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João Matos Fernandes recebeu empresas de energia que avisaram: pode decidir o que quiser e nós investimos se quisermos
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João Matos Fernandes recebeu empresas de energia que avisaram: pode decidir o que quiser e nós investimos se quisermos

Tiago Costa Couto/Observador

João Matos Fernandes recebeu empresas de energia que avisaram: pode decidir o que quiser e nós investimos se quisermos

Tiago Costa Couto/Observador

Entrevista a Matos Fernandes. O lobby elétrico "preocupa-me muito pouco, com franqueza"

Ministro do Ambiente e Transição Energética não receia lobby da energia. Diz que vai manter cortes decididos pelo antecessor, mas também assume que país precisa da EDP para cumprir metas ambientais.

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Ficar com a pasta da energia não foi apenas para fazer o jeito ao colega da Economia, Siza Vieira, limitado pelas incompatibilidades da EDP. Para Matos Fernandes, integrar a energia no ambiente era uma decisão esperada para cumprir a ambição de tornar Portugal neutro em carbono até 2050. Ainda que tenha sido tomada a um ano do fim da legislatura.

Em entrevista ao Observador, o ministro do Ambiente a Transição Energética elogia o trabalho feito pelos seus antecessores na área da energia, sobretudo em matéria de controlo dos custos da eletricidade e de baixa dos preços e garante que vai manter e executar o que foi deixado pronto, em particular nos cortes à EDP. Mas também deixa algumas críticas. Licenciamento solar muito rápido, mas sem garantir o investimento, uma regulação que se preocupa mais com a tarifa do próximo ano do que com as metas a longo prazo e políticas que nem sempre tiveram a preocupação de encontrar um ponto de equilíbrio com a necessidade de atrair o investimento.

Sobre os conflitos e uma suposta má relação entre os anteriores titulares da pasta da energia com a EDP,  Matos Fernandes assume que o país precisa da empresa liderada por António Mexia se quiser cumprir as metas de transição elétrica. E o lobby do setor elétrico? “Faço sempre o meu papel e a expetativa que tenho é a de que cada um faça o seu. É evidente que queremos ter uma boa relação com o setor e teremos certamente uma boa relação.”

[Veja o vídeo com os momentos-chave da entrevista:]

A ida da energia para o Ambiente foi também uma proposta sua ou resultou apenas das incompatibilidades do novo ministro da Economia?
A integração da energia no Ministério do Ambiente prende-se com um compromisso que o Governo assumiu na pessoa do primeiro-ministro, compromisso que não constava do programa inicial que é o de Portugal ser neutro em carbono no ano de 2050. Sendo o Ministério do Ambiente o responsável pela política climática, era evidente que faltava uma ferramenta da maior importância. Já tinha várias: os transportes urbanos, a mobilidade rodoviária é uma ferramenta muito importante para se poder cumprir a neutralidade, mas a produção de energia e a política energética não estavam nesse ministério. Por isso, integrar dentro do chapéu da política climática, a política energética e a política de transportes foi a decisão mais esperada.

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Não foi só pela incompatibilidade do ministro Siza Vieira com a eletricidade por causa da EDP?
De todo. Essa é uma questão sobre a qual não sei falar. Quando o convite me foi feito, foi nestes pressupostos. Ninguém me contou outra história, nem tinha que o fazer.

Do que já vimos, parece que tenciona ser um ministro mais interventivo (na energia) do que o antecessor (Caldeira Cabral). Que pastas vai ter o seu secretário de Estado da Energia, João Galamba?
Comigo tenho os reguladores, a ERSAR (regulador da água) e ficarei com a ERSE (energia). Tenho quase todas as competências funcionais delegadas nos secretários de Estado. Tenho a política internacional e a regulação. Mas o João Galamba e eu somos uma equipa e vamos tomar decisões em conjunto. Ser um ministro mais interventivo… não sei comparar com o meu antecessor. Serei certamente o ministro responsável por esta área e tenho um excelente secretário de Estado que é o João Galamba. No limite, a responsabilidade das decisões será evidentemente sempre minha.

Muitas licenças e pouco investimento. O que muda no solar

Fazendo uma avaliação das decisões e políticas seguidas na área da energia, o que falta fazer do seu ponto de vista? E o que não devia ter sido feito?
Foi certamente muito bem feito todo o esforço para conter o custo da energia. Temos que recordar o compromisso que veio da troika e assumido pelo anterior Governo, e que em princípio se prolongaria no tempo, de que a energia elétrica aumentaria a cada ano entre 1,5% a 2%, acima da inflação, o que mereceu da parte do meu antecessor uma ação muito concreta. Foi também bem feita esta dinâmica de licenciamento no domínio da produção de energia renovável de fontes solares. É verdade que essa mesma movida de licenciamento não levou ainda a uma correspondência do ponto de vista do investimento. Temos mais de 1,5 mil megawatts licenciados, dos quais estão construídos apenas 49. Dito de outra forma, temos um sistema de licenciamento muito pensado para obter uma licença depressa, mas pouco pensado para começar a produzir depressa. Para cumprirmos as metas a que estamos obrigados em 2020, temos mesmo que fazer diferente, no sentido de fazer mais. Temos que garantir que estas licenças se transformam de facto em obra e em produção a partir de fontes renováveis. E temos de andar muito depressa para que isso se concretize.

"Temos uma regulação que às vezes parece pensar essencialmente naquilo que é a tarifa do próximo ano. Nem sempre contempla como deve contemplar a inovação tecnológica e as metas a que o país está comprometido e que quer cumprir."

O que está a faltar?
Estamos a fazer o levantamento da miríade de licenças que estão passadas. Já sabemos que mudanças vamos introduzir. Vamos ter de fazer leilões para o solar. Leilões são muito comuns na Europa e podem dar uma tarifa que permita que estes projetos, que estão a ter muitas dificuldades, se possam financiar. Há duas vantagens muito claras. Para além de começarem a produzir mais depressa, reduz-se os risco de investimento e os custos de financiamento. Vamos ter energia mais barata e fica também mais fácil planear a rede que irá recolher a energia a esses locais.

O leilão é para novas licenças de centrais ou para a produção de energia?
Esses leilões têm necessariamente de ser dirigidos também àqueles que já têm licença, mas obviamente também contemplam a possibilidade de aparecerem novos players no mercado. Temos de chegar a 2020 com 70% da energia elétrica produzida a partir de fontes renováveis. Não me parece que estejamos muito longe, porque estamos com 56%, mas estamos de facto longe no sentido em que não há nenhum projeto ou dois projetos que, por si só, permitam cumprir este intervalo. Há um número muito vasto de projetos de pequena dimensão que todos juntos conseguem fazer com que lá cheguemos. No solar vamos também introduzir uma componente nova, que é por quem produz a pagar uma parte ou o todo da ligação à rede. Já encontramos produtores que estão disponíveis para isso e essa era uma exigência que não tinham no passado. Também o sobreequipamento, isto é, o aumento da produção a partir dos parques eólicos que já hoje existem, vai mesmo avançar. Tem estado bastante parado porque temos uma regulação que às vezes parece pensar essencialmente naquilo que é a tarifa do próximo ano. Nem sempre contempla como deve contemplar a inovação tecnológica e as metas a que o país está comprometido e que quer cumprir.

Matos Fernandes defende leilões para produção solar e quer produtores a pagar ligação à rede. Foto Tiago Couto/Observador

TIAGO COUTO/OBSERVADOR

Não concorda com o travão que o anterior secretário de Estado colocou ao sobreequipamento por causa do impacto no preço da eletricidade?
Percebo perfeitamente o que foi feito. Não vamos alterar, vamos criar um caminho paralelo e simplificado. Aqueles que aceitarem uma tarifa mais baixa — a que existe hoje é de 60 euros por megawatt/hora com um parecer da ERSE, e o que se tem visto é que esses pareceres nunca são positivos. Os que aceitarem um preço de 45 euros — este é um valor a partir do qual a própria ERSE considera que há um sobrecusto — podem fazer já o reforço da potência sem ter de esperar pelo parecer da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE). Sabendo nós que a CESE (Contribuição Extraordinária sobre o Setor Energético) vai ter uma componente mais alargada (vai chegar às renováveis), no que diz respeito ao repowering (aumento da potência com substituição de parques existentes por máquinas mais novas) os operadores terão uma isenção da contribuição nos primeiros dois anos.

Decisões que penalizaram EDP não serão revertidas

O discurso sobre a energia mudou consigo. Deixámos as rendas e a necessidade de baixar preços para a descarbonização e para as renováveis. O objetivo de controlar os preços já foi alcançado? O problema dos custos ficou resolvido?
Muito desse trabalho está resolvido ou em vias de resolução. Em relação às contas apresentadas pela ERSE no passado dia 15 de outubro – onde se prevê um aumento da tarifa para os domésticos de 0,2% em 2019 – haverá transferência de dois terços da receita da CESE (aprovada no último Conselho de Ministros) e um valor suplementar de 40 a 50 milhões de euros do Fundo Ambiental. Estamos a injetar mais 190 milhões de euros na redução do défice tarifário. A consequência será reduzir em 17% o custo de acesso à rede, o que beneficia todos, domésticos e industriais. E na energia elétrica que consumimos em casa vamos ter uma descida em relação ao ano passado de 3,5%. Este valor tem de ser confirmado pela ERSE (a 15 dezembro), mas não acho que tenhamos menos arte para o fazer. Objetivamente, a tarifa energética já está a baixar. E temos de criar condições para que, produzindo a partir de fontes renováveis, ela não suba. Não há qualquer dúvida de que neste momento o preço fixado em mercado de energia seria mais elevado se não houvesse a presença das renováveis. Às vezes as comparações são feitas sem considerar qual seria o preço da energia se não houvesse renováveis, porque estas deprimem o preço da própria energia. E com a sua expansão, num país que ainda depende em quase 75% — ao nível da energia total — de importações e dos combustíveis fósseis, estamos sempre sujeitos às flutuações de mercado que não conseguimos dominar. Se a produção for feita a partir de recursos endógenos — sol, o vento e a água — vamos a prazo ter preços mais baixos do que temos hoje.

Vão manter e executar todas as decisões tomadas pelos anteriores responsáveis pela energia e que penalizavam em particular EDP?
Dizer todas é demasiado fácil, mas não vamos reverter nenhuma decisão do passado relativamente a essa matéria.

Uma em concreto estava ainda pendente e tinha a ver com a extinção da conta de hidraulicidade (700 milhões de euros), um valor que a EDP reclamava ao sistema elétrico.
É um valor que a EDP reclamava. O nosso antecessor entendeu de forma diferente e não temos nenhuma razão para discordar dele. E há outra coisa que iria acontecer, estivesse quem estivesse. Há uma medida, o clawback, que em português quer dizer mais ou menos retenção, que foi criada quando as elétricas portuguesas estavam a produzir a preços muito mais baixos no mercado ibérico do que as espanholas e com isso estavam a ter um sobreganho (que foi retirado com este mecanismo). A partir do momento em que Espanha eliminou o imposto de 7%, inverteu-se a tendência. Nós que éramos mais exportadores, passamos a ser mais importadores. Não há qualquer razão para que o clawback se mantenha. E isso vai obviamente ser positivo para os produtores.

E vai obrigar as renováveis a devolver o duplo apoio que receberam do subsídios públicos e das tarifas bonificadas?
Todas essas matérias estão ainda carentes de decisão. Não temos connosco os documentos que permitam tomar essa decisão. Queremos criar uma política energética mais ambiciosa, focada na transição energética que tem três parcelas principais e percebendo que em momento algum podemos prejudicar a competitividade do país e onerar as famílias: produzir cada vez mais por fontes renováveis; ter a certeza de que vamos aumentar a eletrificação, sobretudo na mobilidade e ser mais eficientes, gastar cada vez menos energia. Essas são as decisões políticas, as outras são, nesta altura, administrativas que não deixaremos de decidir quando tivermos de o fazer.

"Não tenho a mais pequena dúvida da relevância que a EDP tem. Nós precisamos da EDP, e não só da EDP, para cumprir as metas de eletrificação do país. O Estado não é promotor direto desses investimentos. Não tem essa tecnologia, nem esse know-how. Todas as empresas são muito bem vindas. Em relação ao palavrão chamado lobby, eu faço sempre o meu papel e a expetativa que tenho é a de que cada um faça o seu papel."

Precisamos da EDP, e não só da EDP, para cumprir metas

O seu primeiro ato público como ministro foi ir à casa da EDP. Sabendo que existem muitos conflitos até judiciais com a empresa, porque tomou a decisão? Sentiu alguma necessidade de dar algum sinal público?
Em rigor não tomei nenhuma decisão. Quando muito poderia ter tomado a decisão de não ir, porque o convite estava feito ao meu antecessor. Na véspera da tomada de posse (no domingo em que foi conhecida a remodelação) vieram os compromissos que estavam assumidos pelo meu antecessor, Manuel Caldeira Cabral, e havia este convite para avaliar e eu achei muito bem estar presente. Por várias razões. Primeiro, porque o projeto (windfloat) encaixa mesmo bem, é um projeto inovador de energias renováveis a acontecer no mar e desenvolvido com tecnologia portuguesa. Devemos louvar quem faz estes investimentos. Em segundo lugar, porque não tenho a mais pequena dúvida da relevância que a EDP tem. Nós precisamos da EDP, e não só da EDP, para cumprir as metas de eletrificação do país. O Estado não é promotor direto desses investimentos. Não tem essa tecnologia, nem esse know-how. Todas as empresas são muito bem vindas. Em relação ao palavrão chamado lobby, eu faço sempre o meu papel e a expetativa que tenho é a de que cada um faça o seu papel. É evidente que queremos ter uma boa relação com o setor e teremos certamente uma boa relação. Em momento algum, e não posso deixar de invocar o meu passado, deixei de ter boas relações com os setores que tutelei. Não deixando de fazer o meu papel. O que aconteceu com a Celtejo no Tejo – fábrica de celulose obrigada a reduzir descargas por causa de poluição no rio – nunca levou a que eu tivesse uma má relação com os donos da Celtejo (a Altri). Fiz o meu papel, eles tentaram contrariá-lo. Eu tinha razão e cumpriu-se.

Matos Fernandes ouviu as grandes empresas de energia dizer que o pior é a instabilidade de regras. Foto Tiago Couto/Observador

Tiago Costa Couto/Observador

Não foi avisado para o poderoso lobby do setor elétrico?
Nunca fui avisado porque não vale a pena avisarem. Eu tenho esta carinha que ajuda muito pouco a qualquer situação espúria ou que ande lá perto. Isso preocupa-me muito pouco com franqueza. O que me preocupa verdadeiramente é arregimentar todos os que são necessários para cumprir as nossas metas, que são muito importantes para o país.

Já recebeu pedidos, ou recebeu em audiências a administração da EDP e ou acionistas da EDP?
Assim que chegamos convoquei todas as grandes empresas para uma reunião sem jornalistas. Uma reunião com a Galp, com a EDP, com a Endesa, com os grandes players do setor como a APREN (Associação de Produtores de Energia Renovável). Foram reuniões sem agenda de propósito, dissemos ao que vínhamos, Da mesma forma que antes recebemos todos os serviços deste ministério e a ERSE.

Mas isso foi por vossa iniciativa. Algum acionista grande da EDP pediu para falar consigo?
A minha agenda é a minha agenda. Posso falar das reuniões que foram convocadas por minha iniciativa.

Empresas receiam instabilidade das regras

Quais foram as principais preocupações que ouviu dos players do setor?
Nas empresas que estão diretamente na produção elétrica ficaram muito claras duas coisas. Há uma grande disponibilidade para fazer parte desta transição energética, isso foi muito evidente. E um receio de que a instabilidade das regras pudesse inibir os seus investimentos. Houve uma ideia que perpassou por diversas empresas: “O Sr. ministro está completamente à vontade para decidir o que bem entender. Mas não levará a mal que nós também estejamos à vontade para não investir”. E como precisamos desses investimentos, tenho a certeza de que vamos encontrar um bom ponto de equilíbrio que seja completamente diferente do passado. E com isto não estou a criticar ninguém.

"Houve uma ideia que perpassou por diversas empresas: “O Sr. ministro está completamente à vontade para decidir o que bem entender. Mas não levará a mal que nós também estejamos à vontade para não investir". E como precisamos desses investimentos e tenho a certeza de que vamos encontrar um bom ponto de equilíbrio que seja completamente diferente do passado. E com isto não estou a criticar ninguém".

Quando começamos há 10, 12 anos este caminho das renováveis, que projetou Portugal no exterior, a tecnologia custava 200 euros por megawatts/hora. E hoje conseguimos ter essa produção com valores que não ultrapassam os 30 a 35 euros por MW. Percebemos que para conseguir este impulso tinham de ser dados um conjunto de garantias, sabemos que hoje não é necessário dar essas garantias, mas sim dar garantias de estabilidade no modelo regulatório e de alguma estabilidade de preços, de forma a que estes investimentos sejam concretizáveis. Isto é tudo muito bonito, mas se as empresas não encontrarem dinheiro para fazer estes investimentos pura e simplesmente não os farão.

Algumas dessas empresas mostraram também disponibilidade para deixar cair processos contra o Estado, nomeadamente de contestação à CESE?
Esse é o tipo de matéria que poucas vezes se deve falar numa primeira reunião. É público por parte da EDP a disponibilidade para pagar desde que o Governo honrasse os seus compromissos que, repito, não negociou com ninguém. Eu não negociei com ninguém. Foram públicos estão inscritos no Orçamento do Estado, e que passam por transferir dois terços da receita da CESE para a redução do défice tarifário, o que beneficia os consumidores e as próprias empresas. Também se pretende dar estabilidade às receitas do fundo ambiental e criar um conjunto de isenções – na área das renováveis – que não têm grande expressão, mas que são importantes para alavancar os peque

Já escolheu um novo administrador para a ERSE depois da desistência do deputado Carlos Pereira?
Tenho um novo nome para a ERSE, mas enquanto a CRESAP (Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública) não o aprovar não posso dizer. Só posso dizer é que, por causa das quotas, é do género masculino, porque estão lá agora duas senhoras.

E tem alguma ligação ao Governo ou ao PS?
Se tem, não é pública, foi convidado pelo mérito profissional.

Concurso do lítio avança, mas projetos em áreas protegida caem

Vai lançar concurso para a exploração de lítio que estava previsto para o final do ano?
As coisas ficaram preparadas, mas não creio que seja possível lançar até ao final do ano. Mas não passará janeiro ou fevereiro. Estamos interessados em que um minério tão relevante para a mobilidade elétrica (usado nas baterias dos automóveis) possa vir a ser explorado em Portugal, mas avaliando ambientalmente os projetos, um a um. E fazendo uma coisa que não tinha sido feita, que é cruzar a localização desses projetos com as áreas protegidas e as zonas mais sensíveis. E isso pode levar a que nem todos tenham condições. Sabemos à partida que alguns vão chumbar nas avaliações de impacto ambiental. Mas tentando sobretudo perspetivar a exploração de lítio numa perspetiva mais verticalizada possível. Não faz sentido em Portugal falar em fomento mineiro no século XXI. Faz sentido explorar e acrescentar o maior valor possível no nosso país.

Estamos interessados em que um minério (o lítio) tão relevante para a mobilidade elétrica (usado nas baterias dos automóveis) possa vir a ser explorado em Portugal, mas avaliando ambientalmente os projetos, um a um. E fazendo uma coisa que não tinha sido feita, cruzar a localização desses projetos com as áreas protegidas e as zonas mais sensíveis.(...) Sabemos à partida que alguns vão chumbar nas avaliações de impacte ambiental.

Quando fala em verticalização, está a falar da componente industrial?
A mina é uma escombreira de onde se tira pedra. Queremos ir o mais além possível em acrescentar valor em Portugal. Não falar apenas numa mina, mas no lítio.

A fiscalidade é um tema muito importante para a descarbonização. Na reforma feita pelo anterior Governo, o Ambiente liderou o processo. agora está afastado. Conhece as conclusões do grupo de trabalho?
Precisamente porque se reconheceu que esta é uma matéria que envolve ambiente e energia, que na altura estavam em pastas diferentes, e as Finanças, achamos que era importante haver outro ministério a coordenar e esse desafio foi feito ao ministro adjunto (Siza Vieira, que entretanto assumiu a pasta da Economia) que o mantém. O trabalho estará concluído até ao final do ano. Se a pasta já tivesse concentrado a energia e a alteração climática, não teria feito sentido. Mas seria no mínimo uma indelicadeza fazer de outra forma agora.

Impostos. Fim dos subsídios perversos ao combustível fóssil

Enquanto ministro do Ambiente defende que haja um agravamento da fiscalidade dos combustíveis fósseis?Defendo que vão terminando os subsídios perversos dados à produção de energia a partir de combustíveis fosseis. Só em 2017 foram 415 milhões de euros. Já acabamos com a isenção do ISP (imposto sobre produtos petrolíferos) em relação ao carvão, mas nos outros ainda não está previsto, como o gás natural. Os contratos que existem são sempre para respeitar, mas não faz sentido que estes benefícios existam. Estamos a fazer isto de maneira ponderada – as centrais a carvão pagaram 10% do ISP no ano passado e 25% este ano. Esse desmame é importante para que haja justiça nos preços das diversas formas de energia.

O fim da isenção vai chegar às centrais de gás natural?
Não sei se não começa no próximo ano, mas não tenho dúvidas que dentro de dois ou três anos esse fim de isenção se deverá estender ao gás natural naturalmente, como combustível fóssil que é.

E não receia o impacto negativo no preço da eletricidade?
Por isso é que temos um grupo de trabalho e é preciso fazer essa avaliação. É impensável seguirmos um caminho de descarbonização se não formos justos na fiscalidade. Não estamos a penalizar ninguém. Da mesma forma que queremos ser justos com todos aqueles que foram convencidos e bem a fazer apostas de só usar eletricidade como fonte primária e por isso queremos já no próximo ano compensar os custos indiretos que as empresas.

Governo vai compensar grandes indústrias que usam eletricidade por subida dos preços

Os combustíveis dos transportes rodoviários não podem ficar de fora. O caminho que foi sinalizado, de aliviar a carga fiscal da gasolina e agravar a do gasóleo, vai ao encontro do que defende?
Boa parte do dinheiro que temos para reduzir a fatura de eletricidade dos portugueses vem exatamente das empresas poluidoras, a partir do momento em que a tonelada de CO2 passou de pouco mais de seis euros para mais de 20 euros este ano. Em função disso, a taxa de carbono também sobe, ainda que com impacto marginal no preço dos combustíveis. Este alívio na gasolina, que é um combustível que não tem partículas e é menos mau para a qualidade do ar, não chega para o pequeno agravo da taxa de carbono. Mas o que me parece verdadeiramente importante é eletrificar a mobilidade, algo que vai acontecer mais depressa do que supunha. Temos aberto concursos para a aquisição de autocarros de performance ambiental. Há um ano e meio a percentagem de autocarros elétricos era de 15% e agora é de 41%. A confiança que as empresas têm na maturidade da tecnologia elétrica aumentou muito.

Estamos a caminhar na harmonização do nível de impostos na gasolina e no gasóleo?
Isso é inevitável por várias razões. Objetivamente, o diesel, sobretudo na cidade, tem um impacto muito mais significativo ao nível da qualidade do ar e da saúde dos cidadãos. É normal que essa aproximação seja feita, conhecemos os movimentos que existem na Europa até no sentido mais duro de inibir a circulação do diesel em determinados centros urbanos.

Mas essa será uma competência das autarquias…
Não sei se existe lei para tal, mas é importante dar às autarquias esse poder por via legislativa e que vai muito além disso, pode chegar ao controlo dos veículos que circulam nas cidades, imposição de taxas. Cada autarquia, cada área metropolitana poderão decidir, mas é uma questão de gestão do território.

À medida que a transferência for acontecendo, os governos vão ser tentados a transferir a fiscalidade para a mobilidade elétrica.
Não será no horizonte deste Governo, mas os governos terão de encontrar alternativas. E o melhor é taxar as matérias-primas. Se retiramos a energia, em Portugal a receita fiscal das matérias primas é de 0,5%. O sítio onde devemos fazer crescer a fiscalidade a prazo é mesmo nas matérias-primas, porque são aquelas que vão acabar. As pessoas têm de perceber que não há resíduos e que não se pode ter material como o plástico, que só se usa uma vez. Se acreditamos que vamos continuar a ir buscar as nossas matérias-primas longe, estamos a fazer um disparate, estamos a criar uma pegada ecológica associada ao transporte e tornar mais instável a segurança no acesso a essas matérias. Vai ficar mais caro se não fizermos a aposta na economia circular, se continuarmos na economia linear.

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