Nenhuma das empresas de serviços essenciais — que responderam às perguntas do Observador — assume qualquer constrangimento às operações pelos casos de isolamento de trabalhadores com que têm de lidar. Admitem, nalguns casos, recorrer a trabalho suplementar, dias de folgas ou férias para colmatar ausências, e no caso do Estado não se coloca de lado a possibilidade de chamar aposentados, tal como o Reino Unido admitiu quando falou de uma possível ausência de 25% dos funcionários públicos por causa da Covid-19, nestes dias em que as infeções dispararam na Europa.
Em Portugal também dispararam, e há neste momento mais de 200 mil casos ativos de Covid-19, havendo mesmo quem projete que o país poderá chegar, nesta primeira semana de janeiro, às 600 mil pessoas em isolamento. Face a estes números, o Observador questionou as empresas que trabalham em serviços essenciais quais os níveis de isolamento que estão a registar e o que pretendem fazer para garantir que não há ruturas nos fornecimentos.
Não há qualquer entidade a assumir problemas, sustentando haver planos de contingência implementados que permitem responder à situação. Para que não falte a água, energia, telecomunicações, combustíveis e transportes públicos. Também o Governo, pela voz do Ministério da Administração Pública, assume normalidade.
Ao Observador, fonte oficial do gabinete da ministra Alexandra Leitão diz que os serviços públicos estão a “funcionar com toda a normalidade possível”. Cabe aos dirigentes superiores de cada serviço “verificar em permanência as condições do respetivo funcionamento em concreto, nomeadamente no quadro dos planos de segurança e saúde no trabalho que possuem, por forma a assegurar a continuidade dos mesmos e recorrendo aos meios legais que estão à respetiva disposição”, explica a mesma fonte. Sem constrangimentos a registar, o Ministério garante acompanhar “em permanência a evolução da situação pandémica, avaliando a eventual necessidade de medidas específicas neste domínio”.
E, por isso, questionada pelo Observador sobre a possibilidade de chamar reformados garante que, de momento, não existe “qualquer plano de contingência transversal que preveja o recurso a aposentados/reformados”, mas salienta que “o estatuto da aposentação permite o exercício de funções públicas por aposentados, sempre que situações excecionais e devidamente fundamentadas o justifiquem e desde que o princípio da prossecução do interesse público esteja em causa”.
Outra alternativa é a possibilidade de recorrer a trabalho suplementar. A Fertagus, por exemplo, assume que, “sempre que se justifique, ou seja, sempre que se verifique um nível de absentismo superior ao normal devido à pandemia”, recorre à realização de “horas extraordinárias, ao trabalho em dias de folgas ou a alteração dos períodos de férias e por fim à redução do número de serviços”. No entanto, “até ao momento, nenhuma das situações mencionadas foi necessária implementar”, acrescenta, para garantir que “só numa situação extrema poderá haver afetação do serviço comercial”. Neste momento, a empresa que faz a travessia ferroviária do Tejo, em Lisboa, contabiliza apenas um caso de infeção entre os seus trabalhadores, tendo mais três em isolamentos por contactos de alto de risco. “O que não afeta a operação”, realça.
Considerando o reduzido o número de colaboradores infetados até ao momento e pela inexistência de cadeias de contacto dentro da empresa, a Fertagus acredita que o seu plano de contingência está a cumprir a sua função, e diz que “tem vindo a evoluir no sentido do cumprimento rigoroso de todas as recomendações da Direção Geral de Saúde”.
A Carris também assume que, sempre que se justifica, “a ausência de trabalhadores tem sido colmatada pelo recurso pontual a trabalho suplementar”, acrescentando que “o número de trabalhadores da Carris, com situações associadas à Covid-19, acompanha a evolução quer nacional quer da Área Metropolitana de Lisboa, onde estes colaboradores vivem e trabalham”. Tal, “não colocou em causa a realização do serviço público do transporte de passageiros, nos termos previstos no plano de oferta da empresa para este período do ano”, garante fonte oficial.
É a garantia também deixada pelo Metro do Porto — “não temos vindo a registar quer nas atividades relacionadas com a operação da rede do Metro do Porto nem no âmbito das empreitadas de construção das novas linhas qualquer tipo de perturbação decorrente da pandemia“, assumindo um conjunto de medidas, além das que vigoram para todos os cidadãos, que “incluem planos de testagem regulares”.
No metro da capital, que diz ter em funcionamento um grupo de acompanhamento da pandemia (GAP) — que “monitoriza, analisa e propõe medidas de ajustamento ao serviço” de acordo com a evolução da situação — foram criados “cenários de oferta de serviço de acordo com a perspetiva de evolução pandémica que poderão ser acionados a qualquer momento”. E, não sendo possível a substituição temporária dos trabalhadores devido às competências especializadas, o Metropolitano de Lisboa “tem gerido as situações de ausência com recurso às reservas disponíveis ao trabalho suplementar”.
Neste momento o Metropolitano de Lisboa tem 44 trabalhadores em isolamento. Ainda assim, “não obstante a expectável evolução da situação epidemiológica, não prevemos que venham a existir constrangimentos no serviço”.
Já a CP admite alterar escalas de pessoal para colmatar falhas. Fonte oficial diz ao Observador que “para fazer face a um eventual aumento do número de casos, e consequente redução de efetivos disponíveis, a CP atuará ao nível local e direto na alteração das escalas do pessoal designado para a realização dos comboios”. A CP tem 36 trabalhadores infetados e 42 em isolamento, num efetivo total de mais de 3.750 trabalhadores, dos quais cerca de 2.000 pertencem às carreiras que asseguram a operação e realização de comboios (nomeadamente maquinistas e revisores).
No plano de contingência da empresa, de março de 2020, e que tem vindo a ser ajustado, a empresa já contempla cenários de operação perante reduções de disponibilidade do efetivo laboral, não tendo revelado mais detalhes. Nas medidas de prevenção a empresa assume testagem em contexto laboral, “garantindo o rastreamento na sequência de contactos de risco e a eliminação de eventuais cadeias de contágio, potenciando a preservação e a disponibilidade de recursos para assegurar as atividades nucleares da CP”. Foram feitos entre os dias 27 de dezembro de 2021 e o dia 3 de janeiro de 2022, cerca de 600 teste rápidos (antigénio).
Planos de contingência nos serviços essenciais
Não há empresas que não digam que não têm planos de contingência em vigor, de acordo com as regras da Direção-Geral da Saúde. E muitas dizem que as medidas foram implementadas desde cedo nesta pandemia, decretada em março de 2020.
A REN, que diz ter tomado, desde cedo, medidas conservadoras de proteção da saúde e mitigação do risco de transmissão da Covid-19, reorganizou as atividade “de forma a diminuir contactos entre as pessoas, limitando eventuais cadeias de contacto dentro da empresa”. E acredita que com isto conseguiu que “os casos ativos entre colaboradores da empresa sejam residuais, estando assegurada, sem exceções, toda a atividade da empresa”.
É também baseada no plano de contingência que a EDP assume que “não se verificam, atualmente, quebras de produtividade com impacto nos serviços essenciais”. Do plano consta a adoção do teletrabalho “pelo maior número possível de colaboradores”, garantindo que irá manter o regime para as funções compatíveis “enquanto a orientação legal assim o exigir”. Neste momento vigora a obrigatoriedade de teletrabalho até 9 de janeiro.
“Neste sentido, todos os colaboradores com funções corporativas/administrativas encontram-se em regime de teletrabalho (cerca de 70%), estando apenas em regime presencial os colaboradores que, pela natureza da sua função (ex: funções de terreno, despacho, gestão de mercados e/ou por turnos), não possam realizar teletrabalho, garantindo os serviços essenciais para a continuidade do negócio”, assume ao Observador fonte oficial, garantindo que os trabalhadores a laborar presencialmente têm medidas previstas para “minimizar o risco de infeção e contágio como, por exemplo, a redefinição do processo de alocação a turnos, equipamentos e procedimentos de higienização, bem como normas de distanciamento social”.
A Endesa realça ao Observador, por seu turno, que não tem qualquer trabalhador em isolamento profilático ou por infeção, garantindo o teletrabalho a 100% dos empregados, já que as equipas que andam na rua não são diretamente da empresa, mas sim prestadores de serviços. No caso da elétrica, houve uma mudança na componente comercial: “Não estamos a desenvolver ações de porta a porta desde o início da pandemia devido aos riscos que essas ações podem comportar tanto para as equipas como para os clientes”.
Na Galp, o plano de contingência está, igualmente a ser aplicado para “salvaguardar o bem-estar e a segurança dos colaboradores, a resiliência de todas as operações e o regular funcionamento de infraestruturas críticas para o país e assegurar resposta às necessidades dos seus clientes”, garantindo fonte oficial que “a evolução do contexto pandémico não tem interferido com o devido funcionamento da nossa rede”. A testagem tem, neste caso, sido intensificada nas equipas que operam as áreas de serviço por turnos e na “supressão de turnos caso seja necessário um contexto de isolamento”.
Compreendendo a importância dos serviços que presta, a Repsol explica que as várias unidades operativas “têm seus planos específicos de continuidade de negócio, onde identificam os processos/pessoas críticos, delineando as respetivas respostas”. E nos quase dois anos de Covid-19 “conseguimos fazer face aos constrangimentos causados pela pandemia e manter em funcionamento as nossas operações, pois avaliamos a evolução da pandemia numa base diária e ajustamos as medidas de prevenção e organização em função dessa evolução e das recomendações das autoridades de saúde e de governo do país”, diz ao Observador José Venâncio, responsável pelo departamento de Segurança, Meio Ambiente e Qualidade da Repsol.
Num outro setor essencial, a Águas de Portugal diz não reportar “situações críticas”, tendo “todas as empresas em operação regular”, sendo certo que os planos de contingência “estão reativados e atualizados para a situação de recrudescimento dos contágios”. Esses planos foram feitos logo nos primeiros meses de 2020, “complementando os planos operacionais e de emergência para gerir os riscos e as contingências inerentes a este tipo de situação, de forma a garantir o abastecimento de água e o tratamento das águas residuais de forma segura e fiável”.
E isso pressupõe medidas excecionais de gestão de risco, “determinando os recursos humanos, meios técnicos críticos e condições de trabalho presencial ou remoto, entre outros, e definindo também a participação dos prestadores de serviços e fornecedores e as necessidades de materiais/produtos e eventuais aumentos temporários de reservas para obviar eventuais dificuldades na cadeia de fornecimento habitual”.
Para quem está no terreno, que no caso do Grupo Águas de Portugal é a maioria dos trabalhadores, há procedimentos a respeitar, nomeadamente a organização de turnos sem contacto pessoal, reforço de higienização dos postos de trabalho, constituição de equipas de reserva em isolamento para substituição em casos de necessidade, reforço dos meios de atendimento à distância em detrimento do atendimento presencial, regras de ocupação dos espaços de atendimento presencial, sensibilização para a adoção dos imprescindíveis comportamentos individuais de higiene pessoal e de conduta social, quer em situação de trabalho quer na vida pessoal, apoio à realização de testes de despistagem de infeção, etc.
Bancos com balcões a funcionar
O sistema financeiro também tem estado operacional, não registando interrupções do serviço. Neste momento, os balcões estão a funcionar em todo o país. O maior banco do sistema, o público Caixa Geral de Depósitos, garante ao Observador que “desde o início da pandemia tem planos de monitorização permanente e planos mitigação para os casos que vão aparecendo”, tendo uma equipa de acompanhamento diário da situação pandémica que “monitoriza e faz ajustamentos de colaboradores necessários para o reforço de agências que são impactadas”.
Também o Millennium bcp garante estar a operar “normalmente, com as sucursais abertas e a servir o publico de acordo com as indicações da DGS, para proteger clientes e colaboradores”. Na área de suporte a ordem respeitada é de teletrabalho. Pelo que fonte oficial garante que “não temos sentido impactos significativos nas operações do banco nesta fase da pandemia”.
Nem Caixa nem BCP revelam quantos trabalhadores têm em isolamento, mas o Banco BPI assume serem, no seu caso, 111 os colaboradores nessa situação, sendo 63% na rede comercial e os restantes nos serviços centrais. Na rede comercial, quando “um colaborador (ou mesmo uma equipa) tem indicações para isolamento, fica sempre que possível em teletrabalho, incluindo o relacionamento com o cliente, quando compatível. Até agora, tem sido sempre possível responder à situação sem quebras na qualidade e na disponibilidade do serviço aos clientes, em consequência de uma organização flexível e, sobretudo, do grande profissionalismo e dedicação dos nossos colaboradores”, diz fonte oficial.
O Banco Montepio, que à data de 22 de dezembro contava com onze pessoas em isolamento — esta foi a data dos dados disponibilizados pela instituição — garante que as funções compatíveis estão em teletrabalho. Quanto aos trabalhadores que estão no atendimento ao público, a rede está a ser gerida “de modo que não exista falha de pessoas nos balcões principais”.
Os bancos acrescentam que os clientes, por seu turno, têm ao seu dispor todo um conjunto de canais digitais que podem ser utilizados, como aplicações e homebanking, além do
A SIBS, que mantém em funcionamento toda a rede de terminais multibanco, realiza “com periodicidade” avaliações do comité operacional da evolução da pandemia, tendo o grupo de acompanhamento da Covid-19, logo constituído em março de 2020. E com base nos dados desses grupos, “a taxa de incidência na SIBS é muito baixa. Estamos a falar de menos de 1% de colaboradores infetados e menos de 1% em situação de isolamento profilático”, assumindo a empresa que “são casos isolados e que o seu estado de saúde está estável, a ser acompanhado pelas autoridades de saúde”.
Neste momento em que os casos a nível nacional estão a subir e com a semana de contenção determinada pelo Governo, os trabalhadores com funções compatíveis estão em teletrabalho e a partir de 10 de janeiro funcionará em regime de espelho até 21 de janeiro, retomando, depois desse período, o modelo de trabalho flexível.
Fonte oficial da SIBS garante que “mesmo nos momentos mais críticos da pandemia, e nos períodos de confinamento geral, a SIBS manteve sempre o bom funcionamento dos seus serviços, com toda a confiança e segurança”, tendo os utilizadores continuado a dispor dos serviços bancários.
A SIBS assume ao Observador que o plano de continuidade de negócio da empresa “é suportado por uma rede de dois centros de processamento de dados, com ligações permanentes entre si, e em termos operativos por três centros operacionais em permanência, localizados em Lisboa, Viseu e Castelo Branco”, estando a estrutura humana “preparada para fazer face a acontecimentos de gravidade idêntica aos cenários previstos para ocasiões como esta, estabelecendo as devidas redundâncias ao nível dos seus quadros, assegurando o normal funcionamento dos serviços da SIBS”.
Nas telecomunicações, apenas a Vodafone respondeu ao Observador, dizendo ter um número “pouco significativo” de trabalhadores com baixa médica — “inferior a uma dezena”, pelo que “o número de colaboradores impossibilitados de exercer a sua atividade é extremamente reduzido”. Por outro lado, acrescenta fonte oficial, tem casos de colaboradores que apresentam sintomas ligeiros ou que testaram positivo mas sem sintomas e que continuam em regime de teletrabalho.