“O cérebro vai ser influenciado pelas mãos. Comecem a mexer nas peças,” incita o formador da empresa Scopphu, facilitador credenciado de Lego Serious Play (LSP). Ainda com alguma timidez, os oito participantes do workshop começam a remexer no amontoado de peças Lego que se encontra no centro da mesa. Entre os famosos tijolos – que permitem mil e uma conjugações diferentes –, estão bolos de aniversário, botes, elefantes, tigres, macacos, bonecos variados que podem trocar de cabeça (transparente, com coroa, com diferentes chapéus) ou até mesmo ficar sem ela. A imaginação é o limite. “A chave do Lego Serious Play é a metáfora”, explica o facilitador da Scopphu – empresa formadora. A convite dela, o Observador Lab participou no workshop para conhecer um pouco mais sobre a metodologia LSP, na qual as peças de Lego são o instrumento principal. Curioso?
Representar conceitos
Há décadas que o Grupo Lego pede às crianças para construírem os seus sonhos. Por que não aplicar o mesmo conceito aos adultos e ao mundo empresarial? Procuravam uma ferramenta para desbloquear a inovação dentro de uma empresa e encontraram-na em casa: era chegada a vez dos adultos utilizarem o sistema Lego para representar conceitos, ideias e visões para estratégias futuras. “Permite-nos trabalhar problemas complexos de uma maneira lúdica, retirando as resistências naturais que as pessoas têm”, destaca o formador. “Vai gerar novos diálogos. Queremos que sirva como o início de um processo e não um fim.”
Primeiro, o facilitador faz com que o grupo se familiarize com o método de LSP, através de uma série de exercícios simples. Pode, por exemplo, pedir que construam rapidamente uma torre. Sim, no LSP, há sempre uma janela temporal bem definida. “Obriga-nos a selecionar. Senão, íamos estar sempre a acrescentar coisas”, conta o facilitador. Um dos formandos concorda: “Isto é viciante”. E confessa: “Eu gostaria de ter mais tempo para criar a minha perceção”.
Divergir para convergir
É preciso encontrar um equilíbrio entre a exploração e a execução. “Vai, viaja, mas volta. Isso permite que nos leve às tomadas de decisão”, diz o facilitador. Divergência – convergência – divergência – convergência. O conceito é representado graficamente num quadro branco colocado num dos cantos da sala, de frente para o grupo, através de vários sinais gigantes de ‘maior’ (›) que se sucedem. O lado aberto representa a multitude de ideias que podem ser como que lançadas para cima da mesa; mas, depois, é preciso ir estreitando e procurar perceber quais dessas ideias poderão efetivamente remeter para algo que seja útil.
Modelos simples ou complexos
O ponto de partida é sempre um modelo individual que, a pouco e pouco, passo a passo, irá acabar por convergir num modelo partilhado. Para retirar benefícios do LSP, não são necessárias capacidades anteriores ou artísticas especialmente apuradas, qualquer um pode jogar. Os modelos podem ser mais simples ou mais complexos, dependendo da habilidade do construtor (builder), mas o que interessa é a mensagem que se pretende representar. “Cada peça pode ser o que eu quiser”, relata um dos participantes. Por exemplo, um dos modelos inclui duas personagens com a cabeça transparente e uma mala na mão. “Significa transparência nos negócios”, explica a construtora. Noutros, é frequente a escolha do elefante como representação de uma figura de autoridade – que poderá ser, nalgumas situações, o patrão. Só a pessoa que construiu sabe o que ele significa.
Tudo parte dos modelos
O facilitador coloca o desafio e os participantes dão largas à imaginação, utilizando as peças disponíveis. O Lego Serious Play possui conjuntos de peças especialmente concebidos para o efeito, mas, segundo o formador, é possível utilizar quaisquer peças Lego. Construído o modelo, é tempo de partilhar. Cada builder apresenta o seu modelo aos restantes participantes, explicando o que pretendia representar e transmitir. Os modelos são individuais, mas não são imutáveis.
LSP - Técnicas de aplicação
↓ Mostrar
↑ Esconder
I – Construindo modelos e histórias individuais
II – Construindo modelos e histórias compartilhadas
III – Criando cenários
IV – Fazendo conexões
V – Construindo um sistema
VI – Jogando com eventos emergentes e decisões
VII – Extraindo princípios guias
À medida que os vários builders vão apresentando as suas ideias é possível para qualquer um dos outros aceitar novas ideias e sugestões, e introduzi-las nos seus próprios modelos. O debate é interrompido de quando em quando pelo facilitador, que provoca os demais, de modo a criar o que o formador chama de “tensão criativa”.
Sem hierarquias
Numa sessão de LSP, todos os participantes estão em pé de igualdade. Não há hierarquias, nem jogos políticos. “Todos participam. Todos têm voz. Todos falam e todos ouvem”, assegura o facilitador. “Consegue que todos contribuam ao mesmo nível”, acrescenta um dos builders que ainda destaca como mais-valia o facto de “quebrar o modelo tradicional de reuniões, que é muito improdutivo e enfadonho”. Afinal, nunca se sabe se a ideia que vale milhares de euros não vem do estagiário, que, de outra forma, nunca teria oportunidade de apresentá-la.
Ligação cérebro mão
Mas porquê construir coisas em vez de discuti-las? Investigações científicas mostram que o processo criativo e refletivo de construir alguma coisa faz com que o cérebro funcione de forma diferente e pode desbloquear novas perspetivas. As mãos estão ligadas a cerca de 80 por cento das células cerebrais, por isso, apercebemo-nos de que sabemos mais do que pensamos quando estamos a utilizar as mãos para construir. “O LSP é um diálogo mediado por objetos físicos, que ajuda o cérebro, diminuindo a sua carga de trabalho. Descomplicamos o entendimento a partir das peças de Lego”, explica o formador.
LSP é ágil
Com o Lego Serious Play, ninguém está apenas sentado a tomar notas ou a lançar temas para discussão. Ao contrário do modelo tradicional – em que normalmente uma personalidade dominante identifica os assuntos-chave no início da reunião e o resto das conversações partem daí –, nesta metodologia ágil, tudo parte do modelo construído. O que dá a todos os participantes a oportunidade de expor os seus pontos de vista e opiniões, sem medo de ferir sentimentos pessoais. O processo de construir e colaborar produz, frequentemente, pontos de vista que nunca teriam surgido numa discussão normal, surgindo daí oportunidade de melhorias diverso. “As empresas têm muito a ganhar com este sistema, pois precisam de transformar o conhecimento individual dos seus funcionários em conhecimento coletivo”, salienta o facilitador.
Do modelo ao cenário
Construídos os modelos individuais, é tempo de juntá-los todos num modelo partilhado. Cada builder contribui com as peças que considera importantes, e o grupo tem de estar de acordo. Geram-se discussões, surgem novos pontos de vista e são feitas cedências. O facilitador lança nova questão – “o que é um desafio?”.
Ser ‘Agile’
↓ Mostrar
↑ Esconder
As pessoas e as suas competências são o foco deste tipo de metodologias. O diálogo entre todos – equipa e cliente, inclusive – ao longo do processo de produção contribui para um produto final adequado, funcional e com qualidade.
Nenhum projeto é totalmente previsível. A concorrência no meio empresarial é feroz, e para estar um passo à frente, é preciso “pensar fora da caixa”. Uma empresa ágil (‘Agile’) tem reflexos rápidos que lhe permitem adaptar-se rápida e eficazmente a qualquer situação, estando sempre pronta a responder aos desafios através de uma equipa bem articulada, competente e onde todos têm voz.
Os participantes hesitam. Não é fácil dar forma física a conceitos abstratos. Num dos cantos da mesa, está simplesmente um boneco dentro de uma caixa. “Para mim, um desafio é pensar fora da caixa”, explica o seu construtor. Do outro lado da mesa, um tubarão, um porco e muita água (representada por peças azuis mais claras e mais escuras, como se o mar estivesse agitado). Significado: “Um desafio poderá ser pedir ao porco que entre na água e seja um tubarão”.
O formador da Scopphu provoca: “Mas achas mal que uma organização queira que todos sejam tubarões?”. A jovem builder responde prontamente: “As organizações não devem pedir a uma pessoa para ser o que não é, mas antes para ser o melhor que pode ser”. Pronto, depois dessa fala, nenhum participante fica impassível e emerge um novo entendimento de grupo que será refletido no futuro das relações.
A Scopphu
↓ Mostrar
↑ Esconder
É uma empresa de formação e consultoria, especializada em gestão de projetos. Tem como principal objetivo fornecer aos gestores todas as técnicas e conhecimentos necessários para o sucesso dos seus projetos. A Scopphu distingue-se de outras entidades formadoras pela sua aposta em metodologias ágeis (‘agile’). O Lego Serious Play chegou à Scopphu no início deste ano, e desde então têm apostado em vários workshops e formações, de modo a promover esta nova ferramenta, dotando os participantes das skills necessárias para a aplicarem nas suas profissões.
Solução “fora da caixa”
Muitas organizações não estão contentes com a forma como analisam e resolvem os problemas. É por isso que o LSP é o sistema ideal para quem procura uma solução “fora da caixa”. Que melhor maneira de resolver problemas 3D do que com uma solução 3D? As peças e os modelos Lego são ferramentas para atingir um fim, permitindo explorar cenários hipotéticos e observar dinâmicas internas e externas. A construção, em si mesma, não é o resultado. São os significados ligados a cada modelo que o tornam valioso. “Visualizar o problema e pô-lo em peças, de forma a que o grupo entenda”, diz um dos participantes, que ocupa um cargo de chefia numa grande empresa.
E remata: “Claro que vejo que isto é o futuro, pois permite obter mais resultados, mais rapidamente”. “Resolvemos o problema de uma semana, numa tarde”, acrescenta outro dos participantes, formado em Neurociências. O formador da empresa Scopphu conclui: “LSP é um jogo: há regras, mas não há julgamentos, nem certo e errado. O processo central é constituído de uma linguagem que ajuda os participantes a utilizarem o que sabem e o que não sabem que sabem.”