Discurso de derrota

de Marine Le Pen na eleição presidencial de 2022

Senhoras e senhores, podíamos ter visto um poderoso vento de liberdade a atravessar este país, mas o povo de francês escolheu de forma diferente.

Marine Le Pen abre o seu discurso admitindo a derrota. A candidata da União Nacional, porém, mostra pena por não ter conseguido convencer mais franceses a votar no seu projeto anti-sistema. Consigo, haveria uma revolução — um “poderoso vento de liberdade”. Apesar de ter sido o melhor resultado de sempre para Le Pen, não foi suficiente para conquistar a eleição.

Apesar de duas semanas de métodos desleais, brutais e violentos, olhamos para os resultados da eleição desta noite e podemos ver que, apesar de tudo, as nossas ideias chegaram ao cume. Com mais de 43% dos votos, o resultado representa uma vitória retumbante. Milhões dos nossos concidadãos fizeram a escolha pelo lado nacional e da mudança. Gostaria de demonstrar o meu mais profundo reconhecimento a todas essas pessoas. Aos que votaram em nós na primeira ronda e aos milhões que votaram em nós na segunda.

Se inicialmente Le Pen reconheceu a derrota, logo de seguida tenta apresentá-la como uma vitória. Em causa está o melhor resultado de sempre para a extrema-direita francesa, 43% dos votos. Um valor acima dos 33% conquistados pela candidata há cinco anos e muito acima dos 18% que o seu pai, Jean-Marie Le Pen, havia conseguido contra Jacques Chirac, na segunda volta de 2002. Só assim se explica que Le Pen filha apresente o resultado como sendo “o cume” — é o ponto mais alto a que já chegou, sim, mas ainda não é a entrada no Eliseu.

Envio a minha profunda gratidão a todos os homens e mulheres das regiões rurais e das províncias ultramarinas, que votaram em mim em primeiro lugar. Esta França tantas vezes esquecida, não a esquecemos. Estamos mais determinados do que nunca no nosso desejo de defender os franceses. A todos os que votaram de forma tão expressiva em mim nesta segunda ronda, gostaria de enviar um agradecimento do fundo do meu coração a essa expressão de apoio. Esse lado de França tem sido esquecido tantas vezes, mas nós nunca os esqueceremos.

De seguida, a candidata da União Nacional aproveita para agradecer ao seu eleitorado de base, que apresenta como sendo “a França esquecida”. A coligação de eleitores que a apoia é hoje em dia muito diferente da base eleitoral da Frente Nacional de outros tempos, reunindo também votos de muita classe média e operários. O discurso é semelhante ao de outros partidos anti-sistema por toda a Europa e faz lembrar o apelo à “España vacía” do Vox.

Continuaremos a defender os cidadãos de França, agora mais do que nunca. Hoje não tenho nenhum ressentimento nem rancor. Sepultados, fomos enterrados mil vezes, e mil vezes a História provou que estavam errados aqueles que previam ou esperavam o nosso desaparecimento. Não posso deixar de sentir uma espécie de esperança. Este resultado constitui, tanto para os nossos dirigentes franceses como para os dirigentes europeus, o testemunho de uma grande desconfiança do povo francês em relação a eles, que não podem ignorar.

Le Pen diz não ter “ressentimento nem rancor”, mas logo de seguida deixa um aviso claro: esta derrota não é o fim da Frente/União Nacional, antes o início de algo maior. Diz que a morte do partido já foi decretada várias vezes e que este sempre voltou mais forte. Fica por isso o aviso para aqueles que possam querer assinar a certidão de óbito da União Nacional esta noite. E, já agora, de Marine Le Pen também. Para além disso, deixa um piscar de olho à Europa, ao referir os dirigentes europeus. A candidata pode dizer agora (ao contrário de há cinco anos) que não quer sair do euro ou da União Europeia, mas não recua na sua intenção de fazer frente a Bruxelas.

Os franceses mostraram esta noite o desejo de um forte contra-poder ao de Emmanuel Macron e do seu partido. Seremos a oposição que continuará a defendê-los e a protegê-los perante a desintegração do seu poder de compra, perante os ataques às liberdades, perante o declínio. Seremos a oposição à mudança da idade da reforma que Emmanuel Macron quer aplicar, à insegurança, à imigração anárquica e à frouxidão judicial.

Marine Le Pen assume claramente o papel que quer reservar para si nos próximos tempos: líder da oposição. Não tenciona afastar-se da política, antes pelo contrário. A candidata da UN quer capitalizar a tendência de crescimento do seu partido e assumir-se como a voz que faz frente a Macron. E enumera logo o programa, que se mantém semelhante ao que apresentou em campanha, indo desde a oposição ao aumento da idade da reforma até à dura política anti-migratória.

Temo que o novo governo de cinco anos que aí vem não rompa com os métodos brutais do anterior. Para evitar a monopolização de poderes por alguns, mais do que nunca continuarei o meu compromisso com a França e os franceses. Com a energia, perseverança e devoção que já conhecem.

Aqui, o rosto principal da extrema-direita francesa volta a sublinhar que vai continuar presente na política francesa. Não só renova o seu “compromisso” com os franceses como destaca as suas próprias qualidades: “energia”, “perseverança”, “devoção”.

Deste lado, vemos que o grande palco político em que operamos está a passar por uma grande mudança. A auto-proclamada elite dos partidos políticos de Macron agora vai ter de enfrentar uma verdadeira oposição. Iremos enfrentar as eleições legislativas e estaremos presentes. Os poderes atuais não podem manter esse poder. Queremos mudar o sistema, ou veremos, pelo que foi a campanha de Macron, que ele irá destruir a França. Vai quebrá-la e vai quebrar as suas instituições. Há pessoas que votaram em Macron pela segunda vez. E, no entanto, somos um partido que vai ter o interesse dessas pessoas em consideração e cujos interesses serão defendidos.

O inimigo principal está definido e é Emmanuel Macron. E eis que, pela primeira vez em todo o discurso, Marine Le Pen deixa claro qual será a próxima batalha: as eleições legislativas de 12 e 19 de junho. Com apenas 8 deputados na Assembleia Nacional, a União Nacional quer claramente aumentar a sua representação. Se não o conseguir, fica mais difícil reclamar para si o título de partido principal da oposição a Macron. A única forma de garantir que tal não acontece é Le Pen manter a dinâmica desta campanha presidencial e esperar que possa contagiar já o próximo período eleitoral, que está próximo.

Mais uma vez, espero ver-vos na próxima batalha eleitoral nas legislativas. Vou liderar esta luta ao lado de Jordan Bardella, com todos aqueles que se opuseram a Emmanuel Macron, todos aqueles que têm a nação ligada ao seu corpo. Queremos unir todos aqueles que, independentemente do seu background, queiram unir as suas forças contra Emmanuel Macron. Nas comunidades, em França ou nos territórios ultramarinos. Mas quando olharem para as sondagens, quando olharem para os números, lembrem-se: nada está escrito em pedra, nós podemos mudar o futuro.

Para as legislativas, Le Pen diz que estará presente e que levará consigo Jordan Bardella. O jovem de 25 anos é o seu número dois, o “delfim” que tem cultivado e que pode bem vir a suceder-lhe na liderança do partido um dia. A escolha é em tudo coincidente com o que defende a seguir: abrir a sua coligação a todos os que sejam anti-Macron, independentemente do candidato em que votaram. É precisamente esse o rumo que a União Nacional tem abordado com Le Pen, a dédiabolisation — ou seja, a aparente moderação que não é mais do que uma forma de transformar o partido de protesto num projeto de poder. Por agora, apenas de oposição. No futuro, talvez tal possa mudar.