova — mas, para Pedro Nuno Santos, nada mudou. “As questões agora colocadas são inteiramente coincidentes com as que motivaram, em 2019, a solicitação de um pedido de parecer do Governo ao Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, o qual concluiu pela inexistência de incompatibilidades“, diz o ministro das Infraestruturas.

O ministro diz ainda que o parecer “concluiu que o então artigo 8.º da Lei n.º 64/93, de 26 de agosto (entretanto revogada, mas substituída pelos n.º 2 e 3 do artigo 9.º da Lei n.º 52/2019, de 31 de julho, com redação idêntica para os efeitos em causa), deve ser objeto de redução teleológica, ou seja, excluir situações à partida abrangidas pela letra da lei”.

E, continua o ministro, o mesmo parecer diz que, “ao proibir a participação em todos os concursos públicos, por empresas detidas por familiares dos titulares de cargos políticos, atentaria contra a liberdade de iniciativa económica privada de forma desproporcional, o que, em última análise, implicaria a sua inconstitucionalidade — por violação do n.º 2 do artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa”.

O parecer diz assim que, se as empresas forem do próprio titular do cargo político e este tiver mais de 10%, pode ser aplicada a letra da lei: há um impedimento. Se o que estiver em causa forem empresas detidas apenas por familiares, estes só estão impedidos de fazer contratação pública caso a entidade pública que faz o contrato dependa diretamente do titular do cargo. Porém, o caso desta contratação da Tecmacal, de junho de 2022, é diferente do que foi abordado no parecer: é um caso em que o ministro, “conjuntamente” com um familiar, detêm mais de 10%.

O parecer diz que a referida “redução teleológica” — que, segundo o ministro, o iliba do impedimento — é relativa não a todo o artigo 8.º da lei n.º 64/93, mas apenas à alínea a).

O parecer diz que a situação que não deve ser considerada para a demissão imediata é apenas a referida na alínea a)

Acontece que, o que está em causa nesta situação não é a alínea a) do n.º 2 do artigo 8.º — que é referente aos casos em que as empresas são detidas apenas por familiares –, mas sim a alínea b), que trata de empresas detidas “conjuntamente” pelo titular do órgão e um seu familiar.

A juntar a isso, o parecer da PGR — embora aborde as alterações em curso e lembre que estava para ser publicada uma nova legislação — incide de uma forma mais direta sobre a lei de 1993, não sobre a atual. Entretanto, foi aprovada a nova lei, em que este impedimento é mantido.

A nova lei mantém também o regime sancionatório para estas situações — no caso dos ministros, é a demissão.

O Observador questionou ainda o ministro Pedro Nuno Santos sobre a diferença de valores que existe no relatório comercial do diretório de empresas (que lhe atribui 0,5% da empresa) e o que registou na declaração de rendimentos (1% da empresa) — mas o governante não quis esclarecer as percentagens exatas que os seus familiares têm atualmente na Tecmacal.

O Observador tentou ainda contactar Américo Augusto dos Santos, telefonando para dois edifícios da Tecmacal, mas foi informado por uma funcionária da sede onde o administrador habitualmente trabalha, a de São João da Madeira, que o pai do ministro não estava presente.

Assine por 19,74€

Não é só para chegar ao fim deste artigo:

  • Leitura sem limites, em qualquer dispositivo
  • Menos publicidade
  • Desconto na Academia Observador
  • Desconto na revista best-of
  • Newsletter exclusiva
  • Conversas com jornalistas exclusivas
  • Oferta de artigos
  • Participação nos comentários

Apoie agora o jornalismo independente

Ver planos

Oferta limitada

Apoio ao cliente | Já é assinante? Faça logout e inicie sessão na conta com a qual tem uma assinatura

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.

Assine por 19,74€

Apoie o jornalismo independente

Assinar agora